João Amílcar Salgado

quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

 


COLÉGIO DOS SONHOS

João Amílcar Salgado

            Aproveitando o Enem e as competições de redação, de matemática e outras ora noticiados, lembro que, em meu curso de pedagogia na Ufmg, o professor de administração escolar, o excelente Ennes Moreira, propôs um trabalho desafiador: se você fosse criar um colégio, qual seria seu projeto? Propus um colégio em que não houvesse mais que treze alunos por professor, em que não houvesse aula teórica e no qual o aluno cumpriria atividade pela manhã e pela tarde. Cada docente teria dedicação exclusiva e receberia 150% do salário pago pelo melhor colégio já existente. Haveria completo equipamento esportivo, inclusive piscina e ciclismo; completas instalações para aprendizagem culinária e completo ambulatório médico-odontológico. Todas as decisões seriam feitas em assembleia paritária de docentes, estudantes e funcionários, a qual elegeria o diretor e equipe, sem reeleição. O professor observou que a proposta o surpreendeu pela audácia, mas disse que eu teria de cobrar uma mensalidade altíssima e inviável. Respondi que não estava pensando em colégio lucrativo, mas público. Isso exigiria um pressuposto, no âmbito nacional, de sistemas de educação, saúde e transporte gratuitos para todos – não sendo impedida a opção das mesmas disposições no âmbito privado. Isso era uma aplicação ao ensino médio do que propúnhamos para o ensino superior, especificamente para o da medicina. Frequentava esse curso um colega que não conseguia disfarçar sua função de serviçal de informação da ditadura vigente, então início da década de 70 do século 20. Perguntou se poderia levar consigo uma cópia da proposta.  Respondi que a fornecia com o maior prazer e estava pronto para discuti-la em qualquer lugar com quaisquer interessados.

            Ainda sobre o Enem, esta é a oportunidade de homenagear meu querido colega de turma na medicina, Sebastião Lopes Pereira, a seguir.

            Anexo: fotos referentes a 3 dos primeiros educandários mineiros

terça-feira, 14 de janeiro de 2025

 

CANA VERDE NA TEVÊ E NAS TELONAS

João Amílcar Salgado

Um trio caipira de Cana Verde é campeão do mineirês na internete, com muito humor. Chegou a ser tema do programa Fantástico da tevê e alcança até o cinema, junto a Maurício de Souza, em CHICO BENTO E A GOIABEIRA MARAVIOSA. Os três são o Gustavo Almeida Freire, apelidado de "Gustavo Tubarão", 25 anos, Sebastiao Fernandes Filho, com o apelido de "Tião Bruto Sistemático", 71 anos, e Isaac Duarte Ferreira, mais conhecido como "Isaac Amendoim", 11 anos. O povo de Cana Verde é o mesmo povo da Vila da outra banda da fazenda Congonhal, assim como metade de Campo Belo. O linguajar dessa gente já foi expresso por mim em meu livro O RISO DOURADO DA VILA (2004, 2020), também com humor. Nessa perspectiva é mais uma das inúmeras evidências de que somos habitantes do “umbigo do mundo”.

 

domingo, 12 de janeiro de 2025

 


PADRE-MÉDICO CARLOS VALADARES DE VASCONCELOS

João Amílcar Salgado

Hoje faço uma homenagem a um de meus grandes amigos, meu ex-aluno padre e médico Carlos Valadares. Anualmente ele celebrava a missa dos cadáveres, tradicional na UFMG. Após o ofício ele vinha beber o delicioso capucino da Leila no Centro de Memória. Disse-lhe que mais um ofício lhe cabia: uma aula de história da medicina sobre ser padre e ser médico. Pediu tempo para prepará-la. Ele saiu-se muito bem, comovendo a todos. Iniciou confessando que escondeu dos colegas, por bastante tempo, sua condição de padre, mesmo assim sofreu búlingue. Contou toda sua interessantíssima vida, especialmente sua atuação no pronto-socorro, junto às famílias dos atendidos. E encerrou com a passagem evangélica em que Jesus é questionado e hostilizado em sua cidade de Nazaré.

