João Amílcar Salgado

terça-feira, 29 de junho de 2021

 


O ESPORTE FAZ COMOVENTE HOMENAGEM À CIÊNCIA E À SAÚDE

João Amílcar Salgado

No primeiro dia do torneio de tênis de Wimbledon, 28/6/21, quem se tornou protagonista em Londres não estava em quadra, mas em meio ao público: a britânica Sarah Gilbert, cientista da universidade de Oxford, líder das pesquisas da vacina  AstraZeneca, preciosa arma contra a atual pandemia de covide. Foi aplaudida de pé, em comovente homenagem à ciência, aos cientistas e ao SUS britânico (vídeo anexo). Fiquei bastante emocionado em razão de minha ligação a esta universidade e por ser um dos iniciadores do SUS do Brasil.

https://twitter.com/i/status/1409492721715253251

segunda-feira, 21 de junho de 2021

 


VIAGEM AO REDOR DE MEU QUARTO

Honra-me ter sido orador da turma em 1960, exatos 30 anos após Guimarães Rosa ter sido orador, na mesma faculdade. Na saudação a seu paraninfo - o sulmineiro Samuel Libânio, ex-aluno do Padre Vítor - Rosa diz dele: “Ficaram inesquecíveis para nós aquelas aulas, quando ele conduzia o bando de aventais brancos por entre os leitos da enfermaria, em excursão “não menos instrutiva por menos variada que a VOYAGE AUTOUR DE MA CHAMBRE”, segundo palavras dele próprio.”

A VOYAGE (VIAGEM AO REDOR DE MEU QUARTO) é célebre texto de Xavier de Maistre, de 1794, em que um homem é sentenciado à prisão em seu próprio quarto, na companhia de um criado e um cão. Ali, em vez de se entregar à melancolia, propõe ao mundo nova maneira de viajar: ao redor do quarto. Ora, se Libânio considerava a ronda de leitos da enfermaria tão instrutiva quanto a VOYAGE, é quase certo que Rosa, em sua viagem ao redor do regionalismo de seu sertão nativo, o considerasse universalmente grande. Ou seja, como de Maistre, Rosa propôs ao mundo nova maneira de ser literariamente universal, conforme aplauso ouvido de leitores de todos os continentes.  Proposta análoga fora feita por James Joyce, em uma viagem também universal ao redor de um dia e em outra ao redor de uma noite. Pablo Neruda, por sua vez, percorre quatro partes de um dia, brindando-nos com cem sonetos de amor.

Luiz Savassi Rocha, nosso maior roseólogo, assinala que Carlos Drummond (formando em farmácia quando Rosa era calouro no mesmo ambiente universitário e nele também contemporâneo de meu pai) dá notícia de outra VOYAGE ocorrida no Brasil.  Foi empreendida nos limites da cela da prisão da Ilha Grande pelo eminente ornitólogo Helmut Sick, quando, por ser alemão, ali ficou recluso à época da 2a guerra mundial. Drummond diz: “Aí, não podendo estudar aves em sua cela, estuda míseros companheiros de solidão: pulgas, percevejos, cupins – só destes últimos, identifica onze espécies desconhecidas.”

Na mesma ocasião do Grande Sertão, Aldous Huxley propõe uma sétima VOYAGE: em torno da própria mente, com auxílio de alucinógeno – a qual Timothy Leary chamou psicodélica e de cujo culto surgiu uma seita, o delismo, para alguns, infernal.

 

[APERITIVO PARA “O RISO DOURADO DA VILA” 2ª ED - BREVE]

 

domingo, 13 de junho de 2021

 ILUSTRES LIBANESES E CARVALHOS DO SUL DE MINAS

João Amílcar Salgado

A cidade sulmineira de São Gonçalo do Sapucaí se distingue na história da medicina brasileira por três marcos: 1) é o local de nascimento e destino de Faustino José Azevedo, diplomado em 1793,  um dos estudantes de medicina iluministas, denominados por Pedro Sales de o grupo de Montpellier, responsáveis pelas diversas inconfidências havidas na busca de nossa independência, 2) é o local do assassinato do Barão do Rio Verde cometido por um médico insano, causa de embate corporativo, e 3) é o local de nascimento de três médicos, um pai e dois filhos - esplendente trio, que faz transbordar de orgulho não apenas essa cidade, mas nosso Estado e nosso país. Estes são José, Márcio e Romeu Ibrahim de Carvalho, o primeiro formado no Rio em 1925 e os outros dois na atual UFMG, em 1952 e 1953 (aparentados aos Carvalhos da Vila).

            O são-gonçalense José Ibrahim de Carvalho, ligado à aristocrática escola cirúrgica de Brandão Filho, no Rio, ocupa lugar proeminente na medicina mineira, pois, desde a formatura, decidiu enfrentar a dura missão de dar assistência integral a sua cidade natal e região, com seu excepcional talento de polivalente clínico e seguro cirurgião.  Mais que isso, diante da precariedade das condições, não vacilou em construir hospitais e facilitar o acesso aos necessitados, além de lançar-se na política para conseguir aquilo que estava fora do alcance profissional. Com legendária popularidade, fez-se prefeito municipal, em quatro mandatos desde 1936. Daí assegurou melhorias sanitárias e ágil modernização nos aspectos urbanísticos e sociais, incluindo a educação, o esporte e a cultura.  Talvez não tenha havido médico no Brasil com tamanha capacidade para buscar e dominar recursos emergentes, tanto na saúde como nas demais áreas. Esteve sempre adiante de seu tempo, exemplo disso é a evolução que empreendeu para estar junto dos pacientes. Iniciou atendendo a cavalo, passou ao uso da motocicleta e depois do automóvel, ainda a percorrer estradas de carro de boi. Por fim, na década de 40, convenceu os fazendeiros a construir quatorze campos de pouso em suas fazendas, nos quais, com a maior desenvoltura, descia pilotando um avião Piper, popularmente apelidado de teco-teco. Mas sua maior realização, entre tantas e tão importantes, foi gerar dois expoentes de sua própria profissão, os magníficos doutores Márcio e Romeu.

A turma de 1952 da UFMG é invejável conjunto de médicos. Admiro entre eles o Márcio Ibrahim de Carvalho, que, sobre ser insuperável ortopedista, compõe aquele pugilo de personalidades que denominei varões plutárquicos da medicina.  Quando eu cursava o primeiro ano, em 1955, o Márcio já estava nos EUA, onde desenvolveu sua especialização em alto estilo, ou seja, de certo modo de costa a costa, primeiro em Filadélfia (Pensilvânia) e depois em São Francisco (Califórnia).  Um homem, com sua inteligência e com tal preparo, deveria ter regressado para ser meu professor de quinto ano em 1959, mas fui privado irreparavelmente desse privilégio.

O Márcio acumulou impressionante sucessão de êxitos como clínico, cirurgião, planejador, administrador e líder corporativo – sempre submisso à ética, quer no cuidado da mais humilde pessoa até no de muitas celebridades. Eu que estudei administração hospitalar, não me lembro de aula melhor sobre o tema do que quando o Márcio percorreu comigo os novos arranjos criados por ele no hospital Sarah Kubitschek de Belo Horizonte. Aquele ambiente de Niemeyer estava ali trabalhado por um médico capaz de preenchê-lo com a engenhosidade à altura de quem o criou.

 


quinta-feira, 10 de junho de 2021

 


 GOMIDE BORGES, PICADA DE GOIÁS E GOMIDES DA VILA

        O Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais foi criado em 1977. De imediato, Ciro Gomide Loures e Paulo Gomes Leite passaram a documentar o médico mineiro Antônio Gonçalves Gomide, senador, constituinte de 1823 e primeiro psiquiatra brasileiro. Em 1992, foi publicado por José Gomide Borges O SERTÃO DE NOSSA SENHORA DAS CANDEIAS DA PICADA DE GOIÁS. O acervo reunido por José passou a ser fundamental para documentar a própria família Gomide.

              Ciro Gomide Loures é a maior autoridade no herói Tiradentes, sendo ambos dentistas. Sobre Antônio Gomide, ele revelou o episódio entre o psiquiatra e o naturalista Saint-Hilaire, pelo qual se antecipa em 1817 a descrição do reflexo condicionado de Pavlov (1904). Gomide fez o francês testemunhar o dito reflexo em animais de tropa, na cidade de Caeté. Gomes Leite, por sua vez, autenticou ser Antônio Gonçalves o verdadeiro autor da IMPUGNAÇÃO ANALÍTICA (1814) aos milagres da Irmã Germana. Com essa impugnação ele não só inaugura a psiquiatria brasileira, como antecipa conceitos só depois enunciados por Sigmund Freud.

              Já José Borges nos revelou Itapecerica como a cidade irradiadora dos Gomide em Minas. Iniciam-se pelo luso Xavier Gonçalves Gomide, nascido na freguesia de Santa Maria de Devela, vila de Castelo de Vide, batizado a 9-5-1712. Filho de pai homônimo e de Margarida Carrilho, era neto paterno de Manuel Gonçalves Gomide e Isabel Morata. De Itapecerica, seu filho Tomás foi para Piranga, onde se tornou pai do futuro médico por Edimburgo e senador. Este veio clinicar em Caeté, onde cuidou da futura Marquesa de Santos. Dois outros filhos de Tomás, Emílio e Jaime, foram para Rio Novo, onde nasceu Ciro.

              Xavier Gomide é também pai de Teresa Gonçalves, genitora de Manuel Antônio Gomide, por sua vez pai de João Lourenço Gomide, fixado em Campo Belo. Este deixou descendentes aí e ainda em Lavras, Perdões, Nepomuceno e Candeias, onde nasceu Gomide Borges. Em Perdões também nasceu Laura Eucélia Leite Gontijo Gomide, bisavó do autor do presente texto (esposa do bisavô Manoel Alves Vilela e mãe do avô Joaquim Alves Vilela).

          Gomide Borges traça o parentesco entre os Gomide, Carrilho e Morato, desde ainda Portugal, e o parentesco mineiro destes com os Alves de Figueiredo e os Alves Vilela (denotadores das linhagens Taveira e cabralina).  Quase todos migraram ao oeste, pela picada de Goiás, encontrando-se Carrilhos, Vilelas e Figueiredo no Triângulo, noroeste paulista, Goiás, Tocantins e Mato Grosso. Observe-se que um dos fundadores de Uberlândia é Carrilho (Carrejo ou Carrijo). E o próprio sobrenome Borges do pesquisador é notório nesses mesmos lugares.

[APERITIVO PARA LIVRO O RISO DOURADO DA VILA 2ªed, BREVE]

domingo, 6 de junho de 2021

 

 

Acabo de receber um e-mail do CFM, intitulado, CFM PUBLICA MOÇÃO DE REPÚDIO EM DEFESA DO MÉDICO, AO RESPEITO E À CIVILIDADE NA CPI DA PANDEMIA. Diante dos termos ambivalentes desta moção, respondi o e-mail com o seguinte teor

De João Amílcar Salgado ao CFM

4/6/21

SOU MÉDICO, PROFESSOR TITULAR DE CLÍNICA MÉDICA DA UFMG, EX-PESQUISADOR DO FIOCRUZ, HISTORIADOR DA MEDICINA, CRIADOR DO CENTRO DE MEMÓRIA DA MEDICINA (UFMG), AUTOR DE ESTUDOS SOBRE JK E SOBRE OS CONSELHOS CORPORATIVOS, ESPECIALMENTE O CFM E OS CRMS.

SOU PRINCIPALMENTE CONTRÁRIO À PARTIDARIZAÇÃO DA SAÚDE.

 DIANTE DISSO, CONSIDERO LAMENTÁVEIS OS POSICIONAMENTOS DO CFM E DAS CORPORAÇÕES MÉDICAS NESTA PANDEMIA.

 NÃO ME CONSIDERO REPRESENTADO PELO CFM, PELO CRMMG, PELA AMB E PELA AMMG.

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NA INTERNETE, A FILOSOFIA FICOU POPULAR


JOÃO AMÍLCAR SALGADO
Diante disso, relembro aqui meu vestibular de filosofia. A inscrição para a Ufmg ainda era no edificio Acaiaca. Meu colega de república estava saindo para se inscrever em engenharia e um outro falou que, se eu também fosse me inscrever, passaria em primeiro lugar. Eu disse que aproveitaria a ideia para me inscrever não em engenharia, mas em filosofia - e que, nesse sim, eu  passaria em primeiro lugar. E passei em primeiro. Era um desejo de desde quando fui aluno do Artur Veloso no colégio estadual. E na banca da prova oral quem estava lá?  O Veloso. Fui agüido também pelo Morse Belém e pelo Eduardo Frieiro. O professor Luiz Andrés me processou na congregação da medicina, com a alegação de que minha frequencia na filosofia violava minha dedicação exclusiva. Quem deu parecer sobre isso foi Wilson Beraldo, que considerou, ao contrário, digna dos maiores elogios aquela minha atividade. Exemplos de contribuição, entre outras,  de minha formação filosófica à minha produção na área médica são o estudo da cooperação versus competição, referente à EQUIPE-MÍNIMA, e o estudo histórico da medicina, que resultou no CENTRO DE MEMÓRIA da medicina, em Minas, com a consequente disseminação do ensino da história da medicina pelo país.

Em 1962, estudar filosofia era escalafobético, termo da época. Surpreende hoje a fauna que se jacta de autoridade em filosofia, pelas redes de comunicação, entre a qual astrólogos, blogueiros e comediantes. Quando estudei, fiz o levantamento de filósofos brasileiros. Nessa busca topei a frase de Giovanni Papini: não há mais filósofos, todos foram mortos pelos professores de filosofia. Os que encontrei eram padres:  Leonel Franca, William Silva, Orlando Vilela e Henrique Lima Vaz. Não-padres, apenas dois, mesmo assim católicos: Artur Veloso e Mário Santos. Este, sentindo-se no fim, pediu que o pusessem de pé, rezou o pai-nosso e faleceu. Suas traduções de Nietzsche são paradoxais. Já Leonel fazia parte de minha biblioteca paterna, por suas NOÇÕES DE HISTÓRIA DA FILOSOFIA (1918), mas me são preciosas duas de suas outras obras O PROTESTANTISMO NO BRASIL (1938) e O MÉTODO PEDAGÓGICO DOS JESUITAS (1952). O Orlando tinha todos os sintomas de ser meu parente, ainda mais que nasceu em Ventania (Alpinópolis), autor do ótimo UM BURRO E SUA SOMBRA (1965). Do Henrique Vaz cito ANTROPOLOGIA FILOSOFICA (1991), que Joaquim Carlos Salgado e eu lemos ainda mimeografada. O avô de Vaz era médico, sósia de Pedro 2º e revelou que a filariose tinha por vetor um pernilongo. Do Veloso, cujas aulas no Colégio Estadual eram um refrigério na azáfama do vestibular e assim me atraíram para a filosofia, cito A FILOSOFIA E SEU ESTUDO (1947) e VIDA DE KANT (1956). Na primeira aula, quando citou Parmênides: o ser é e o não-ser não é me causou misto de alegria e ciúme, pois fui Parmênides, quando, no primeiro dia de escola primária, a Ìracema Lima me testou: quem não é gordo é ... e respondi não é - e ela me reprovou. Todos, menos Franca e Santos, foram meus professores. Na Vila, quatro filósofos brilham: padre João Assunção, o citado Joaquim Carlos, padre Luís Henrique Eloi e Guilherme Carvalho.

Nesta lembrança, devem ser incluídos o helenista Silvio Barata Vianna, autor de O IDEALISMO EM PARMÊNIDES DE ELEIA (1973) e ENSAIOS DE HISTORIA DA FILOSOFIA (1990)), o poeta e esteta Moacir Laterza, autor de CANTO QUE AMANHECE (1955) e ROTEIRO ESTÉTICO DAS MINAS ENGANOSAS (2002) e o notável latinista e devoto da música erudita Flávio Neves, autor de BACH, BEETHOVEN E WAGNER (sd) e RESCALDO DE SAUDADES (1986)). O Sílvio parecia ser o único que cotejava os conceitos filosóficos com as palavras originais em grego e, na minha turma, ficou surpreso comigo e com o Luiz Gonzaga de Carvalho, porque também éramos adeptos deste esporte - e em grego e latim. De minha parte, fiquei surpreso de saber que ele não lia inglês. Numa aula citei Bertrand Russel e ele indagou onde eu lera aquilo e respondi: no livro A HISTORY OF WESTERN PHILOSOPHY (1946). Ele, com certa inveja, sorriu: então você lê filosofia em inglês? Ali os docentes mais eruditos se limitavam a ler em francês. Exceção era um comparsa e amigo, o filosofo bertrandista e matemático José Maria Pompeu Mémória. Um primo de Bertrand Russel teria vindo para o Brasil e seu avô se desentendeu com Pedro 2º. Desse nosso grupo participava a Soninha (Sônia Viegas), pioneira aqui como mulher filósofa.

