João Amílcar Salgado

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

 

O BAR DO SÔVINICO

JOÃO AMÍLCAR SALGADO

Quando o célebre Bar do Michel foi fechado, a Vila foi brindada com o Bar do Sôvinico (Alvim Reis), com duas ótimas notícias: as filhas do dono eram lindas (três delas casadas com parentes meus) e suas mesas de sinuca eram de nível profissional. Para meu pai, a ausência do amigo Michel foi compensada por mais um udenista na roda da farmácia. Bem mais tarde, a Vila foi felicitada pelos bisnetos do dono: os talentosíssimos Danton e Selton Melo, consanguíneos de meus filhos.

Mais uma dádiva à cidade: o filho Paulo Reis, o Marolo, além de braço direito do Sôvinico, se transformou, graças ao usufruto do sinuca, no maior astro deste esporte no Sul de Minas. Por minha vez, fui colega de ginásio e amicíssimo do irmão mais jovem Haroldo. Mais que isso, fui namorado adolescente da neta Sônia, inseparável de minha irmã Neusa e de magnético encanto.

Nós, a molecada da cidade, queríamos copiar a elegância e as jogadas mágicas do Paulo. No Colégio Marista, os colegas sinuqueiros pediam que repetíssemos a legenda do Marolo. Quando surgiram os canais de sinuca no vídeo, foi como se eu revivesse todo aquele mundo. Passei a assistir da cama coisa muito melhor. Vejo tudo confortavelmente, em vez de no salão varginhense, onde fui fumante passivo por inúmeras horas e, pior, com medo de que chegasse o delegado Rogedo, para prender os menores de idade. Pelas tramas da vida, foi com emoção que topei o José Carlos, filho do Rogedo, hoje ilustre médico, entre meus alunos na faculdade.

Fiquei fã de vários sinuqueiros do vídeo, entre eles, os nossos Rui Chapéu e Baianinho, a quem acrescento o filipino Efren Reyes:

https://youtu.be/yg4JiMGYq0ohttps

https://youtu.be/xrsiHtmXBf0

https://youtu.be/Fo_aFRA43Es

NOTA: espero que a família, o Serginho ou o Nilo me consigam pelo menos  as fotos do Sôvinico , do Paulo e do bar.



terça-feira, 26 de outubro de 2021


 

CONSULTA DEMOCRÁTICA SOBRE O FUTURO DA IGREJA

João Amílcar Salgado

 

O papa Francisco quer, nos próximos dois anos, que os católicos — cerca de 1,3 bilhão que assim se declaram — sejam ouvidos sobre o futuro da Igreja. É a maior consulta democrática da história do cristianismo. Essa decisão deve estar enfurecendo os redutos nazifascistas do catolicismo. Diante desta notícia de agora, outubro de 2021, julgo oportuno relembrar algo acontecido no Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais, na década de 90 do século passado.

O Centro tinha estabelecido consultorias sobre a história da relação entre medicina e religião. Foram convidados consultores de todas as religiões. Inicialmente os consultores católicos seriam o padre jesuita e filósofo Henrique Vaz, o padre e médico Carlos Valadares, o filósofo, historiador e médico Luiz Gonzaga de Carvalho, o franciscano, musicista e folclorista Francisco Van Der Poel (Chico), o educador e pensador Raimundo Nonato Fernandes, o filósofo e pensador José de Anchieta Correa, o bibliófilo e historiador Nelson Figueiredo, o médico e  historiador Geraldo Barroso, o ex-padre e escritor Pedro Vidigal, o ensaísta e pensador Gilberto Vasconcelos, o cirurgião e polemista Ajax Pinto Ferreira, o líder comunitário e escritor Jose Carlindo Santos, o médico, ficcionista e historiador Ronaldo Simões Coelho, o pediatra e helenista Clarindo Cerqueira e o ex-seminarista, neurocientista, neurocirurgião e historiador Sebastião Gusmão. Além destes convocados, já havíamos reunido consultores em medicinas e religiões africana, celta, viking, védica, budista, chinesa, mediúnica, nahuatl, andina, indígena brasileira e outras.

Numa das primeiras reuniões surgiu a proposta da canonização de santos não católicos.  Inicialmente foram discutidos três nomes: os dois Luteros (o Martinho europeu e Luther King) e Gandhi. A cada reunião, até o ano 2000, surgiram outros, inclusive sacerdotes e até papas desdenhados: Copérnico, Giordano Bruno, Galileu, Serveto, Montesinos, Las Casas, Orta, Anchieta (canonização), carmelitas decapitadas (canonização), Antonio Vieira, bispo Viçoso, bispo Silvério, Cônego Vítor, Cônego José Pinto, Nhá Chica, Touro-Sentado, Indio Galdino, Betinho, Chico Mendes e os papas João 21, Leão 13, João 23 e João Paulo 1º. Mandela foi incluído em reunião especial, logo que faleceu.

domingo, 17 de outubro de 2021

 


MEDICINA E ÉTICA

Menino atento, ouvi meu pai elogiar o Michel Mansur, seu grande amigo de juventude. Disse que ele era descendente direto do califa Al Mansur, fundador da cidade de Bagdá. Acrescentou que, sem este notável líder abássida, a medicina não teria o desenvolvimento que teve. A partir desse episódio doméstico, passei a estudar os terapeutas populares, os primeiros médicos xamanísticos, as figuras lendárias como a divindade Endovélico, o arcanjo Miguel e o deus Asclépio e as figuras já históricas como, dentre outros, Imotepe, Susruta, Empédocles, Demócrito, Hipócrates, Aristóteles, Erasistrato, Jesus, Dioscóride, Galeno, Tiago de Nisibe, Al Mansur, Avicena, Copérnico, Orta, Vesálio, Montaigne, Giordano, Galileu, Harvey, Boerhaave, Morgagni, Swieten, Rousseau, Magendie, Littré, Rokitansky, Cl. Bernard, Virchow e Osler. Isso me permitiu ampliar a compreensão da ética médica.

Tudo isso não me possibilita alcançar a dimensão inacreditável do crime ocorrido, durante a presente pandemia, no assim chamado “plano-de-saúde” Prevent Senior (e que deve ter ocorrido provavelmente em outros “planos” semelhantes). Breve, tamanho escândalo será objeto de estudos que mostrarão quão satanicamente monstruosos foram os criminosos. Será inevitável a comparação com as atrocidades alemãs na Namíbia, os sinistros experimentos nazistas de Auschwitz, os crimes sanguinários de Makino na unidade 731 do exército japonês e os ensaios do apartheid sul-africano, tramados pelo horripilante “doutor morte” Wouter Basson. 

Tal hedionda perversidade contra pacientes idosos foi “justificada” pela Prevent Senior em gélido cinismo, com o apelo a uma falsa autonomia médica, a uma falsa metodologia científica e a um falso sigilo ético. Pior ainda é que nenhum dirigente está preso e toda a atividade homicida está sendo aplacada com o eufemismo exponencial de “ajustamento de conduta”. Para coroamento de tudo, o CFM e entidades congêneres esgueirar-se-ão com igual cinismo - e ficarão a salvo da esbugalhada cumplicidade. E sobre as cinzas de tamanha patranha, fulgurará seu espetacular efeito colateral: ficará bem claro para que serve a ANS.

 

 

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

 


VIAJANDO NAS JANELAS DO PASSADO

João Amílcar Salgado

Desde que comecei a redigir O RISO DOURADO DA VILA (2003), aproveitei as minhas pesquisas para estimular parentes e amigos a que também escrevessem suas memórias, além de angariar muita coisa guardada no fundo das gavetas. Pessoas que escreviam com facilidade deixaram de registrar preciosas lembranças. Só ao meu redor poderiam ter deixado relatos autobiográficos meu avô João de Abreu, meu pai João Salgado, a tia Bebete, o tio Aprígio, meus irmãos, o tio Lela e os primos Rubem Ribeiro, Ernane Vilela, Iracema Lima, Alice Lima, Chico Negrão, Nilo Barrios, Marieta Ursicina, Márcio Garcia, José Maria Ribeiro, Manuel Claide, Oscar Resende, Maria Elvira e João Otaviano.  Consegui que minha tia Rute escrevesse seu interessantíssimo livro MINHA HISTÓRIA – NOSSAS VIDAS (2007), gravei em áudio e em vídeo os causos de minha mãe Evangelina e sua irmã Licínea e colaboro com minha prima Clara Veiga Lima na biografia de seu pai João Otaviano Veiga Lima. Os imigrantes e seus descendentes merecem mais de um livro sobre eles. No livro NEPOMUCENO – SÍNTESE HISTÓRICA (2017) listei dezenas de homens e mulheres de letras, todos historiadores de fato, editados, inéditos ou potenciais. Listei também as coleções de nossos periódicos.  

