João Amílcar Salgado

sábado, 21 de março de 2015

LUIZ CISALPINO CARNEIRO
ESPLÊNDIDA SÍNTESE ENTRE RETIDÃO DE CARÁTER E ESPÍRITO SOLIDÁRIO

João Amílcar Salgado
            Quando o Luiz Carneiro se aposentou e fechou seu laboratório de análises clínicas, numerosos clientes se sentiram desamparados, pois ele era, principalmente para os próprios médicos e respectivas famílias, o que havia de mais confiável em exames complementares. Atendia desde famílias tradicionais até altos dignitários e autoridades, sendo também de altíssima confiança para documentação científica.  Foi o último profissional artesanal nesta área, pois o controle de qualidade para ele significava conferir pessoalmente cada exame e cada laudo que produzia.
               Em seu laboratório particular, no serviço laboratorial da cátedra de Clínica Médica, comandada pelo professor Caio Benjamim Dias, e no laboratório central do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, este perfeccionista da patologia clínica desenvolveu várias técnicas, tendo incrível facilidade para, tão logo algum procedimento era proposto na literatura médica, tê-lo na rotina de sua bancada, o qual generosamente repassava aos colegas da capital e do interior.
               Foi pioneiro, por exemplo, na dosagem do iodo protêico, cuja introdução veio facilitar o diagnóstico de doenças da tireóide, substituindo a trabalhosa medida do metabolismo básico.  Vários interessados falharam em estabelecer a técnica, após mais de uma tentativa, até que do Luiz Carneiro o êxito veio da primeira vez.   Foi nessa época que a meu pedido dosou o iodo protêico de uma paciente atendida no ambulatório do Hospital da Cruz Vermelha, quando disse: foi a dosagem mais baixa que já medi e a doente não tem aparência da doença. Concluímos que o fator racial mascarava aqui a aparência de mixedema descrita em gente européia. E mais: o principal quadro apresentado era psiquiátrico, que se reverteu com o tratamento com tireóide.  O Luiz então me perguntou: quantos pacientes, como esta, estarão aí pelos hospícios brasileiros tomando eletrochoque, em vez de beneficiados pela terapêutica certa? A pesquisa que faríamos para responder a esta pergunta foi impedida por razões suspeitas.  Meu amigo lamentou: é uma pena, pois tenho muito carinho pelos loucos. Esta data, 1963, deve ser reconhecida como do início da humanização da psiquiatria no Brasil.
               Na verdade a investigação que pretendíamos era mais ambiciosa, pois iríamos determinar não só o percentual de loucuras reversíveis com prescrição de tireóide, mas também aquelas causadas por pelagra (freqüente entre nós pela soma de alcoolismo e desnutrição), a qual é brilhantemente reversível com ácido nicotínico. Fomos obstados e o mesmo aconteceu mais tarde, quando tentamos ser pioneiros na dosagem de álcool no sangue, hoje rotina para motoristas bêbados. Eu ensaiava cimetidina para úlcera péptica e guardei o sangue dos pacientes para dosar eventual diminuição dos hormônios sexuais. Ia dosar também eventual alcoolismo, pois, ao contrário da crença comum, surgiu a evidência de que a bebida alcoólica, em vez de agravar, melhorava a úlcera. O fabricante de cimetidina foi contrário à dosagem do hormônio. As amostras de sangue estavam estocadas e um belo dia o congelador amanheceu desligado.
               Outra dosagem de que o Luiz Carneiro foi pioneiro é a do colesterol. Quando controlar colesterol estava se tornando modismo, ele experimentou o período de maior movimentação em seu laboratório. Dosou o colesterol de todos os ricaços e gente importante de Minas. Permitiu-lhe até comprar uma casa e deixar de morar de aluguel. Havia obsessivos que exigiam a dosagem semanal. Sendo aquele que mais tempo conviveu com a idéia fixa de muita gente contra a hipercolesterolemia, chegou à conclusão de que, entre a maioria daqueles com persistente colesterol alto, que acompanhou até a morte, esta se deu por causa não relacionada a tal obsessão. Assim, nosso Luiz deve ser considerado pioneiro na denúncia  daquilo hoje conhecido em inglês como “overdiagnosis & overtreatment business”.
