LUTA CONTRA O SAQUE. ARTÍSTICO DE MG
João Amílcar Salgado
S.Benedito do século 18, furtado na década de 90, é
recuperado em BH, em abril de 2024. É de capela de Congonhas e estava
num leilão da internete. Na mesma data imagens são recuperadas em Santa Luzia.
É a oportunidade de relembrarmos nosso manifesto de 2004 contra o saque ao
acervo artístico de MG, bem como homenagear o Padre Simões do Pilar.
Minas Gerais foi e continua sendo origem de invejável conjunto de bens
artísticos e históricos, dignos do maior zelo por parte não só dos mineiros,
mas dos brasileiros em geral. Desgraçadamente, desde o esboço deste
crescente tesouro, a cultura mineira vem sendo vítima de contínuo saque, que já
se estende por três séculos. A triste crônica de tal agressão não
deixa dúvida de que a ostensiva impunidade quer dos saqueadores, quer dos
cúmplices locais, é responsável por sua perpetração contínua e crescente. Autoridades
maiores a quem deveria caber o mais desvelado cuidado vêm demonstrando tal e
tão cínica omissão ao longo do tempo que lhes cabe clara parcela de
cumplicidade. Tamanha vilania clama por medidas objetivas e eficazes e, por
meio deste manifesto, estamos desafiando os órgãos governamentais, as
instituições não-governamentais e a sociedade em geral a que dêem às futuras
gerações uma resposta condigna. E que esta esteja à altura do incomensurável
patrimônio atingido, que soma à insubstituível porção já dilapidada, a
valiosíssima fração que resta em flagrante perigo.
As tímidas medidas, esboçadas de tempos em tempos, estão
eivadas de evidências de que a complacência para com os criminosos
prosseguirá. Tratá-los como meros contraventores, em vez de autores
de gravíssimo crime, é o pior sinal. Chamar eufemisticamente o traficante
de marchand e o receptador de colecionador é a contraprova da
cumplicidade oficial. Reduzir o conjunto desejável de medidas enérgicas à
conscientização das pessoas é flagrante ingenuidade, principalmente agora
quando medidas eficazes em favor do turismo cultural e ecológico estão em
andamento. Apoiamos plenamente tanto o turismo como tudo que vise à
consciência coletiva do valor de nossos bens históricos, artísticos
e paisagísticos. Mas isso não dispensa e, ao contrário, exige a
vigilância cada vez mais sofisticada dos mesmos, pois sua exposição estará
multiplicada tanto quanto a cobiça sobre eles, com o inevitável uso de métodos
criminosos peculiares ao crime organizado. Os saqueadores são imunes
à conscientização e só são contidos pela certeza de que a impunidade será
substituída por punições severas e incontornáveis.
Em relação às obras de Aleijadinho ou de artistas de mesmo nível, a lei
já deveria ter proibido a comercialização, com seu imediato recolhimento aos
museus públicos mineiros. O catálogo com minuciosa descrição de cada
uma, mesmo das de autenticidade duvidosa, deveria ser de elaboração oficial,
estar na internet e sem o anonimato dos atuais depositários. Assim
como a televisão e a demais imprensa divulga telefones para devolução
voluntária de peças desviadas, os atuais depositários deveriam
receber prazo para a entrega ao governo de seus aleijadinhos e
congêneres. Os profetas de Congonhas já deveriam ter sido resguardados contra
qualquer deterioração e isso já deveria ter sido realizado desde quando foram
feitos os moldes ora recolhidos à UFMG. Trair os interesses da cultura
mineira com medidas de marketing, que encubram providências firmes e efetivas,
é crime tão grave quanto aquele que fingem combater. Até aqui,
tecnocratas da cultura, historiadores, mestrandos, doutorandos e consulentes
em geral não sofrem qualquer controle e foi inevitável que começassem
a aparecer nos noticiários como membros de quadrilhas capazes não só de saquear
bens, mas de sua danificação irreversível. O esbulho de bens culturais é
terrivelmente semelhante à devastação de nossas florestas, ou seja,
encontram-se submetidos à mais cruel e sórdida das tolerâncias. Solicitamos aos
Senhores Presidente da República, Governador do Estado de Minas Gerais,
Ministro da Cultura e Secretário de Estado da Cultura que se manifestem
oficialmente diante de cada questão acima mencionada