João Amílcar Salgado

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

 


CRIME DE MORTE NA SAÚDE

João Amílcar Salgado

Em 2009 fui um dos primeiros a contestar a criação dos cursos de biomedicina no Brasil. Divulguei uma advertência contra a criação desse absurdo na UFMG. Dizia então: “A biomedicina é uma grilagem ocupacional. Acabamos de tomar conhecimento pela televisão de triste e inacreditável notícia: A UFMG ESTÁ CRIANDO UM CURSO DE BIOMEDICINA! Se for verdadeira e se a diretoria da Faculdade de Medicina e sua Congregação nada fizeram contra tamanha leviandade, então a memória da instituição e das pessoas omissas estará irreversivelmente manchada. Isso se aplica igualmente à Associação Médica de Minas Gerais, ao Conselho Regional de Medicina, ao Sindicato dos Médicos e à Academia Mineira de Medicina – extensivamente a cada um e a todos os respectivos membros.”  Diante disso, os proponentes esperaram a poeira baixar e, com o acovardamento do diretor Xico Pena, tal curso foi criado, em 2010, na Faculdade de Farmácia da UFMG e outros tantos pelo país afora.

Restou que minha advertência hoje equivale a melancólica profecia de lesões e mortes cometidas por egressos instigados ao exercício ilegal da medicina. Exemplo é uma morte que deveria ser abafada, mas chegou ao noticiário. Foi o assassinato da jovem Iris Martins cometido pela biomédica Lorena Marcondes, em Divinópolis, em 8/5/23.  A imprensa assinalou que o Conselho Regional de Biomedicina admitiu que sabia, há mais de um ano, que a criminosa trabalhava com procedimentos proibidos e confirmou que, apesar de constatar o exercício ilegal da medicina, os fiscais não tomaram nenhuma atitude efetiva para coibi-lo.

Como historiador da medicina, afirmo que o exercício da medicina por não-médicos sempre ocorreu em locais carentes de médicos ou com médico inacessível. Os profissionais habilitados eram substituídos por boticários, barbeiros, dentistas, veterinários, fisioterapeutas, esteticistas e curandeiros, com algum ou nenhum treinamento. A autonomia da indústria de cosméticos, as novas tecnologias, a população crescente de idosos sadios, a valorização da beleza feminina e masculina, os procedimentos anti-obesidade,  o transplante de cabelo e outros novos procedimentos de cirurgia plástica multiplicaram as “trambiclínicas”, gambiarras mais do que improvisadas, desprovidas de gente e recursos apropriados. Obviamente, desgraças como a descrita continuarão acontecendo, sendo ocultada a maioria.

Os cursos de biomedicina foram criados antes da indecorosa liberação total da criação de cursos de medicina no Brasil e países vizinhos. Ora, depois destes aqueles perderam o sentido. Cumpriria, pois, aos ministérios da educação, da saúde e do planejamento a missão óbvia de disciplinar este fundamental setor profissional, por exemplo transformando os cursos já existentes de biomedicina em cursos decentes de medicina e reciclando seus egressos.

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