João Amílcar Salgado

sábado, 27 de abril de 2024


 

A FARMACOBRÁS E A INSULINA

João Amílcar Salgado

Em 1963, o presidente João Goulart passou a defender as chamadas reformas de base, propostas desde 1962. Foram reunidas, em estudo de San Tiago Dantas, em reformas agrária, educacional, tributária, administrativa, urbana e da remessa de lucros das multinacionais. Estudantes e docentes de medicina da UFMG, se reuniram, ainda em 1963, para exigir a inclusão da reforma farmacêutica entre aquelas propostas. Inspirada na criação, 10 anos antes, da PETROBRÁS, foi proposta a FARMACOBRÁS, que estabeleceria o monopólio estatal da importação dos insumos farmacêuticos, bem como a fabricação estatal de medicamentos essenciais, mas permitiria a fabricação privada de medicamentos. Tal reunião surgiu de um debate entre os estudantes e o professor Carlos Ribeiro Diniz, promovido por mim. Dela participaram, entre outros, os docentes e residentes Carlos Diniz, Marcos Luiz dos Mares Guia, João Amílcar Salgado, Zigman Brener, Wilson Beraldo, Lineu Freire Maia, Arnaldo Elian, Luís Cisalpino Carneiro, Cid Veloso, José Ribeiro de Paiva, Paulo Madureira de Pádua e Rubem Simões – e os estudantes, entre outros, Henrique Santillo, Philadelpho Siqueira, Wilson Almeida, Lúcio Almeida, Antonio Dilson Fernandes, Edward Tonelli, Naftale Katz e Evilázio Ferreira. O Betinho, presidente da UNE, pediu para ser informado do resultado da reunião. Com o advento da ditadura, a Farmacobrás foi modificada para Biobrás, restrita afinal a fabricar insulina. A Biobrás foi fundada em 1976 por Marcos dos Mares Guia e por Guilherme Emrich. Desenvolveu brilhantemente a insulina recombinante (insulina humana produzida em bactérias transgênicas). Em 2001 Marcos fez acordo da Biobrás com a empresa dinamarquesa Nordisk. Em 2010 esta comprou aquela por 75 milhões de dólares, quando o laboratório brasileiro faturava mais de 50 milhões de reais ao ano. A Nordisk veio para aqui em 1990, especializada em diabete, e faturou 3,8 bilhões de dólares em 2002. Os ex-controladores ficaram com a patente da insulina recombinante e fundaram a Biomm, capaz de incorporar qualquer novidade tecnológica.

Desde 1956 o Marcos e eu já tínhamos iniciativas conjuntas: começamos com um grupo para estudar alemão, que incluía o Guilherme Cabral e o Emir Soares, e criamos o curso pré-médico gratuito para vestibulandos carentes. Trabalhei e debati tudo isso com seu pai, o notável pediatra José Maria, na previdência estadual. Outra cooperação entre nós foi a liberação da vacina para leishmaniose. Outra foi a criação da Fapemig. Quando reclamei que nossas criatividades sempre acabavam desviadas para o lucro (o pré-médico para o cursinho Pitágoras, e a Farmacobrás para a Biobrás) ele sorria e justificava: mas o ideal nacionalista é o mesmo. Carlos Diniz me dizia que as coisas seriam outras se nelas fossem envolvidas a recuperação da atual Funed e a própria Fapemig. Se vivos, Diniz e Marcos teriam sido personagens decisivos no drama das vacinas para covide.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário