ILUSTRES LIBANESES E CARVALHOS DO SUL DE MINAS
João Amílcar Salgado
A cidade
sulmineira de São Gonçalo do Sapucaí se distingue na história da medicina
brasileira por três marcos: 1) é o local de nascimento e destino de Faustino
José Azevedo, diplomado em 1793, um dos
estudantes de medicina iluministas, denominados por Pedro Sales de o grupo
de Montpellier, responsáveis pelas diversas inconfidências havidas
na busca de nossa independência, 2) é o local do assassinato do Barão do Rio
Verde cometido por um médico insano, causa de embate corporativo, e 3) é o
local de nascimento de três médicos, um pai e dois filhos - esplendente trio,
que faz transbordar de orgulho não apenas essa cidade, mas nosso Estado e nosso
país. Estes são José, Márcio e Romeu Ibrahim de Carvalho, o primeiro formado no
Rio em 1925 e os outros dois na atual UFMG, em 1952 e 1953 (aparentados aos
Carvalhos da Vila).
O
são-gonçalense José Ibrahim de Carvalho, ligado à aristocrática escola
cirúrgica de Brandão Filho, no Rio, ocupa lugar proeminente na medicina
mineira, pois, desde a formatura, decidiu enfrentar a dura missão de dar
assistência integral a sua cidade natal e região, com seu excepcional talento
de polivalente clínico e seguro cirurgião.
Mais que isso, diante da precariedade das condições, não vacilou em
construir hospitais e facilitar o acesso aos necessitados, além de lançar-se na
política para conseguir aquilo que estava fora do alcance profissional. Com
legendária popularidade, fez-se prefeito municipal, em quatro mandatos desde
1936. Daí assegurou melhorias sanitárias e ágil modernização nos aspectos
urbanísticos e sociais, incluindo a educação, o esporte e a cultura. Talvez não tenha havido médico no Brasil com
tamanha capacidade para buscar e dominar recursos emergentes, tanto na saúde
como nas demais áreas. Esteve sempre adiante de seu tempo, exemplo disso é a
evolução que empreendeu para estar junto dos pacientes. Iniciou atendendo a
cavalo, passou ao uso da motocicleta e depois do automóvel, ainda a percorrer
estradas de carro de boi. Por fim, na década de 40, convenceu os fazendeiros a
construir quatorze campos de pouso em suas fazendas, nos quais, com a maior
desenvoltura, descia pilotando um avião Piper, popularmente apelidado de
teco-teco. Mas sua maior realização, entre tantas e tão importantes, foi gerar
dois expoentes de sua própria profissão, os magníficos doutores Márcio e Romeu.
A turma de
1952 da UFMG é invejável conjunto de médicos. Admiro entre eles o Márcio
Ibrahim de Carvalho, que, sobre ser insuperável ortopedista, compõe aquele
pugilo de personalidades que denominei varões plutárquicos da medicina. Quando eu cursava o primeiro ano, em 1955, o
Márcio já estava nos EUA, onde desenvolveu sua especialização em alto estilo,
ou seja, de certo modo de costa a costa, primeiro em Filadélfia
(Pensilvânia) e depois em São Francisco (Califórnia). Um homem, com sua inteligência e com tal
preparo, deveria ter regressado para ser meu professor de quinto ano em 1959,
mas fui privado irreparavelmente desse privilégio.
O Márcio
acumulou impressionante sucessão de êxitos como clínico, cirurgião, planejador,
administrador e líder corporativo – sempre submisso à ética, quer no cuidado da
mais humilde pessoa até no de muitas celebridades. Eu que estudei administração
hospitalar, não me lembro de aula melhor sobre o tema do que quando o Márcio
percorreu comigo os novos arranjos criados por ele no hospital Sarah Kubitschek
de Belo Horizonte. Aquele ambiente de Niemeyer estava ali trabalhado por um
médico capaz de preenchê-lo com a engenhosidade à altura de quem o criou.
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