               Por falar nisso, estou lendo VIAJANDO NAS JANELAS DO PASSADO (2013) de minha prima Vera Lúcia Ribeiro Vilela Gonçalves dos Santos, ilustre professora e eterna primeira-dama de Itumbiara, GO. Seu esposo, Celso Santos é um notável clínico e meu dileto amigo. Para mim, ela continua sendo a Verinha do Dr. Levi. Suas lembranças de seu avô João Vilela, de sua avó Vicentina e de seus tios e primos me emocionaram, pois achei que sabia tudo deles e era muito pouco. Além disso as fotos são preciosidades que ora passam à minha coleção. A Olívia sua mãe foi das mais belas moças da Vila e dona de uma meiguice infinita, qualidades repetidas em suas irmãs e em suas filhas. São mulheres cujo encanto os anos não levam. Ela me tratava não como primo, mas como irmão. Certo dia me liga e diz que sua mãe, a dona Vicentina (nome em homenagem ao Capitão Vicente da Lagoa) chegara a BH e estava com saudade de mim. Fui correndo pra lá. Foi um raro momento de viver boas gargalhadas. Ela estava lúcida e mais inteligente e espirituosa como nunca.  Já o Dr. Levi ocupa páginas marcantes e frequentemente elogiadas de meu livro. Ele e a esposa eram padrinhos de minha irmã Neusa. Evoco aqui o discurso que fez na formatura da afilhada, no qual declamou imortal poema de Gonzaga.  Os habitantes e admiradores da Vila devem guardar com carinho não só este livro, desbordante de ternura, mas os demais que a Verinha promete publicar.

quarta-feira, 29 de setembro de 2021

 


AUTONOMIA DO MÉDICO

João Amílcar Salgado

EM 1975 publiquei um artigo, na Revista da Associação Médica de Minas, sobre O CORPO MÉDICO DO HOSPITAL. Este texto foi o primeiro ou dos primeiros sobre o tema no país e foi amplamente divulgado, com a citação da autoria ou sem ela. A importância dele estava no clareamento das dúvidas sobre a autonomia administrativa do corpo clínico, capaz de se governar por si mesmo, mas o principal interesse era ligado, nesta época, ao crescente assalariamento do médico. Em 1976 fui um dos autores do regulamento do Hospital das Clínicas da UFMG, no qual ficou delineado o corpo clínico do hospital universitário, até então mero somatório dos corpos-docentes das antigas cátedras. Em 1986 compareci ao CREMESP para expor sobre a ética da pesquisa nos hospitais. No debate que se seguiu, respondi ao posicionamento de outro expositor, o professor Mário Rigatto. Ele discordou de minha afirmação de que os médicos, principalmente aqueles considerados pesquisadores científicos, mantêm com a indústria farmacêutica uma relação secular de promiscuidade. Acentuei que esta relação é quase sempre recheada de infrações éticas, principalmente a propina. Ele disse que minhas palavras foram muito fortes e que as infrações referidas por mim “não passavam de pecados veniais, além do mais já incorporados à tradição da classe”.

Antes, em 1982, eu, como estudioso dos sistemas públicos de saúde, principalmente britânico, escandinavo e canadense, fui convidado a participar de histórica reunião na OPAS, em Brasília. Nela foi feito o esboço de nosso futuro sistema público universal de saúde. Nas linhas gerais que traçamos, não constava nenhum sistema complementar ou suplementar de saúde. Este foi lamentavelmente introduzido na Constituição, após negociações com constituintes representantes de interesses privados. Mais recentemente, declarei, numa palestra, que o uso da expressão BBB, para representar as bancadas parlamentares do boi, da bíblia e da bala, carecia de ser complementada com mais duas letras, e e s, ou seja, as bancadas da educação e da saúde, ambas privadas, sendo que saúde inclui os interesses comerciais de serviços, equipamentos, medicamentos, venenos agrícolas e alimentos. Enquanto a educação prossegue semi-camuflada, a saúde sofreu um strip-tease acarretado pela pandemia. Entre as revelações mais escandalosas ora escancaradas está a alegação distorcida da autonomia do médico, para acobertar atrocidades e mortes, - e tudo isso com o vergonhoso respaldo do Conselho Federal de Medicina.

 

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

 

DESAFIO AO CFM

Senhor Mauro Luiz de Britto  Ribeiro (ou seu substituto)

Presidente do CFM

Acabo de receber um comunicado do CFM sobre O CFM ESTÁ NO WHATSAPP. Fiquei decepcionado pois esperava que a mensagem fosse uma resposta ao comunicado que enviei a VS, que ora lhe relembro:

“6 de junho de 2021. Acabo de receber um e-mail do CFM, intitulado, CFM PUBLICA MOÇÃO DE REPÚDIO EM DEFESA DO MÉDICO, AO RESPEITO E À CIVILIDADE NA CPI DA PANDEMIA. Diante dos termos ambivalentes desta moção, respondo tal e-mail com o seguinte teor: Sou médico, professor titular de clínica médica da Ufmg, ex-pesquisador do Fiocruz, historiador da medicina, criador do Centro de Memória da Medicina (Ufmg), autor de estudos sobre JK e sobre os conselhos corporativos, especialmente o CFM e os CRMS Sou principalmente contrário à partidarização da saúde. Diante disso, considero lamentáveis os posicionamentos do CFM e das corporações médicas nesta pandemia. Não me considero representado pelo CFM, pelo CRMMG, pela AMB e pela AMMG.”

Volto ao assunto agora, pois a sobredita mensagem de propaganda sobre whatssapp do CFM, de 22/9/2021, me chega no justo momento em que vejo pela tevê o dono de um plano de saúde confessar ao Senado Brasileiro O MAIOR ESCÂNDALO MÉDICO ATÉ AGORA EXIBIDO A PLENOS HOLOFOTES NO BRASIL. Durante seu depoimento, ele, em vez de relatar que foi punido ou está sendo processado pelo CFM, argumenta que cometeu seus crimes com base no próprio CFM. Diante disso, insisto em considerar lamentáveis os posicionamentos do CFM e das corporações médicas nesta pandemia. não me considero representado pelo CFM, pelo CRMMG, pela AMB e pela AMMG.

João Amílcar Salgado - CRMMG 4979

terça-feira, 21 de setembro de 2021

 CENTENÁRIO DE UM GIGANTE


João Amílcar Salgado

Hoje, 19/9/2021, completaria 100 anos de idade o recifense Paulo Freire, fulgurante figura da pedagogia de todos os tempos. Sou testemunha in loco de que Paulo, o baiano Anísio Teixeira e o mineiro Darcy Ribeiro são educadores brasileiros reconhecidos internacionalmente. Freire tem 29 títulos de Doutor Honoris Causa concedidos por universidades tanto europeias como da América do Norte e também o prêmio EDUCAÇÃO PELA PAZ da Unesco (Nações Unidas). A London School of Economics o classifica como o terceiro pensador mais citado do mundo.

Ao ser apresentado por Fernando Figueira, ilustre professor pernambucano, para abrir um congresso educacional em Recife, fui cognominado por ele de PAULO FREIRE DA EDUCAÇÃO MÉDICA BRASILEIRA. De fato, sua proposta de alfabetização derivada da realidade social e minha concepção de treinamento clínico derivado da realidade de saúde são afins, como se pode ler em meu livro ENSINO DA MEDICINA NO BRASIL E EM MINAS GERAIS (2013).

Este homem extraordinário recebe, em seu centenário, homenagens quase unânimes, ao lado de ataques hediondamente injustos, originários de mentes doentias. Seus detratores podem ser divididos em dois grupos: os irrecuperáveis de má-fé e aqueles que são enganados por conceitos e informações absurdos, perfidamente forjados e propalados pela internete. Aos recuperáveis de boa-fé, seria útil aproveitar esta comemoração para conhecer honestamente as ideias cristalinas e o valor inextinguível desse genial educador.