JARBAS JUAREZ E A FAIXA PRESIDENCIAL
João Amílcar Salgado
O
Betinho (Herbert José de Souza), nos anos dourados, foi meu contemporâneo no
afamado Colégio Estadual (inclusive os ilustres Sepúlveda Pertence, José
Guilherme Vilela, Guido Almeida, José Anchieta Correa, Acácio Rocha Filho,
Paulo Lobo, Ernesto Lentz, Marie Louise Stein e Sérgio Vasconcelos) e também na
UFMG. Fiz parte da liderança que o lançou candidato de conciliação à UNE
(vetado pela UIE). Defendo a tese de que se tivesse presidido a UNE teria obstado
o golpe de 64. Nessa época queríamos o prêmio Nobel da Paz para Josué de Castro,
pelos livros GEOGRAFIA DA FOME (1946) e GEOPOLÍTICA DA FOME
(1951), bíblias da FAO, antecessor brasileiro e internacional do Betinho.
Já
em 1979, estávamos sob o manto sombrio da ditadura. O Betinho deixou de ser o
irmão do Henfil, que talvez tivesse morrido no exílio, conforme a canção O
BÊBADO E A EQUILIBRISTA de Aldir Blanc e João Bosco, hino da Anistia. É
que, felizmente, ele estava vivo de volta entre nós, para cumprir grave missão:
denunciar a fome e tentar zerá-la. Tal missão culmina, em 1993, com duas de suas
expressões: “FOME ZERO” e “QUEM TEM FOME TEM PRESSA”. Em 79, comentávamos
isso tudo no Centro da Memória da Medicina, quando o Jarbas Juarez começou a
rabiscar um desenho, que depois virou uma escultura armada na Praça 7. Apareceram
ali agentes da ditadura e avisaram aos populares que aquela coisa era
subversiva. A seguir, desmontaram a obra-de-arte a pontapés. O genial autor (por
sinal, descobridor do Henfil cartunista) nos chegou desolado. Pedi para recompor
sua criação no saguão da Faculdade de Medicina. Os paus-mandados não ousaram
repetir a agressão, naquele território de liberdade. O Betinho foi, desta vez,
por nós indicado ao Nobel da paz, quando o Brasil, enfim em 2014, saiu do mapa
mundial da fome, ao qual voltou em 2022. Sua premiação nobel foi, no início, possivelmente
inviabilizada por sua influencia na formulação da Teologia da Libertação. Além disso fomos advertidos de que o Nobel só premia vivos, daí clamamos para que inaugurassem o póstumo.
A
escultura era uma réplica da ÚLTIMA CEIA de da-Vinci (1498, dois anos
antes da chegada de Cabral), só que os apóstolos foram substituídos por
esquálidas vítimas da fome. No dia 1/1/23, ao ver aqueles que colocaram a faixa
no novo presidente, tive os olhos umedecidos pela extraordinária semelhança com
a fabulação profética do talentosíssimo nepomucenense adotivo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário