Neste dia 14-11-15, data da beatificação do Padre Vítor, em Três Pontas, foi colocado à venda na REVISTARIA DO HÉSIO, na praça Cônego Vítor, 77, a reedição deste livro, que foi publicado pela primeira vez em 1946 e foi a primeira biografia do agora beato Padre Vítor. Todos os demais livros e textos sobre o cônego Vítor foram escritos a partir desta obra do professor João de Abreu Salgado, ex-aluno do biografado. A reedição foi feita por João Amílcar Salgado, neto do autor, que também é biógrafo do cientista Carlos Chagas e de várias figuras históricas.
João Amílcar Salgado
segunda-feira, 16 de novembro de 2015
quinta-feira, 8 de outubro de 2015
ÊNIO
CARDILLO VIEIRA
O
BAETÓFILO POR EXCELÊNCIA

João Amílcar Salgado
Em meu livro
de memórias O RISO DOURADO DA VILA (2003), relato como conheci o Ênio: Se no primeiro ano médico o diretório
acadêmico estava precariamente localizado no porão do prédio antigo (onde
também começou o laboratório e a biblioteca criados por Baeta Viana), logo a
seguir foi transferido para o andar superior do prédio em frente, do outro lado
da avenida. Lembro-me de subir as
escadas e encontrar ali o Ênio Cardillo Vieira - logo depois meu monitor de
bioquímica, na época fascinado pela vitamina A - que estava ali como membro do
diretório estudantil, recebendo os formulários e retratos para nossas carteiras
de estudante.
O Ênio
participou, portanto, do grupo que revolucionou a atividade estudantil,
movimento contaminador de todo o resto do ensino superior em Minas. Em 2011, a propósito do
centenário da Faculdade, foram convidados os componentes desse grupo para falar
sobre tudo o que aconteceu, no curso de História da Medicina. Falaram Ângelo Machado, Jota Dângelo, José Gaetani, Wilson
Abrantes, Ely Bonini, Márcio Vasconcelos Pinheiro, Antônio Firmato, Geraldo Caldeira e João Uchoa Figueiró. O Ênio não quis falar mas
estava presente em todos as apresentações e era citado várias vezes. Assim acabou
falando depois de cada colega e a sua foi uma espécie de aula longitudinal ao
longo do semestre. O lado de ativista estudantil não cessou com a formatura e o
Ênio passou a usar este pendor inicialmente no grupo dirigente do Umuarama,
antigo clube de médicos, e posteriormente na Academia Mineira de Medicina.
Sobre seu
ativismo estudantil, o próprio Enio diz: Minha gestão foi
de março de 1954 a março de 1955. Márcio
Pinheiro elegeu-se, então, e foi Presidente do DA até novembro ou outubro de
1955. Isto porque houve uma reforma do estatuto do DA e a eleição passou a
ocorrer no fim do ano, em vez do início do ano. Em fins de 1955, João Virgílio
Figueiró foi eleito. Foi durante sua gestão que ocorreu a greve por um
representante na Congregação. Ely Bonini foi o executor da greve. Razão da mudança: Quando a eleição era em março, o
Presidente já pegava o DA com pouco dinheiro porque o repasse da Faculdade de
Medicina ocorria no início do ano. A eleição no fim do ano permitiria que o
novo presidente pudesse dispor da verba do ano.
O sul-mineiro
areadense Ênio pertence à linhagem dos Vieira, gente ilustre em Minas, mais
ainda no sul de Minas, e em mais de uma universidade. Provavelmente ligados aos
Vieira do jesuíta Antônio Vieira e do humanista Couto de Magalhães, enriquecem
a medicina mineira desde Vieira Couto, Vieira Matos, Antônio José Vieira de
Carvalho, Antonio José Vieira de Menezes e Arnaldo Vieira de Carvalho, seja em
Diamantina, seja em Vila Rica, seja em São Paulo, até os dias atuais, com Caio
Manso Carvalho, Ronan Vieira, Filadelfo Siqueira, Álvaro Vasconcelos, Guilherme
Cabral e (modéstia à parte) João Amílcar Salgado. Ao sul de Minas essa gente
chegou, por meio de, entre outros, Francisco Vieira da Silva, oriundo da
freguesia lusa de São João de Brito, termo de Guimarães, arcebispado de Braga.
Ênio Cardillo Vieira foi para os EUA
e de lá voltou com fino acabamento naquela disciplina saudável peculiar aos
melhores cientistas. Essa disciplina se chama método, ou melhor, atitude científica.