O Laterza, juntamente com outros docentes e estudantes, parecia sempre temeroso de ser preso, a qualquer momento, pela ditadura. Discordei de seu existencialismo, mas logo nos tornamos amigos e se manifestou honrado de ter sido meu mestre. Já o Flávio, quase foi colega de internato de meu pai no colégio de São João del Rei e ambos quase foram ali colegas de Guimarães Rosa. Era tio de meu querido colega de turma Armando Gil e encabeçava um grupo de médicos aliciados pelo Baeta Viana, para ouvintes coletivos de Bach, Mozart, Beethoven e Wagner. O Flávio passou a fazer em latim as atas dos encontros, aos quais chamou de melofilia hipocrática. Nelas traduzia até nomes próprios, por exemplo Clovis Salgado era Clodoveus Salsus e José Feldman era Josephus Agrigenta. Outros melófilos eram o Galizzi, o Greco, o Nassim, o Santoro, adjuntos, assistentes, estagiários e fâs.  Flávio se indignou quando, em Diamantina, ficou sabendo que um vereador havia proposto a mudança do nome antigo de um beco, para bajular um figurão da cidade.  Escreveu em latim uma carta de protesto dirigida à câmara. O nome do beco era (ou é) Quebra-Bunda, que em latim ficou mais elegante como “Cunem Frangentis”. Jà em Salvador, a ladeira da rua Arlindo Fragoso, que faz a ligação entre a Rua do Sangradouro e os Galés, foi batizada de Quebra Bunda.  E há também o morro do Quebra Cu na ilha baiana de Boipeba. Por fim, em Pitangui, há o córrego Rala Cu.

 

 

terça-feira, 1 de junho de 2021

 


JOSE GERALDO RIBEIRO

     Hoje, 1/6/21, ocorreu uma coincidência impressionante.  José Geraldo Ribeiro, a maior autoridade brasileira em vacinas, declara sua despedida. E, em contraste, pela tevê, passamos o dia vendo o depoimento de uma impostora. O José e eu, que somos infectologistas, presenciamos alguém que exibiu toda a sua completa incompetência científica e sua gigantesca maldade para, em nome da ciência, propagar falsa terapêutica, em vez de vacinas. Com isso enganou milhões e contribuiu para causar a morte de incalculável número de brasileiros.

Eis a despedida do José.

Hoje encerro oficialmente minhas atividades como neonatologista. Na verdade, quando entrei na FM UFMG tinha como objetivo ser pesquisador, especialmente nas áreas de parasitologia e entomologia. Mas nos ambulatórios da Faculdade desenvolvi a paixão pela pediatria. Também  com os maravilhosos professores daquele Departamento era fácil apaixonar-se. No internato de neonatologia, através de meu professor César Xavier veio o encantamento pela área. Durante minha residência na FHEMIG fiz 6 meses de neo no berçário da Octaviano Neves. Fantástico. Como professor Edson Corrêa, um dos maiores pediatras qu conheci, e que compartilhava comigo o amor também pela Saúde Coletiva. Exercer a neonatologia era um sonho difícil de r pealizar, pois naquela época entrar em maternidades públicas dependia muito de indicações e eu fui o primeiro médico de minha família e não tinha também padrinhos políticos. Nas maternidades privadas era necessário ser cotista e eu não tinha recursos para tal. Aí vem a surpresa: antes do término de minha residência, em outubro de 1981, a Octaviano Neves me convida para compor seu corpo clínico. Formou-se um laço indissolúvel entre eu e a instituição. Durante esse tempo tive convites de outras maternidades, em BH, outras cidades e do Canadá. Mas nunca consegui deixar a Octaviano, onde sempre me senti querido e respeitado. E lá nasceram meus filhos amados.

            Durante esses 40 anos e o cuidado de mais de 12 000 recém-nascidos,  a neonatologia mudou muito. Assisti a espetacular revolução da sobrevivência dos prematuros. A especialidade ficou mais tecnológica, com a utilização de grande número de aparelhos. As relações humanas pioraram; antes vistos pelos clientes com admiração passamos a ser suspeitos de negligentes, até prova em contrário.

            Minha maior alegria é ter tido como colegas várias ex- alunas e ex-residentes. E reconhecer, nos olhos brilhantes delas e deles, os meus. Tive muita sorte. Jamais esquecerei a Octaviano, seus funcionários, enfermagem e colegas. Jamais esquecerei a delícia de ter um RN no colo. Sou muito agradecido a todos.