               Cumulativamente, Luiz Carneiro nunca deixou de dedicar-se ao estudo de problemas sociais, vislumbrados por ele de um ângulo inusitado, ou seja por meio do buraco-da-fechadura de sua especialidade, adrede colocado em ponto alto da medicina mineira. Isto porque seu irmão mais velho, José Maria Carneiro, formado pela atual UFMG em 1932 (contemporâneo de Guimarães Rosa), foi laboratorista de alta reputação e influente dentro e fora da profissão.  Nosso Luiz, formado na mesma Universidade em 1952, passou a seu auxiliar, desde o curso médico até suceder-lhe. Isso o fez laboratorista do Instituto Raul Soares, onde convivia com os dementes - repetição de circunstância de sua meninice, pois conviveu em Barbacena com os internos de lá, quando seu pai era encarregado das obras na Colônia de Alienados. Com isso, ele acabou sendo o observador privilegiado de nossa realidade social, acompanhando simultaneamente, de um lado, a elite da elite e, de outro, os penúltimos colocados na escala da dignidade humana: os doentes mentais.
               Certo dia o Luiz me disse que ia pedir demissão da Universidade, pois fora escalado para plantonista do Laboratório Central, função que não suportaria exercer naquela altura da vida.  Imediatamente o requisitei para ficar à disposição do Centro de Memória da Medicina.  Em seu primeiro dia no Centro, implorou para que jamais conversássemos com ele sobre laboratório clínico. Diante disso concluí que ele estava repetindo algo que acontecera com um papa. Segundo uma lenda, certo cardeal fora escolhido papa como única salvação em momento de crise. Fez tudo para recusar, mas foi coagido a tomar posse e resolveu a crise. Então o cardeal seu confidente lhe perguntou por que recusara. E ele disse sinceramente que, quando apelaram para ele, tinha acabado de tornar-se ateu.
No caso do Luiz Carneiro, não havia propriamente crise, mas ele nos chegou pronto para duas coisas definitivas: cuidar da memória de Juscelino Kubitschek, de que é admirador sem par, e proporcionar-nos um momento histórico em nosso ensino médico. Isto porque havia quem muito elogiasse a inovação curricular de 1975, exceto certa tendenciosidade antipsiquiátrica. Éramos acusados pela cúpula psiquiátrica mineira de promiscuidade com as idéias de gente como Michel Foucault, Georges Lapassade, Franco Basaglia, Ivan Illich, Pierre Bourdieu, Timothy Leary, Jürgen Habermas, Ronald Laing, Wilhelm Reich, Hélio Pellegrino, Domingos Gandra e Célio Garcia. Tal preconceito retratava a incultura dos acusadores, pois éramos apenas democraticamente abertos a todas as correntes, pois nossos estudos se iniciaram com Piaget, Jairo Bernardes e o ortodoxo psicanalista chileno Hernan Davanzo. Diante disso, Carneiro, com base num artigo de Hélio Pellegrino sobre a assistência psiquiátrica cubana, se prontificou a comparecer a Cuba, no que correu grande risco frente à repressão da época, para nos trazer aquela experiência. E submetê-la, em debate, a todas as correntes da psiquiatria existentes no Brasil, desde a antipsiquiatria à psicocirurgia. 
Essa foi a origem do célebre Seminário sobre Alternativas de Atenção à Saúde Mental, de 1982. Foi um dos fortes desafios à abertura esboçada pela ditadura e é descrito em outro texto, mas adiantamos que foi iniciado com a expectativa de três apresentações: aula inaugural de Nise da Silveira, exibição do filme Um Estranho no Ninho (um dos três melhores filmes já produzidos) e o audiovisual do Luiz Carneiro sobre a experiência cubana. Lamentavelmente, a querida conferencista adoeceu e a cópia do filme foi sonegada por forças ocultas. Mas o Luiz deu seu recado e tão bem que neutralizou as duas frustrações.  A seguir, pela primeira vez, algo impossível aconteceu: renomados psiquiatras, que se maldiziam longe uns dos outros, sentaram-se lado a lado no palco da Faculdade e mostraram que a psiquiatria, aos olhos dos não-psiquiatras, estava flagrantemente obscura, desordenada e até caótica, o que fazia contraste com os altos honorários cobrados de quem podia pagar e até de quem mal podia pagar. Em outra sessão, algo inédito: pacientes, ex-pacientes e representantes de segmentos sociais discriminados também subiram ao palco e também foram ouvidos sem chacota, mas, diferentemente dos profissionais, foram demoradamente aplaudidos. Tudo culminou com o debate inesquecível entre Márcio Vasconcelos Pinheiro e José Guilherme Merquior.
E foi assim que um médico laboratorista, acometido de total compaixão pelos doentes mentais, protagonizou uma das páginas mais luminosas da atenção à saúde neste país.


O autor é professor titular de Clínica Médica e pesquisador de História da Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais

sábado, 14 de março de 2015

               DUPLO TRIUNFO DE GANDHI SOBRE CHURCHILL
João Amílcar Salgado

No livro O RISO DOURADO DA VILA (2003), narro que meu pai, na época da guerra mundial, me fez admirador de Churchill e que mais tarde, ao ler sobre a vida de Ghandi, passei a desprezar Churchill, porque este se recusara a receber este líder defensor da independência da Índia. Simplesmente alegou que nada tinha a falar com um faquir semi-nu. Não muito tempo depois o arrogante político teve de aceitar a independência pela qual o pacifista lutava. Hoje, 14-3-15, Ghandi completa seu triunfo sobre Churchill, pois nesta data é inaugurada no centro de Londres a estátua de Ghandi, bem perto da estátua em homenagem a Churchill.  Meu regozijo pelo fato me obriga a homenagear meu pai, que me fez entrar indiretamente neste enredo, e a homenagear os que tiveram a iniciativa da estátua, num momento histórico em que se faz urgente exaltar a grandeza da doutrina da não-violência, difundida mundialmente por Ghandi.

quarta-feira, 4 de março de 2015

Quase na mesma hora do dia 3/3/15, faleceram minha tia Rute e minha prima Marize, duas belas mulheres, que tinham em comum também o talento artístico. A tia Rute era exímia bordadeira, arte muito peculiar à Vila, e a Marize era capaz de cantar as mais doces canções, com ternura inigualável. Recomendo a quem ainda não leu que leia o livro MINHA HISTÓRIA, NOSSAS VIDAS (2007) de Rute de Abreu Salgado, que rememora sua vida de modo muito agradável, em que nossa cidade se revela em flagrantes surpreendentes. Ao lado da homenagem à Marize, lembro sua tia Jane, muito parecida com ela, não só cantora mas incrível assobiadora, que infelizmente faleceu pré-adolescente. Tenho certeza de que seu irmão Evaldo vai-nos brindar com pelo menos uma gravação da voz da Marize.
João Amílcar Salgado 

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

REGRA DO JOGO
João Amílcar Salgado

No dia 19-2-15, em programa radiofônico de grande audiência em Belo Horizonte, determinada debatedora afirmou que recebeu críticas, referentes a uma flagrante contradição cometida diariamente naquele horário. Trata-se de que os debatedores sempre estão a apontar corrupção e irregularidades, aqui e acolá, ao mesmo tempo em que, nos intervalos publicitários, propagam medicamentos notoriamente ineficazes. A debatedora se defende, dizendo que quem faz a crítica desconhece A REGRA DO JOGO. Mas não explicita que regra é essa, acrescentando que, sem tal propaganda, a emissora não se sustentaria. E finaliza dizendo que nada fazem de ilegal. E tudo isso é dito, quando a discussão mais recorrente no mesmo programa é a corrupção na Petrobrás. Então convém lembrar que os advogados das empreiteiras e dos autores dos desvios têm argumentado que O PAGAMENTO DE SUBORNO É REGRA-DO-JOGO MUITO ANTIGA NOS CONTRATOS DE OBRAS PÚBLICAS. Tal pagamento é tão costumeiro e tão generalizado que virou regra-do-jogo, não parecendo nem ilegal, nem imoral. A NOVIDADE DO MOMENTO É QUE AGORA, DE REPENTE, UM JUIZ CISMOU DE DESCONHECER ESSA REGRA-DO-JOGO E CONSIDERAR A COISA NÃO SÓ IMORAL COMO ILEGAL.

sábado, 27 de dezembro de 2014

O GUEVARISMO CRISTÃO
DO PAPA FRANCISCO


  
João Amílcar Salgado
            Para os radicais do partido republicano, Obama é socialista. Para os radicais da direita católica, o papa Francisco é socialista. Para ambos os agrupamentos radicais, a comprovação dessa rotulação ideológica de Obama e Francisco vem da cooperação entre os dois para reconciliar EUA e Cuba.
            O papa Francisco é jesuíta e foram os jesuítas os autores da mais prolongada  experiência comunista no mundo moderno, quando criaram as reduções ou missões no cone sul das Américas. Em vez do lógico codinome Inácio, decidiu assumir o nome Francisco, sem dúvida para apontar seu modelo de cristianismo calcado em Francisco de Assis, o mais socialista dos santos. Entre as vertentes franciscanas, há inclusive aquela que propõe a substituição da plenitude dos tempos por uma sequencia ascensional, que parte do padre eterno, passa pelo filho salvador e chega enfim ao espírito igualitário. De fato, o Divino Espírito Santo, celebrado nas festas do Divino difundidas por todo o Brasil, é a expressão do acolhimento popular a tal doutrina.
            O papa Francisco é argentino e deve orgulhar-se de ser conterrâneo tanto de Ernesto Guevara como das Avós da Praça de Maio - e também de José de San Matin, de Juan Cesar Garcia, de Carlos Gardel e de Maradona.  E ainda de ter parentesco espiritual com Gabriela Mistral, Pablo Neruda, Salvador Allende, Simon Bolívar e Tupac Amaru. Assim ele está intelectualmente bem distante dos ideólogos seja do partido republicano dos EUA, seja do Salon Beige católico da França.
            Sua referencia como papa é o papa João 23. Sua estratégia vem da consciência de seu carisma. E tem raro senso de oportunidade. Sabe que não pode deixar de aproveitar a oportuna presença de um democrata negro na presidência dos EUA, contemporaneamente a seu papado. E sabe também que a oportunidade de Obama ficar na história, com alguma realização a mais, além de sua dupla eleição, é agora, quando não tem de cuidar de reeleger-se. Esta é, sem dúvida, a base da comunicação entre ambos.
            Obama tem de conseguir, no final de seu governo, três vitórias históricas, no plano interno: consolidar o neo-crescimento econômico, fechar Guantánamo e submeter a National Rifle Association. No plano externo, basta-lhe reatar com Cuba.  É quase certo que isso passou pela conversa entre Francisco e Obama. O cacife de Obama é seu cuidadoso estilo de lidar com racistas e belicistas, estilo este que, em vez de elogios, lhe tem valido acusações de covarde. Ele pode, no final do governo, comunicar a todos que a paciência aí implícita pode findar e que um Obama latente que nunca veio à tona pode emergir e patentear-se. Sim, Obama é o potencial líder de uma guerra civil, evidentemente evitável e anteriormente improvável, de negros e hispânicos contra racistas e belicistas. 
            O Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais, desde sua criação, estuda médicos ligados à política, como, entre muitos outros, JK, Clóvis Salgado, Émile Littré,  José Rizal, Norman Bethume e Che Guevara. Quem conhece a biografia do médico Ernesto Guevara e quem acompanhou sua evolução ideológica sabe que o fascínio exercido por ele sobre gerações de várias tendências se assenta em pontos comuns entre este herói, o papa e Obama. O lado supra-marxista do guevarismo terá novo significado se Obama e Francisco continuarem de mãos-dadas.

