João Amílcar Salgado

domingo, 5 de fevereiro de 2023

 


A LEGENDA DE MEU BAOBÁ PROSSEGUE

João Amílcar Salgado

     Antoine de Saint-Exupéry, aviador e pensador francês, escreveu o livro O PEQUENO PRÍNCIPE, em 1943, em plena segunda guerra mundial. Na década seguinte, o livro fez sucesso no Brasil e foi através dele que muita gente ficou sabendo que existia uma árvore chamada baobá. Eu era bibliotecário do diretório estudantil do curso médico e tive de adquirir múltiplos exemplares do pequeno livro, que nos traz esta parábola poética e filosófica. Outro autor de sucesso então era Jorge Amado e ele nos revelou o universo afro. Neste, Jorge fez brilhar Pierre Verger, fotógrafo e etnógrafo francês, que adotou a Bahia como pátria, inclusive a religião dos orixás. Outro que adotou essa crença foi o seleto poeta e compositor Vinícius de Moraes.  

            Quando criei o Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais, passei a procurar um consultor em medicina afro. Encontrei o Geraldo André da Silva e perguntei-lhe que seria necessário para tal função. Ele foi direto: faça este Centro me enviar à África. Ele foi e ficou estagiando com um sacerdote da mais pura religião angolana. Quando voltava, perguntou que devia trazer para mim, como agradecimento. Fui direto: uma muda de baobá. Quando ele chegou, tremi de emoção, ao receber a muda de uns 30 cm. Era inacreditável:  mas André, é proibido entrar no avião com isso! De fato, ainda lá, foi avisado da proibição. Voltou a seu guru, que lhe arranjara a muda. Este disse: eu encantei a muda, já está encantada, pode levar ao doutor que ele a vai receber. A muda passa por um fiscal na entrada do avião, que não a vê. Viaja no colo do portador, sem que ninguém da tripulação e dos passageiros a perceba. E desce em Belo Horizonte do mesmo modo. Coloquei-a sobre o cimento de meu quintal e, quando olho, a raiz já havia penetrado o cimento. Havia crescido mais do que eu esperava. Para levar a Nepomuceno, foi necessária uma caminhonete. Mandei o motorista ajeitar a muda na carroceria e, quando chego, ele tinha esqueletizado a árvore, alegando que era para ela suportar o vento...  Pensei: agora ela está morta... Mesmo na certeza de que estava perdida, plantei-a carinhosamente. E não estava morta. Encantada, está lá, cada vez maior, sob as bençãos de meus ancestrais angolanos e do Padre Vítor.

***

Há dois anos tivemos terrível geada e o baobá morreu, talvez atingido também por um raio. Dei a triste notícia ao André e ele pareceu engolir em seco, mas perguntou a data. Exclamou: “Então isso coincidiu com a morte de meu mestre lá na África”. A seguir me consolou: “Espera aí, o espírito dele acaba de me dizer que brotará”. Continua encantado, rebrotou agora, depois da chuvarada. Vejam as fotos.

 

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