Aqui, ele, Eurico Alvarenga Figueiredo, Giovani Gazzinelli, Marcos Mares Guia,
Carlos Ribeiro Diniz, Wilson Teixeira Beraldo, João Batista Veiga Sales, José
Leal Prado, José Moura Gonçalves, Armando Neves e outros baetófilos (apelido
dado no meio universitário aos discípulos de Baeta Viana) deram continuidade à formidável obra do mestre. Observando o
conjunto de tão sobrelevados discípulos não é possível deixar de notar quantos
e quais são sul-mineiros. Dois destes fizeram contribuições históricas:
Beraldo, de Silvianópolis, é co-autor da segunda maior descoberta biocientífica
do país, a da bradicinina; Veiga Sales, de Lavras-Nepomuceno, é co-autor de
fundamental desenvolvimento na química do DNA.
Por mais eminentes que os discípulos diretamente bioquímicos tenham
sido, seria diminuir o mestre e eles próprios se não são citados os discípulos
fora da bioquímica. Carlos Pinheiro Chagas (patologia, mais colega que
discípulo), João Galizzi (semiologia),
Romeu Cançado (terapêutica), J.B. Greco e Antonio de Oliveira Lima (alergia), J.
Benjamim Soares (análises clínicas), José Feldman (tisiologia), Nassim Calixto
da Silveira (oftalmologia), Oscar Resende Lima e Flávio Neves (psiquiatria e
música), Adauto Barbosa Lima (cardiologia), Aprígio Abreu Salgado (epidemiologia), José
Henrique da Mata Machado (ortopedia), Ivo Pitangui (cirurgia plástica),
Tancredo Furtado (dermatologia), Carlos Pinheiro Chagas e Edgar Godoi Mata
Machado (política), bem como Ageo Pio So e Marcos de Mares Guia (indústria).
Todos eles levaram para além da bioquímica e a numerosos discípulos de terceira
e quarta geração a mesma atitude cientifica baetiana.
Em nosso curso
de História da Medicina, Ênio Cardilho Vieira ministrou conferências sobre a evolução do conceito de radicais
livres e sobre o desenvolvimento de animais experimentais isentos de micróbios.
Demais, tem colaborado em nosso esforço de coligir dois acervos: a genealogia
cientifica dos grandes mestres mineiros, no seu caso Baeta Viana, e aforismos inesquecíveis dos mesmos.
Independentemente
da admiração a tais figuras tutelares, eu próprio como historiador não deixo de
fazer críticas a Baeta Viana, como as contidas em capítulo do livro NOS SERTÕES
DE GUIMARÃES ROSA (2011) editado por Carlos Alberto Corrêa Sales. Por outro
lado, no livro ENSINO DA MEDICINA EM MINAS GERAIS E NO BRASIL (2013),
encontra-se ampla documentação levantada por mim sobre a incomparável obra
pedagógica e científica de Baeta Viana. A coleção de frases deste mestre começa
por esta: O aluno deve ser a cobaia de si mesmo. Outra também muito
lembrada: Dizem que o brasileiro tem complexo de inferioridade; ora, ele não tem
complexo nenhum: é inferior mesmo! Para se conhecer a coleção completa
cumpre aguardar a lista de Ênio Cardillo.
ÁLVARO VIEIRA
DE VASCONCELOS PEREIRA
ENCICLOPÉDICO
GINECOBSTETRA , NADADOR EMÉRITO E HISTORIADOR ORAL DO SUL DE MINAS E DA
MEDICINA

João Amílcar Salgado
O
Álvaro era quartanista quando entrei no curso médico em 1955 e me lembro de sua
figura exaltada, em meio à agitação da greve comandada, entre outros, por seu
carismático colega de turma Marcio Vasconcelos Pinheiro. Trabalhei ou convivi
com outros dos formandos de 57, que aqui aproveito para homenagear: Alberto
Paolucci, Aníbal Lamego, Carlos Maletta, Célio Menicucci, Celso Affonso, Evaldo
Furtado, Fernando Moreira, Francisco Laender, Geraldo Lustosa, Haroldo Lopes,
Hélio Osório, Hugo Brandão, Hugo Pereira Resende, Idalmo Duarte, José Carlos
Lanna, Manoel Firmato, Márcio Castro Silva, Múcio de Paula, Murilo Cotta, Noel
Moreira, Tereza Sebastião e Vítor Coronho.
Na
ginecobstetrícia fui aluno de Rubens Monteiro de Barros, Hermínio Pinto e
Iracema Baccarini. Já com Clovis Salgado trabalhei quando ele foi diretor da
Faculdade. Quando escrevi sobre esses
docentes necessitei do imenso
repositório de informações do Álvaro, todas orais. Quanto mais dados me
fornecia, mais me espantava de que não tenha escrito portentosa monografia
sobre a especialidade em Minas. De fato, o Álvaro esteve na intimidade de cada
avanço conquistado por Minas nesta área, especialmente a colposcopia, a
citologia vaginal e a contracepção. Sabe tudo sobre as competições entre
pessoas e serviços, inclusive alguns escândalos.
No final toda
conversa derivava sobre os Vieiras. Minha amizade ao Álvaro foi estreitada
exatamente pelo fato de que é meu quase conterrâneo, pois nasceu em Areado,
muito próxima a Nepomuceno. Isso quer dizer que ele é um “biscoiteiro”, apelido
que os nascidos em Areado (famosa por seus biscoitos) recebiam no colégio
marista em Varginha. Confirmando isso tudo, ele então me revelou ser parente,
pelo lado Vieira, de vários amigos em comum. São personagens surpreendentemente
Vieiras, mostrando que este clã semelha verdadeira rede de poder em Minas e
além de Minas. São Vieiras os médicos também areadenses Ênio Cardillo Vieira e
Caio Manso Vieira de Carvalho, além de Filadelfo Siqueira (Divisa Nova),
Guilherme Cabral Filho (de Muzambinho) e eu próprio.
Pela
espantosa consanguinidade sulmineira, os Vieiras se escondem em muitos
sobrenomes: Abreu, Adelindes, Amaral, Arantes, Araújo, Azevedo, Bottrel, Brito,
Carvalho, Castro, Costa Rodrigues, Couto, Dutra, Faria Belo, Faria Neves,
Fernandes de Paula, Ferreira, Freire,
Garcia, Junqueira, Magalhães, Meimberg, Mesquita, Moura Ribeiro, Pereira, Prado
Lima, Quintino, Salgado, Silva Mendes, Souza, Souza Diniz, Souza Silveira,
Teixeira, Vasconcelos, Vilela, Vinhas de Castro e Xavier Mesquita. Isso é
melhor visto pela figura anexa.

O
Álvaro é casado com a campeã de natação Alice Braga Pereira, minha grande amiga
e assídua parceira não só nos passeios da academia de medicina mas na
internete, onde faz transparecer sua grande cultura.
O Álvaro,
depois de longa conversa sobre nosso parentesco, me advertiu: orgulho-me não só
dos Vieiras, mas de ser primo do jurista
André Faria Pereira e da embaixatriz e escultora sulmineira Maria de Lourdes
Alves Martins Faria.
André
Faria, como procurador do Distrito Federal, usou de sua influencia junto a
Osvaldo Aranha, então ministro da justiça do governo provisório de 1930, para
dar início à criação da OAB. Já a campanhense Maria Martins é uma das mulheres
mais ilustres da cultura mineira. Teve alucinante vida internacional, chegando
a ser apontada como amante de Mussolini e de ter encantado Mao Tsé Tung.
CAIO MANSO VIEIRA DE CARVALHO
Excepcional oftalmologista nas medicinas
humana e veterinária
João Amílcar
Salgado
Caio
Manso Vieira Franco de Carvalho foi o primeiro veterinário a propor o exame de
fundo de olho do animal vivo como método diagnóstico corrente. Só essa façanha
já o coloca na história da medicina veterinária brasileira e mundial. No tempo
em que tais pesquisas repercutiram, Belo Horizonte era o maior centro
oftalmológico do Brasil, sob a liderança de Hilton Rocha, que, então, arrebanhou o Caio para sua equipe. E foi assim que três eminentes sul-mineiros –
Nassim Calixto da Silveira, Manso e Rocha – passaram a dominar o estudo do
fundo de olho no país, com notória projeção internacional.
Aluno
prodigioso em todos os cursos que frequentou, o alfeno-areadense Caio Manso
percebeu a necessidade de se graduar também em medicina humana e, ao ser
diplomado como tal, em 1972, na mesma Universidade Federal de Minas Gerais, em
que já era professor titular, cumpriu um desejo de juventude. Ao abraçar o lado
humano de sua primeira profissão de médico veterinário (desde 1947), alega
apenas ter-se filiado ao poeta latino Terêncio Varrão, que disse: HOMO
SUM – HUMANI NIHIL A ME ALIENUM PUTO (Sou homem – nada humano me é estranho). E, ao citá-lo em latim,
sempre enfatiza o PUTO, entre irado e cômico.
Esta
versatilidade horizontal inter-profissional já era prenunciada desde que foi
jovem perito da polícia técnica, ao mesmo tempo que líder estudantil (e até
pichador pró-democracia) no fim da ditadura Vargas. Ao lado de José Bento
Teixeira Sales, subiu pela União Colegial até as instâncias nacionais da União
Nacional dos Estudantes. Se não amasse tanto a docência e a ciência, teria
feito carreira política, prenunciada por sua facilidade para falar e convencer,
seja como ativista na juventude, seja como orador da turma, desde a escola
inicial à universidade, seja ainda como paraninfo em diversas formaturas.
Finalmente, transformou-se em
raro exemplo de distinto profissional e acatado docente nas duas medicinas,
condição na qual se fez polivalente orientador de pós-graduandos em ambas.
Não contente com isso, levou seu dinamismo para fora
dos muros acadêmicos, quer no consultório particular, quer em suas fazendas,
quer ainda em empresa de produtos veterinários.
Sendo uma de suas fazendas província de cristal de rocha, ele ofereceu,
para expormos no Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais, belo bloco de
quartzo. A peça aqui permanecerá em homenagem aos subsídios preciosos com que
presenteou nosso acervo. Um destes é a frase de Richter, que sugeriu para
divisa do Centro, de cujo colegiado é membro: AS RECORDAÇÕES SÃO O ÚNICO
PARAÍSO DO QUAL NÃO PODEMOS SER EXPULSOS.
Seu legado não se limita a ciência, cristais e
frases, pois lá esta ela, a majestosa
árvore que plantou em área da ex-fazenda da Gameleira (depois Escola de
Veterinária e Parque de Exposições, quando ali foi diretor do Parque e do
Serviço de Produção Animal). Deve continuar preservada, inclusive com a
necessária placa identificadora. Já nos áureos tempos do Hospital São Geraldo,
houve ali, em pequena sala, um debate nada oftalmológico: enquanto Emir Soares
defendia o gado pardo suíço (espionado por ele na Europa, junto com as lentes
de contato), Manso elogiava o holandês. Eu fingia ser o juiz, mas, entre tais
máquinas leiteiras, acabei optando pela nostalgia vermelha do caracu de minha
infância. Daí surgiu interessantíssimo projeto a ser assessorado por Caio
Manso, que nunca teve início, e que poderia ter culminado com a determinação do
genoma caracu, no rastro do selecionador paulista Alfredo Penteado.
E
o Caio é, ele próprio, um homem de raça. Traz consigo heranças temperamentais e
intelectuais de conhecidas linhagens do Sul de Minas: Manso, Franco, Monteiro,
Carvalho e Vieira – freqüentadas por médicos, educadores, fundadores de
cidades, usineiros de açúcar e até fundador de polícia. Enquanto os Francos,
Carvalhos e Monteiros já comparecem a mais de um livro, os Vieiras merecem
livro só deles, eis que as principais universidades do Sudeste recebem seu brilho. Fora de Minas Gerais, exemplifico com Ronan
José Vieira, o notável intensivista da Universidade Estadual de Campinas, e, em
nossa própria Universidade, ao primeiro relance, cito Ênio Cardillo Vieira,
Álvaro Vieira de Vasconcelos, Philadelpho Siqueira e Guilherme Cabral.
A história
sulmineira os inclui em vários belos cometimentos, que não se vergam ao
contrapeso de poucas peripécias controversas.
Quando jovem, seus familiares comentavam que saíra teimoso como o pai
(um dos herdeiros da sesmaria do Campo Redondo). Certo dia os dois
temperamentos idênticos se chocaram e o pai desabafou: este rapazote é
teimoso demais! Caio então
respondeu de pronto: DIZEM QUE SOU TEIMOSO / MAS COMO NÃO SER
TAMBÉM / SE O PINTO JÁ SAI DO OVO / COM A PINTA QUE O GALO TEM?
Sobre as duas
medicinas, recebi forte lição nos EUA. Ao chegar à escola médica da
Universidade Estadual de Michigan (com a qual Caio também intercambiou) deparei
com o nome FACULDADE DE MEDICINA HUMANA. Perguntei a meu amigo Robert Match por
que aquele qualificativo HUMANA. Ele explicou: a universidade se iniciara por
pioneira FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA e o respeito à história da
instituição obrigava ao uso daquele adjetivo para designar a faculdade menos
antiga. Por seu lado, Manso pode mostrar-se feroz como zeloso das coisas de
Minas. Recentemente provou de um queijo que criticou ao fabricante, dizendo-o
indigno da reputação de nossos laticínios. Foi então desafiado a fazê-lo
melhor. Como, entre os melhores técnicos
no âmbito lácteo, havia vários ex-alunos
seus, hoje o fabricante se orgulha de ter queijo, manteiga e doce-de-leite
simplesmente inigualáveis.
Em
nosso curso de História da Medicina, Caio ministrou inesquecível preleção sobre
sua saga em torno da fundoscopia canina, recheada de suas inestimáveis
contribuições à ciência, entre as quais quatro doenças cuja descrição foi o
primeiro a fazer entre nós: a febre catarral maligna em bovino (virose de que o
ovino é portador-são), a fascíola hepática (em colaboração com Bogliolo), a
dermatofilose, todas em bovino, e a brucelose suína. Ficou devendo duas outras aulas, que vem
adiando porque alega querê-las repletas de erudição. Uma é sobre a contribuição
da anatomia veterinária à medicina e à
arte, quando pretende inclusive deter-se em Leonardo da Vinci, que,
inicialmente proibido de dissecar o corpo humano, dominou a anatomia
símia. Outra conferência, prometida há
mais tempo ainda, trata da vida e da obra de esquerdista suíço de origem
espanhola, o jacobino João Paulo Marat, em especial de sua produção científica,
nomeadamente sobre óptica e a influência desta sobre Goethe, no âmbito da
teoria das cores. O oftalmologista Marat não discriminava entre cuidar de gente
e tratar de bicho.
Caio
Manso é um tremendo e intransigente detalhista, virtude que responde pelo
substancioso legado que deixa à ciência de Minas e do mundo, mas que o fez
privar-nos até agora destoutras demonstrações de seu saber e cultura.
O autor é professor titular de Clínica Médica
e pesquisador em História da Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais.
Ver os perfis semelhantes sobre Eurico Figueiredo, Carlos Diniz, Wilson
Beraldo, Veiga Sales, Armando Neves,
Filadelfo Siqueira, Guilherme Cabral e
vários dos demais citados
segunda-feira, 21 de setembro de 2015
FUNDAÇÃO
CLÓVIS SALGADO: MINEIRÃO E FUNDAÇÃO ME LEMBRAM MUTILAÇÃO
João Amílcar Salgado
Em
setembro de 2015 Belo Horizonte
comemora os 50 anos do Mineirão e os 45
anos da Fundação Clóvis Salgado
1960
foi o último ano de meu curso de medicina e também o último ano do governo JK. O
novo prédio da faculdade era para ser inaugurado pelo Juscelino no começo desse
ano, quando ele proferiria a aula magna de abertura dos cursos da hoje UFMG. O dinheiro para o prédio foi desviado para o
término de Brasília e assim JK só inaugurou o auditório, ficando o resto da
obra ainda em andaimes. Gilberto Lino Vieira era o presidente do diretório
acadêmico e eu era seu braço direito. Fomos procurados pelo prefeito Jorge Carone
para que os estudantes enxertassem na aula inaugural as assinaturas do governador
Bias Fortes e do presidente Kubitschek, autorizando a criação do Mineirão.
Concordamos e a coisa aconteceu.
Hoje
lamento essa irresponsabilidade. Nenhuma dessas pessoas citadas tinha o direito
de mutilar a cidade universitária, com tal decisão. O grande dirigente
esportivo Francisco de Castro Cortes já vinha lutando pelo futuro Mineirão e
sua proposta era localiza-lo onde hoje é o bairro Belvedere e o BH Shopping. Assim,
a área original do campus
universitário sofreu sua principal amputação, embora não a única. O trecho
contíguo da avenida Antonio Carlos e quase todas as atuais áreas limítrofes da
UFMG foram “invadidos” com argumentos injustificáveis, semelhantes aos usados
para abocanhar o enorme território do Mineirão.
Igualmente
infelizes e criminosas foram as sucessivas mutilações da área reservada ao
Parque Municipal. A principal delas foi um quarteirão inteiro ocupado pela
faculdade federal de Medicina e entidades da saúde, mas inclui um hipermercado
e o outro lado do rio Arrudas. O teatro municipal que substituísse o antigo
teatro e cine Metrópole foi improvisado como Teatro Francisco Nunes, mas o
definitivo, projeto de Niemeyer, ficou só nos alicerces e no porão. Foi nesse
porão que nosso Jarbas Juarez, recém-chegado de Nepomuceno, recebeu sua
primeira aula de Guignard. Desde 1940, a
cantora Lia Salgado, esposa de Clóvis Salgado, sonhava em exibir seu talento no
palco desse teatro, que seria depois denominado Palácio das Artes. Mais uma vez
o dinheiro consumido por Brasília não permitiu a dispendiosa edificação e o
trio Lia-JK-Israel Pinheiro arquivou o requinte de Niemeyer e exigiu do
engenheiro Hélio Ferreira Pinto a simplificação do projeto.
Em
acréscimo a esses fatos lamentáveis, há mais um neste aniversário. As
comemorações não fazem a devida
referencia a personagens de mérito desse
segmento da história mineira. Em ambos os casos, seria oportuno lembra-las,
desde, entre vários outros, o professor Camilo Fonseca, que plantou com altíssima
competência a grama do estádio, até os fascinantes maestros Sérgio Magnani e
Luiz Aguiar, sendo este meu ex-colega do curso de Filosofia.
NOTA.
No hotel São Paulo, da família Cortes, os nepomucenenses eram sempre carinhosamente
recebidos.
domingo, 6 de setembro de 2015
MINEIRÃO
E FUNDAÇÃO ME LEMBRAM MUTILAÇÃO
João Amílcar Salgado
Em
setembro de 2015 Belo Horizonte
comemora os 50 anos do Mineirão e os 45
anos da Fundação Clóvis Salgado
1960
foi o último ano de meu curso de medicina e também o último ano do governo JK. O
novo prédio da faculdade era para ser inaugurado pelo Juscelino no começo desse
ano, quando ele proferiria a aula magna de abertura dos cursos da hoje UFMG. O dinheiro para o prédio foi desviado para o
término de Brasília e assim JK só inaugurou o auditório, ficando o resto da
obra ainda em andaimes. Gilberto Lino Vieira era o presidente do diretório
acadêmico e eu era seu braço direito. Fomos procurados pelo prefeito Jorge Carone
para que os estudantes enxertassem na aula inaugural as assinaturas do governador
Bias Fortes e do presidente Kubitschek, autorizando a criação do Mineirão.
Concordamos e a coisa aconteceu.
Hoje
lamento essa irresponsabilidade. Nenhuma dessas pessoas citadas tinha o direito
de mutilar a cidade universitária, com tal decisão. O grande dirigente
esportivo Francisco de Castro Cortes já vinha lutando pelo futuro Mineirão e
sua proposta era localiza-lo onde hoje é o bairro Belvedere e o BH Shopping. Assim,
a área original do campus
universitário sofreu sua principal amputação, embora não a única. O trecho
contíguo da avenida Antonio Carlos e quase todas as atuais áreas limítrofes da
UFMG foram “invadidos” com argumentos injustificáveis, semelhantes aos usados
para abocanhar o enorme território do Mineirão.
Igualmente
infelizes e criminosas foram as sucessivas mutilações da área reservada ao
Parque Municipal. A principal delas foi um quarteirão inteiro ocupado pela
faculdade federal de Medicina e entidades da saúde, mas inclui um hipermercado
e o outro lado do rio Arrudas. O teatro municipal que substituísse o antigo
teatro e cine Metrópole foi improvisado como Teatro Francisco Nunes, mas o
definitivo, projeto de Niemeyer, ficou só nos alicerces e no porão. Foi nesse
porão que nosso Jarbas Juarez, recém-chegado de Nepomuceno, recebeu sua
primeira aula de Guignard. Desde 1940, a
cantora Lia Salgado, esposa de Clóvis Salgado, sonhava em exibir seu talento no
palco desse teatro, que seria depois denominado Palácio das Artes. Mais uma vez
o dinheiro consumido por Brasília não permitiu a dispendiosa edificação e o
trio Lia-JK-Israel Pinheiro arquivou o requinte de Niemeyer e exigiu do
engenheiro Hélio Ferreira Pinto a simplificação do projeto.
Em
acréscimo a esses fatos lamentáveis, há mais um neste aniversário. As
comemorações não fazem a devida
referencia a personagens de mérito desse
segmento da história mineira. Em ambos os casos, seria oportuno lembra-las,
desde, entre vários outros, o professor Camilo Fonseca, que plantou com altíssima
competência a grama do estádio, até os fascinantes maestros Sérgio Magnani e
Luiz Aguiar, sendo este meu ex-colega do curso de Filosofia.
NOTA.
No hotel São Paulo, da família Cortes, os nepomucenenses eram sempre carinhosamente
recebidos.
domingo, 30 de agosto de 2015
ANOS 60 SEGUNDO CID
VELOSO
Cid Veloso,
ex-reitor da UFMG e ex-diretor da Faculdade de Medicina e do Hospital das Clínicas
da UFMG lança o livro ANOS 60 - OS MOVIMENTOS QUE MUDARAM O MUNDO (2015).
O tema é muito oportuno e o
autor o vê de um ângulo abrangente, principalmente a partir de sua rica
vivência. Esse movimento, em Minas, levou à primeira e única eleição direta do
reitor, por voto direto e paritário de docentes, funcionários e estudantes. O
reitor eleito foi exatamente o autor do livro, Cid Veloso.
Isso tudo contrasta
gritantemente com o descalabro atual no ensino médico e nos hospitais
universitários.
Anexo, um texto que
escrevi nos 30 anos da invasão da Faculdade.
RARO CASO EM QUE
O BRASIL NÃO IMITOU O PRIMEIRO MUNDO
João Amílcar Salgado
Fato da
maior importância histórica é que, na agitação estudantil de 1968, que varreu o
mundo inteiro, se aponta a ocupação da Sorbonne pelos estudantes rebelados, em
3-5-68, como o episódio central na Europa. Pois bem, no mesmo dia 3-5-68,
ocorreu a ocupação da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas
Gerais pelos estudantes rebelados. Além de coincidentes, os dois episódios
apresentam uma diferença fundamental, que atesta muito maior heroísmo no lado
brasileiro. Enquanto na França o regime político era uma democracia, no Brasil
os estudantes estavam enfrentando a violência e a crueldade de feroz ditadura.
