LEMBRANÇAS
PERMANENTES DE MEU PRIMO ADAUTO
João Amílcar Salgado
Espero
que alguém da família escreva um livro sobre os BARBOSA LIMA. Até lá, me
antecipo relatando minha convivência com essa gente querida. Menciono de início
a viúva dona Sinhaninha (Ana), nossa vizinha de frente que, quando nasci, a
toda hora atravessava a rua para me aconchegar em seu colo. Mais tarde, lá
vinha ela com papéis para que eu conferisse números, justificando: “tenho
absoluta confiança na aritmética desse menino”. Tão rica! e nunca me pagou pela
contabilidade... Mais tarde, me chamava para fazer-lhe um exame clÍnico e dizia
o mesmo de minha medicina. Quando estudei os Vilelas conclui que ela era uma
Vilela autêntica e brilhante. Como pioneira empresária feminina, foi êmula da
Sinhá Junqueira. Todos os Vilela-Barbosa são raça inteligentíssima. Seu filho
José também me fazia de consultor em mercado de grãos e gado. Já o Vavico foi
meu padrinho e guru. Se tivesse curso superior, seria sumidade acadêmica,
simplesmente enciclopédico. Deixou seu jipe 54 para mim, mas o Renato disse que
precisava dele. E as filhas Chiquita, Tiana
e Odete eram como irmãs de minha mãe, aliás primas pelo Lima e pelo Vilela. O
Odilon, por sua vez, era sósia físico e psíquico do tio Lela.
A
primeira lembrança que tenho do Adauto foi em 1946, quando ele, seu primo
Oscarsinho (Resende Negrão de Lima), meu tio Aprígio e o Alberto Sarquis se
reuniram em nossa farmácia para planejar a formatura dos quatro, naquele ano.
Outra lembrança foi quando o jovem médico montou seu cavalo de raça em nossa
porta. O cavalo, que estava vadio, empinou e o Zé Piraquara o sofreou pela
barbela. Mais uma: ele chegou num carrão luxuoso e os frequentadores da
farmácia ficaram estatelados de ver que, no banco de trás, vinha um bezerro chiquésimo,
presente de riquíssimo fazendeiro, grato pelo atendimento da filha. Certo dia,
no colégio marista varginhense, fui chamado do internato para requintado almoço
com meu tio, a dona Sinhaninha e o Adauto, este chegado de Nova Iorque. Quando
fundamos o jornal O ELO, ele nos fez derramado elogio e prometeu colocar
tudo num texto, que não nos chegou. Em um aniversário em BH, o Sebastião
Sampaio, catedrático da USP, disse que estava encantado com minha prosa, mais
ainda porque meu modo de falar era idêntico ao de grande amigo dele. Eu disse
que não precisava dizer quem era, “seu amigo é o Adauto Barbosa e a semelhança
vem de que somos primos”. Ele então me deu um caloroso abraço. Outro colega
dessa mesma turma de 46 estava na diretoria da faculdade da UFMG, apaniguado da
ditadura - era o Tancredo Furtado. No Clube Pinheiros, em São Paulo, ele bate papo com o Adauto e o Oscarzinho,
dizendo-se angustiado com a pressão do general Campello para que neutralizasse
os subversivos locais. Afirmou que um estudo pela técnica Delphi revelara que os
mais ameaçadores cérebros da UFMG eram da medicina: Angelo Machado, Marcos
Mares Guia e João Amílcar. Seu problema era que os dois primeiros foram para o
ICB e o último ficou na faculdade, mas era o mais terrível. Os primos Adauto e
Oscar danaram a rir: “Tancredo, deixe de ser bobo, fique tranquilo, o João é
nosso primo, não tem nada de perigoso, muito pelo contrário!...”