João Amílcar Salgado

quarta-feira, 29 de maio de 2013

WILSON BERALDO
Wilson Teixeira Beraldo, nascido em Silvianópolis,  Minas, da turma de 1943 da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, é autor da maior descoberta científica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais e a segunda, depois da descrição da doença de Chagas, realizada pela ciência brasileira. Durante o curso médico foi estagiário do célebre professor José Baeta Viana. Após regressar dos EUA, em 1926, Viana criou um  laboratório nos porões  da Faculdade. Nele, em vez de aulas teóricas, treinava os estudantes e principalmente os estagiários em química fisiológica (bioquímica).  A partir daí encaminhava todos os seus discípulos, disseminando pelo país verdadeira dinastia de mestres e pesquisadores.  Na vez de Beraldo, entretanto, coincidiu que, pela primeira vez, não havia lugar aonde encaminhar aquele jovem. Em verdade, muitos dirigentes científicos e universitários temiam ajudar Viana, adversário aberto do ditador Vargas.
 Esta má circunstância do momento pode ter sido decisiva para  que Beraldo fizesse a maior descoberta científica feita por discípulos do mestre.  Até que aparecesse uma oportunidade melhor, ele foi, então, trabalhar humildemente num laboratório farmacêutico (Bristol), em São Paulo. Achando-o ali, o grande nutrólogo Dutra de Oliveira sugeriu que procurasse abrigo, mesmo que como assistente voluntário, no laboratório paulista do carioca Henrique da Rocha Lima. Este tinha obtido em Hamburgo, na Alemanha, em 1916,  grande vitória para a ciência brasileira, quando descobriu a primeira riquétsia.
Acolhido por Lima, Beraldo foi escalado para a equipe afim do farmacologista, também carioca, Maurício Rocha-e-Silva, que havia chegado da Grã-Bretanha, entusiasmado com as esperanças trazidas pelo método de identificação da histamina. Maurício, por sua vez, sugeriu ao Beraldo dominar o método e escolher um setor do organismo humano onde pudesse procurá-la.  
Wilson Beraldo,  mineiramente, meditou e concluiu que, no primeiro mundo, as mínimas partes do corpo humano já estavam em pleno mapeamento e ele iria chover no molhado. Como a jararaca é uma cobra que só existe aqui, ele resolveu humildemente dizer ao mundo científico se havia ou não histamina na saliva da serpente (preparada por Gastão Rosenfeld, no laboratório Butantã, criação de outro mineiro, Vital Brazil). Rocha-e-Silva certamente achou que aquela ideia só poderia sair da cabeça de um caipira do sul de Minas, mas, como coisa de principiante, estava bem.
Acontece que Beraldo, ao procurar a histamina (que se comporta como uma taquicinina sobre o intestino animal), verificou que no veneno da jararaca, em vez de taquicinina, havia uma BRADICININA - e assim foi descoberta, em 1948, uma das mais importantes substâncias da fisiologia animal.  
Mais tarde os sucessores de Rocha-e-Silva e Beraldo, prosseguiram o estudo de cininas e outras substâncias fisiológicas na própria jararaca e, assim, Sérgio Ferreira descreveu o captopril, o inibidor da conversão da angiotensina I em angiotensina II, abrindo revolucionário capítulo no tratamento da hipertensão arterial. Coincidentemente, a angiotensina é outra descoberta latinamericana, feita pelo argentino Eduardo Braun Menendez, em 1939. 
Beraldo, apenas uma vez, concordou em relatar a cena da descoberta.  Foi quando deu uma aula de História da Medicina no Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais. Relatou que, procurando pela histamina na preparação que acabara de montar, observou o efeito bradi em vez de taqui, na curva registrada. Rocha-e-Silva entrou no laboratório e, enquanto colocava a gravata e o paletó, advertiu Beraldo de que Rocha Lima ia iniciar a reunião e não admitia atraso. Beraldo disse: veja o que está sendo registrado. – Depois eu olho, você ainda está de avental. – Então olhe, por favor, enquanto visto o paletó. A contra gosto o instrutor olhou, tornou a olhar – e ele mesmo foi se despindo do paletó e se livrando da gravata...