3 DE MAIO DE 1968 NA FRANÇA.
No pátio da Sorbonne realiza-se a reunião de estudantes
que exigem o acesso aos anfiteatros. O reitor, Jean Roche, quebrando uma regra
secular, chama a polícia para entrar nas instalações universitárias. A polícia
interrompe a reunião, expulsa os estudantes e fecha as instalações. Vários
alunos são ali detidos. Muitos outros são detidos nessa noite em manifestações
no Quartier Latin, onde é levantada a primeira barricada, no Boulevard
Saint-Michel.
3 DE MAIO DE 1968 EM BELO HORIZONTE.
A Faculdade de Medicina da UFMG é tomada pelos
estudantes. O diretor Oscar Versiani Caldeira, num ímpeto de pusilanimidade e
ódio, autoriza a polícia a cercar e invadir o prédio. Isso
ocorre em 3 de maio de 1968. É o mesmo dia em que, na França, a Sorbonne foi
ocupada pelos estudantes. O diretor transtornado, em contraste com a atitude
pró-estudantes dos diretores das demais Faculdades, autorizou a entrada das
forças de repressão para desalojar os alunos. Só não houve resultado sangrento
em virtude da intermediação de três heróicos docentes: Amílcar Vianna Martins,
José de Noronha Peres e Carlos Ribeiro Diniz. Assim, a revolução estudantil de
1968, que, de modo inédito, explodiu, quase simultaneamente, em vários países:
França (Sorbonne), EUA, México (Tlateloco), Alemanha e Brasil, teve em Belo
Horizonte esse episódio digno de um livro exclusivo. E os nomes desses três
desassombrados cientistas devem ser lembrados com todo o carinho, por não terem
medido conseqüências, no instante em que, sem vacilação, decidiram
posicionar-se ao lado da juventude conflagrada. E o ex-expedicionário Amílcar
Martins – ali, esguio, determinado e grave, em meio ao gás lacrimogêneo, aos
estilhaços de vidro e ao som de tosses, gritos e bombas – se via no segundo
campo de batalha, depois do primeiro, na Itália. Sim, era-lhe o mesmo teatro de
luta, apesar da distância de décadas, pois o inimigo, sem dúvida, era também o
mesmo: o redivivo cadáver do nazi-fascismo!
![]() |
AMÍLCAR VIANA MARTINS |
Em
1979, eu estava na cidade de Puebla, México e fui honrado pelos estudantes de
medicina mexicanos com o convite para ver um documentário sobre o MASSACRE DE
TLATELOCO, ocorrido nesta cidade em 2-10-68, pouco antes das Olimpíadas de 68,
em que a repressão armada matou centenas de pessoas e feriu outras mais. A
ditadura vigente no Brasil não permitiu que esse documentário fosse visto pelos
brasileiros. Este episódio deve sempre ser lembrado juntamente com os episódios
da Sorbonne e de nossa Faculdade de Medicina. Em Puebla, no debate com líderes
daquele movimento, relatei o episodio da Faculdade. O padre e poeta Ernesto
Cardenal, ao falar, ressaltou minha observação comparativa entre as democracias
da França e do México e a ditadura brasileira.
![]() |
BELO HORIZONTE |
![]() |
CARLOS RIBEIRO DINIZ |
![]() |
ELENA PONIATOWSKA |
![]() |
JOSÉ NORONHA PERES |
![]() |
AJAX PINTO FERREIRA |
![]() |
PARIS |
Ver o livro NOITE DE TLATELOLCO da escritora mexicana Elena Poniatowska e ANOS
60 – OS MOVIMENTOS QUE MUDARAM O MUNDO, de Cid Veloso, ex-reitor da UFMG e
ex-diretor da Faculdade de Medicina da UFMG. Ajax Pinto Ferreira, médico e
professor da UFMG, preso na invasão da Faculdade, ministrou emocionada aula no
curso de História da Medicina em 2008,
nos 40 anos do episódio.
sexta-feira, 28 de agosto de 2015
JOSÉ GOMES VIEIRA NÃO SERÁ ESQUECIDO
João Amílcar Salgado
José Gomes
Vieira foi consultor de medicina mediúnica do Centro de Memória da Medicina de
Minas Gerais. Depois do falecimento de Chico Xavier ele era o último dos
primeiros verdadeiros seguidores dele. Era da sala e da cozinha do grande líder
espirita, desde os tempos em que este ainda não era celebridade. O Zé Gomes era
altissimamente qualificado em duas áreas. Foi dos melhores técnicos em
refrigeração em Minas e dominava integralmente cada parágrafo de qualquer livro
de Xavier. Sua memória de tais textos parecia uma espécie de psicografia transversal
de toda a colossal obra. Em qualquer debate dos historiadores da medicina, era
hábito que se pedisse ao Gomes que lembrasse um trecho do Chico que se aplicava
ao tema em pauta. Era hora de santa, prazerosa e consubstanciada contribuição desse
verdadeiro sacerdote do espiritualismo. No território propriamente da medicina
mediúnica, ele se opunha àqueles que praticavam curas cruentas. Dizia que nisso
estava sendo ortodoxo na defesa do aforisma de seu mestre Chico, segundo o qual
o espírito, sendo espírito, não necessita verter sangue em cirurgias
espirituais.