O autor é professor titular de Clínica Médica da Universidade Federal de Minas Gerais e fundador do Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais


             

domingo, 14 de setembro de 2014

COLÉGIO ESTADUAL - UMA LEGENDA BELORIZONTINA
João Amílcar Salgado
            Certo dia chegam ao Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais o psiquiatra Ataúlpho da Costa Ribeiro, o cartunista Fernando Pieruccetti e a historiadora Francelina Drummond. Os três propunham publicar a reedição fac-similar do livro ERÁRIO MINERAL (1735), de autoria do cirurgião luso Luís Gomes Ferreira, e a HISTÓRIA DO COLEGIO ESTADUAL DE MINAS GERAIS, de autoria de Pieruccetti.  Que relação havia entre a memória da medicina e o colégio? Foi então que esses três arautos nos comunicaram algo sensacional: investigando as origens coloniais do colégio, Pieruccetti descobriu que neste houve o início do ensino médico no Brasil, em 1801.  O Erário Mineral foi reeditado em 1997, mas a História do Colégio não foi publicada, em virtude do falecimento de Fernando em 2004. O historiador, entretanto, antecipou os dados referentes ao curso de cirurgia, na Revista Médica de Minas Gerais, em 1992 (http://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lil-114956).
            Em 2004, liderados por Ernesto Lentz e Norma Veloso Chaves, promovemos um almoço dos formandos do centenário do colégio, com a presença dos professores Beatriz Alvarenga, Aluizio Pimenta, Elias Murad e Wagner Brandão. Em meio a evocações humorísticas, foi lembrada a urgência de um livro abrangente, antes que muita coisa fosse esquecida ou perdida.
            Prosseguimos na expectativa de que a família e/ou o grande amigo Ataulpho efetivassem a publicação da obra completa de Pieruccetti, o que se espera para breve. Enquanto isso ótima iniciativa teve a coleção BH – A CIDADE DE CADA UM,  que incluiu um livreto sobre o antigo Ginásio Mineiro entre suas publicações. Assim, causando grande interesse, acaba de sair COLÉGIO ESTADUAL (2014) de autoria de Renato Moraes, que enfrentou o desafio de resumir toda a vasta legenda do educandário nos moldes da coleção.  Moraes se saiu muito bem e é provável que, estimulados por seu texto, sejam publicados não só o livro esperado mas os de outros historiadores e/ou ex-alunos e/ou professores. Entre estes, cito a professora Beatriz Alvarenga e o Eulâmpio Morais. Entre os ex-alunos é até difícil citar, tantos que são escritores. Há  também dados sobre o colégio em biografias e auto-biografias. Eu próprio, em meu livro O RISO DOURADO DA VILA (2003), descrevo o colégio ainda no Barro Preto, durante o ano de seu centenário.
            Coincide que neste ano de 2014 completam-se cem anos do antigo prédio da Faculdade de Medicina da UFMG, criminosamente demolido. Abaixo apresento o que escrevi sobre esta data, inclusive a referencia à demolição de duas das sedes do Colégio Estadual, uma delas onde estudei.

