RECEBI DO AFONSO BORGES, ILUSTRE ESCRITOR,
JORNALISTA E COORDENADOR DO PROGRAMA “SEMPRE UM PAPO” (sempreumpapo.com.br) a
seguinte mensagem de João Cândido Portinari:
18/3/22 |
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Caro João Amílcar,
Fico-lhe muitíssimo grato por nos trazer este episódio que eu, apesar
dos 43 anos pesquisando no Projeto Portinari, desconhecia!
Chatô tinha paixão por meu pai, veja este texto, o discurso dele na
inauguração da Série Os Músicos, e 7 painéis para a Rádio Tupi do Rio de
Janeiro (5 deles destruidos em incêndio anos depois), em 10.12.1942:
"...Grandezas e misérias do Brasil, sua sensibilidade, suas
tragédias secretas, a contra-revolta obscura das suas classes desafortunadas, o
frenesi dos sambas, dos batuques, o desengonço do frevo, a melancolia, sem azedume,
dos negros e dos mulatos, que a escravidão policiou, o cavalo marinho e o
africano, o enterro dos simples e dos humildes, o tocador de flauta e o
malandro dos morros, em toda essa comédia humana a palheta de Portinari deita
cores imortais. Seu estilo não tem sombra de artifício. Fatigados
de tanto academismo, de tanta arte de repetição e de decadência, os brasileiros
se volvem para a interpretação mágica desse operário da arte nacional
autêntica, que é Portinari. (...) Aqui ele está solto. Não teve governo,
Capanema, admoestações estatais, nada, para o sufocar ou estrangular.
Ficou por conta do demônio interior que o possue, e compôs estas fábulas
que sobem pelas paredes acima como labaredas de fogo do gênio infernal que o
devora. Portinari é o maior e mais fantástico pintor de negros que ainda
viu a espécie humana. Ele sente a Africa com sua magia, os seus
mistérios, a sua volúpia, como nenhum outro artista do pincel. É preciso
ser florentino de sangue e de centelha como ele é, para produzir estas
maravilhas murais que aí estão. O gênio puro e universal de Florença
enterrou olhos, alma, coração nas raízes negras e amarelas do povo brasileiro,
e veio, da Baixa do Sapateiro, do morro do Querosene, do bas fond das duas
cidades com esses diamantes negros que sacudiu a mancheias por ali além.
Mas não são só o negro e o mulato que ele viu. Viu também o
jangadeiro e viu o gaúcho, isto é, viu o norte e o sul do Brasil, na serena
unidade dos materiais que lhe alimentam a força com as suas peculiaridades e o
seu rutilante colorido humano. Deste bazar que nós somos, o turco
maravilhoso é Candido Portinari…"
Um grato e fraterno abraço do
João Candido
Belo
Horizonte, 22/3/22
PREZADO XARÁ,
Muito agradeço sua atenciosa mensagem. Na
internete publiquei o seguinte:
domingo, 20 de março de 2022
OS CARVALHOS
João Amílcar Salgado
Os Carvalhos
nepomucenenses descendem do luso Caetano de Carvalho Duarte, de Silvares,
Arcebispado de Braga, que migrou para São Miguel do Cajuru, distrito de São
João del Rei, onde se casou com Catarina de São José Fonseca, prima de Mateus
Luiz Garcia, fundador de Nepomuceno. São co-fundadores da Vila, já que Mateus
os trouxe para apoio na ocupação da imensa propriedade do Congonhal. São também
co-fundadores de Campo Belo, pois Mateus atribuiu-lhes especificamente as
terras da outra banda do Rio Grande, na Mata dos Carvalhos. Na banda de cá
criaram a tradicional fazenda dos Coqueiros.
Entre os Carvalhos
que vieram, muitos eram brancos e outros mulatos. Há a lenda de que Caetano era
fascinado por mulheres negras e engravidava várias escravas ao mesmo tempo, mas
cuidava de todas as crianças como filhos. Os herdeiros legítimos enjeitaram os
demais e a ameaça de conflito foi solucionada por Mateus, que trouxe os
excluídos para Nepomuceno, sendo que aqui se tornaram muito mais prósperos que
os avaros.
Os Carvalhos
acompanharam a diáspora sulmineira rumo ao oeste. Visitei em Uberaba a família
do médico e compositor Joubert de Carvalho, autor de Maringá, Minha
Casa, De Papo Pro Ar e Zíngara. Joubert,
em seus hábitos e demais traços da personalidade, parecia-se muito com os
primos nepomucenenses. Isso deve ter atraído Cândido Portinari, que nasceu numa
região colonizada por gente semelhante. Todo o carinho do artista do pincel
para com o artista das notas musicais está traduzido no retrato que o primeiro
fez do segundo (anexo). Um gesto grosseiro de Assis Chateaubriand arrebatou a
tela da família.
***
O livro onde relato
o episódio está esgotado e se intitula O RISO DOURADO DA VILA (2003), mas sua
2ª edição será lançada agora. Minha relação especial com o assunto decorre de
minha condição de historiador da medicina, sendo Joubert importante figura da
medicina mineira. Sou também historiador de minha cidade, Nepomuceno, no sul de
Minas, e sou autor do livro NEPOMUCENO – SÍNTESE HISTÓRICA (2016). Neles me
refiro à diáspora de sulmineiros para o oeste. Daí que parentes meus ajudaram a
fundar cidades no Triangulo, por exemplo, Uberaba, em São Paulo, por exemplo,
Barretos, e em Goiás, por exemplo, Mineiros. Para minha satisfação, Portinari
nasceu em Brodowski, incluída nessa área, situada não muito distante de
Nepomuceno. Portinari nasceu em 1903, mesmo ano de meu pai, João Salgado Filho,
que foi contemporâneo de Carlos Drummond de Andrade, no curso de farmácia na
atual UFMG, sendo ambos farmacêuticos e poetas.
Como
historiador da medicina, editei facsimilarmente um livro publicado em 1735,
denominado ERÁRIO MINERAL, que é nosso primeiro livro sistemático para os
clínicos, em português. Ofereço um exemplar para seu acervo, sendo que a capa é
uma obra de arte de nosso artista Jarbas Juarez, que recebeu grande influência
de Portinari. Envio também outros livros de minha família. Para isso, rogo
indicar-me o endereço apropriado.
Receba
meu entusiástico abraço,
João