Em sua
penúltima internação, estava muito mal e na certeza de que não ia sobreviver,
invocou os espíritos de Chico Xavier e de Bezerra de Menezes. Logo os reconheceu
sorridentes ao pé de seu leito e havia um de óculos não identificado, na
penumbra, atrás dos dois. Os visitantes disseram-lhe que ele não ia dessa vez,
pois ainda tinha uma missão por cumprir. Acrescentei que o de óculos era eu,
pois, pela hora em que o fato se deu, eu estava na casa de minha prima Zulmira,
pedindo-lhe um serviço espiritual pela recuperação do Zé. Este era muito sagaz
e ficou eufórico: esse episódio indica que conseguimos fazê-lo espírita!
Respondi: não, nada disso, eu estava ali por amizade, é que, por um grande amigo
como você, topo perfórmances em qualquer plano.
NOTA: O Centro de Memória contou com
consultores em história das medicinas não convencionais: mediúnica,
afromineira, indígena e orientais.
***
segunda-feira, 24 de agosto de 2015
PEÃO
DE BARRETOS – QUE NEPOMUCENO TEM COM ISSO?
João Amílcar Salgado
Nestes
dias de agosto de 2015, ocorre a festa do peão de boiadeiro da cidade de
Barretos, SP. Que Nepomuceno tem com
isso? Tem muito a ver, pois Barretos foi fundada por nepomucenenses. Mariana de Souza Monteiro (terceira desse
nome) nasceu na Fazenda da Lagoa em Nepomuceno, em 1829, casou-se com Francisco
Angelo Rodrigues Airão, nascido na cidade de Campanha, e o casal foi para o
sertão do Rio Pardo entre São Paulo, Minas e Mato Grosso. Seus descendentes,
conhecidos como a família ÂNGELO, são considerados edificadores de Barretos. Tios, irmãos e primos de Mariana foram para
ali também, de tal maneira que cidades não só Barretos, mas Mococa, Casa
Branca, Franca e Igarapava só surgiram quando as famílias Souza Monteiro Costa,
Garcia, Junqueira Diniz, Figueiredo e Lima saem da região de Nepomuceno, Três
Pontas, Coqueiral Boa Esperança, Carmo da Cachoeira, Lavras e Campanha para se
transformarem em colonizadores e civilizadores daquele sertão. Infelizmente
nesse deslocamento perpetraram mais um dos diversos genocídios indígenas de
nossa história. Por outro lado, é importante que o povo de Nepomuceno saiba
desses acontecimentos, principalmente os descendentes do capitão Vicente
Ferreira da Costa (tio de Mariana) que compõem a família Costa Ribeiro
Lima e também os das demais famílias
citadas.
Quando se fala em gado dessa região, outra família
originária daqui se tornou legendária. É a família Maia, que muitos pensam ser
exclusivamente de Boa Esperança, de Guapé ou de Passos, mas é originária da
Trumbuca e do Esmeril. O sobrenome
deixou de ser usado na Vila para evitar falar no parentesco com o bandoleiro
Urias Maia. Aqui a família conserva mais o sobrenome Barbosa de Oliveira, dos
Barbosa de Coqueiral, além de outros sobrenomes de gente da Trumbuca. Os que
são Maia, em Nepomuceno, na Trumbuca e em Coqueiral, hoje devem orgulhar-se,
entre outros, de dois Maias de grande fama: Nelson Freire Maia, um dos maiores
pianistas do mundo, e Tião Maia, que muitos garantem ter sido o verdadeiro Rei
do Gado e também inspirador da célebre moda de viola. Tião Maia estava para ser
morto pelos militares em 1964, por ser muito amigo de João Goulart, e, antes que
o encontrassem, levou toda sua fortuna para a Austrália. Lá ficou conhecido
nacionalmente. Espertalhões quiseram tomar-lhe o dinheiro em Las Vegas, EUA, e
ele, fingindo ser um caipirão australiano, enganou a todos – e essa sua façanha
teria inspirado o filme CROCODILO DUNDEE (1986). Vejam o filme aqui.
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CROCODILO |
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TIÃO MAIA |
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