A
FARMACOBRÁS E A INSULINA
João Amílcar Salgado
Em
1963, o presidente João Goulart passou a defender as chamadas reformas de base, propostas desde 1962. Foram
reunidas, em estudo de San Tiago Dantas, em reformas agrária, educacional,
tributária, administrativa, urbana e da remessa de lucros das multinacionais.
Estudantes e docentes de medicina da UFMG, se reuniram, ainda em 1963, para
exigir a inclusão da reforma farmacêutica entre aquelas propostas. Inspirada na
criação, 10 anos antes, da PETROBRÁS, foi proposta a FARMACOBRÁS, que estabeleceria
o monopólio estatal da importação dos insumos farmacêuticos, bem como a
fabricação estatal de medicamentos essenciais, mas permitiria a fabricação
privada de medicamentos. Tal reunião surgiu de um debate entre os estudantes e
o professor Carlos Ribeiro Diniz, promovido por mim. Dela participaram, entre
outros, os docentes e residentes Carlos Diniz, Marcos Luiz dos Mares Guia, João
Amílcar Salgado, Zigman Brener, Wilson Beraldo, Lineu Freire Maia, Arnaldo
Elian, Luís Cisalpino Carneiro, Cid Veloso, José Ribeiro de Paiva, Paulo
Madureira de Pádua e Rubem Simões – e os estudantes, entre outros, Henrique
Santillo, Philadelpho Siqueira, Wilson Almeida, Lúcio Almeida, Antonio Dilson
Fernandes, Edward Tonelli, Naftale Katz e Evilázio Ferreira. O Betinho,
presidente da UNE, pediu para ser informado do resultado da reunião. Com o
advento da ditadura, a Farmacobrás foi modificada para Biobrás, restrita afinal
a fabricar insulina. A Biobrás foi fundada em 1976 por Marcos dos
Mares Guia e por Guilherme Emrich. Desenvolveu brilhantemente a insulina
recombinante (insulina humana produzida em bactérias transgênicas). Em 2001
Marcos fez acordo da Biobrás com a empresa dinamarquesa Nordisk. Em 2010 esta
comprou aquela por 75 milhões de dólares, quando o laboratório brasileiro faturava
mais de 50 milhões de reais ao ano. A Nordisk veio para aqui em 1990,
especializada em diabete, e faturou 3,8 bilhões de dólares em 2002. Os
ex-controladores ficaram com a patente da insulina recombinante e fundaram a
Biomm, capaz de incorporar qualquer novidade tecnológica.
Desde 1956 o Marcos e eu já tínhamos
iniciativas conjuntas: começamos com um grupo para estudar alemão, que incluía
o Guilherme Cabral e o Emir Soares, e criamos o curso pré-médico gratuito para
vestibulandos carentes. Trabalhei e debati tudo isso com seu pai, o notável
pediatra José Maria, na previdência estadual. Outra cooperação entre nós foi a
liberação da vacina para leishmaniose. Outra foi a criação da Fapemig. Quando
reclamei que nossas criatividades sempre acabavam desviadas para o lucro (o pré-médico
para o cursinho Pitágoras, e a Farmacobrás para a Biobrás) ele sorria e
justificava: mas o ideal nacionalista é o mesmo. Carlos Diniz me dizia que as
coisas seriam outras se nelas fossem envolvidas a recuperação da atual Funed e
a própria Fapemig. Se vivos, Diniz e Marcos teriam sido personagens decisivos no
drama das vacinas para covide.
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