TRÊS INESTIMÁVEIS EDIFICAÇÕES DEMOLIDAS EM NOME DA MODERNIDADE
João Amílcar Salgado
            Os edifícios da Faculdade de Medicina, da Faculdade de Direito, ambas hoje da Universidade Federal de Minas Gerais, e do antigo Ginásio Mineiro, depois Colégio Estadual, foram demolidos criminosamente em nome da modernidade, a partir da década de 50 do século 20. Nessa época a modernidade estava em moda por influência da construção de Brasília. Juscelino Kubitschek (JK) não demoliu uma cidade para em seu lugar construir Brasília. Ele deixou o Rio de Janeiro intacto e construiu a nova capital onde não havia qualquer edifício. Quando construiu hotéis modernos em Diamantina e Ouro Preto, ele o fez sem causar demolição de prédios históricos. Assim não seria justo atribuir diretamente a JK as demolições das faculdades e do colégio. Os que decidiram tais demolições estavam influenciados por ele e queriam mesmo imitá-lo – mas de maneira totalmente infeliz. Talvez mesmo desejassem que seus nomes se eternizassem associando-os à eternização, de fato ocorrida, do nome do notável presidente.
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjWED-OqlRUhPFDu0qB-OTG1B8MI4vDgvsZbVX8F6XPRUhZCxMjhW8XqqMVItYAKEj8tb_Hz8kH_iltdTOVSdedkz1ukYIjrfoDkCg2V5B9c1ULvnTbicd0JCcILC8wb04g7TmBRwGuSKce/s1600/07+Fac.Livre+de+Dir..jpgAntigo prédio da Faculdade de Direito da hoje UFMG, na praça Afonso Arinos, demolido em 1958
http://img407.imageshack.us/img407/2658/ginasio.png
GINÁSIO MINEIRO na RUA DA BAHIA, atrás da praça da liberdade – prédio também criminosamente demolido, prenúncio das demolições ora apontadas
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjvoLToXylet7UhiLkfMLaRxBOg8caTYNAnF80jso9VV12-J0XiXJShcdHnR_WwK3_KTASpem8kw35hRENeW-wBYqOmp1jFMwQ-1acFmiI3kZFBTMeM1vHTzCRsb82I2UONvlZ1i8FOceeW/s1600/Gin.Mineiro+1.jpgPrédio do antigo Ginásio Mineiro, depois Colégio Estadual, na avenida Augusto de Lima, demolido depois de 1956 para ser substituído pelo atual edifício do Forum,
            O prédio da Faculdade de Direito inaugurado em 1901, foi criminosamente demolido em 1958 e substituído pelo edifício Antonio Martins Villas-Boas.  O prédio da Faculdade de Medicina foi inaugurado em 1914 e criminosamente demolido em 1958, sendo substituído pelo edifício Oscar Versiani Caldeira.  O Ginásio Mineiro, sucessor do Liceu Mineiro, teve seu externato transferido de Ouro Preto para Belo Horizonte em 1898, onde ficou em belo prédio, na rua da Bahia, próximo à praça da Liberdade, depois criminosamente demolido. Foi transferido para o bairro Serra, depois para onde hoje é o Minas Centro e  acabou-se fixando no bairro Barro Preto (foto). Dali foi transferido para o bairro Santo Antônio (onde havia o Regimento de Cavalaria da Polícia Militar), com o nome de Colégio Estadual Milton Campos, em novo prédio inaugurado em 1956 e projetado por Niemeyer em 1954. Neste mesmo ano, o belo prédio da avenida Augusto de Lima foi ocupado pelo Colégio Militar. Este foi logo  levado para a Pampulha, para que o histórico prédio fosse criminosamente demolido  e ali instalado o edifício Milton Campos do Fórum Lafayette, em 1980.
            Em 2014 comemoramos o centenário da inauguração do antigo edifício da Faculdade de Medicina, infelizmente demolido em 1958.
Devemos este preciosíssimo risco à devoção de Pedro Nava à memória da Faculdade e de Minas.
Figura 2. Raríssima foto feita por visitante português e publicada em periódico em Portugal, ofertada ao Cememor pelo ilustre arquiteto e historiador Luciano A. Peret.     Trata-se do prédio da Faculdade de Medicina da hoje UFMG ainda em construção e assim provavelmente datada de 1913.
 Figura 3. Foto de 14-06-1958, em que docentes e estudantes deixam à posteridade a prova de seu criminoso menosprezo pela memória de sua Faculdade. A demolição do edifício da Faculdade de Medicina da hoje UFMG começaria no dia seguinte e o professor discordante desse ato, Oromar Moreira, recolheria pedaço de sua platibanda e depois o doaria ao acervo do Centro de Memória, de onde também seria jogado fora.

[TEXTO INICIALMENTE REDIGIDO EM FEVEREIRO DE 2014 PARA A COMEMORAÇÃO DO CENTENÁRIO DO PREDIO ANTIGO DA FACULDADE DE MEDICINA DA UFMG, A SER DISTRIBUÍDO NA AULA INAUGURAL DO 2º SEMESTRE DE 2014]

            

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

JAIR LEOPOLDO RASO é um dos maiores neuro-cirurgiões brasileiros. Além disso, é autor, diretor e ator de teatro. Além disso, escreve não só oportunas crônicas médicas como deliciosas crônicas do cotidiano. Todos os clientes que encaminhei a ele se tornaram seus fãs e seus amigos. Ele está na tradição da medicina mineira de unir competência técnica com arte e humanismo, sem que cada área prejudique as demais. Sugiro aos amigos que passem a leitores de seu blogue. E que não percam as peças de teatro de que ele participe.