            O episódio aparece em Marcos, Mateus e Lucas. Este último, talvez por ser médico, inclui o aforismo “médico, cura-te a ti mesmo” que teria sido proferido pelos questionadores, enquanto Jesus retruca com outro aforismo de que “ninguém consegue ser profeta em sua própria terra”, exemplificando com os casos de dois profetas. Os mais hostis vinham alegando que não fez ali as curas que fez em Carfanaum e o expulsam da cidade. E mais: o arrastam até o alto do monte e quase o arremessam dali. Jesus se esgueira e escapa.

            O padre-médico Carlos comenta que o médico e o sacerdote têm de estar preparados para a ingratidão e todas as demais incompreensões. E acrescentou: concordo com o João Amílcar em que este evangelho é notável por definir o lado social da medicina, quando Jesus começa por citar o profeta Isaías, mostrando que a saúde é muito mais ampla do que a cura individual. Além de Jesus, Isaías fez de Francisco de Assis, Bento de Núrcia e o querido padre Carlos seus diletos discípulos neste conceito.

 

sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

 


JIMMY CARTER E HEINZ KISSINGER

João Amílcar Salgado

Desembarquei em João Pessoa para falar aos estudantes e, no aeroporto, o Jaime Scherby disse que ”por pouco, não me apresentaria a Rosalynn Carter, mas mesmo assim você  alcançou o suco de pitanga que preparamos pra ela; ela e você não são os mais fanáticos por este suco?”. Nessa época, agentes dos EUA me vigiaram em minha viagem a Puebla, no México. Havia uma inquietação direitista com a desenvoltura à esquerda de Jimmy Carter. Forjaram até a “Operación Marielitos” com migrantes cubanos, para sabotar o namoro pacifista Carter-Castro. Carter, contudo, repreendeu Geisel pela truculência ditatorial e em seguida deu asilo a Brizola, Este foi expulso do Uruguai, provavelmente por trama de Kissinger.

O alemão Heinz Kissinger parece que no fundo menosprezava a mentalidade ianque, atrevendo-se a  reorientar seu conservadorismo de faroeste. Antes de perceber-lhe o sinistro perfil, me interessei pelo sobrenome, por significar beijoqueiro (kisser ou kissinger), referido ao inseto barbeiro (kissing bug), objeto de minhas pesquisas. Coincide que Kissinger dizia usar o sexo como inspiração diplomática, inclusive em Paris na ocasião da paz no Vietnã. Outra novidade é o uso do segredo em diplomacia, em paralelo à espionagem, pelo qual pode ter tido envolvimento em Watergate.  Usou também o futebol como instrumento diplomático. Teve vertiginosa atuação junto a Mao Tse Tung, Zhou Enlai (personagem de Malraux), Le Duc To, entre israelitas e palestinos e na guerra-fria. Como premiado Nobel (1973), tem sido poupado da verdade histórica, mas hoje o vemos como inominável criminoso de guerra, pelas ditaduras no Chile, no Camboja e no Uruguai (1973), pela invasão indonésia do Timor (1975) e outros horripilantes ardis. Foi desde então que o uruguaio Mujica, extraordinária figura humana, foi torturado por 12 anos. Diante do crescente gigantismo chinês, muitos passarão a acusá-lo de seu causador, desde quando em 1971 visitou secretamente a China. Pousou o Air Force One no Paquistão e dali foi a Pequim.  Fez dezenas de outras visitas, participando de banquetes com mais de uma geração de líderes do país. No início, despistou os anticomunistas dos EUA e os antiamericanos russos e chineses, sem que nada vazasse.

Em uma roda com chamados “cientistas políticos”, em 2012, me perguntaram se eu sabia como foi a primeira conversa entre Kissinger e Mao, já que a versão do primeiro no livro ON CHINA (2011) pode não ser crível. Respondi que não sabia, mas tinha para mim o provável pensamento de Mao. O desabusado guerrilheiro considerou que os chineses inventaram o jogo de xadrez e competia aos inventores formular uma jogada vencedora, não diplomática mas econômica, tremendamente eficaz, um xeque-mate – implodindo o capitalismo por dentro. E isso aconteceu.

 

 

quinta-feira, 9 de janeiro de 2025

 


WALTER SALLES JR & FERNANDA TORRES

João Amílcar Salgado

            Um drama vivido pelas celebridades é que sua notoriedade impacta negativamente nos filhos. Mesmo sem o estímulo específico, estes se sentem na automática obrigação de herdeiros também do talento paterno ou materno. Pior se homônimos.  Assim muitos indagam pela celebridade de algum filho de Darwin, de Freud, de Chaplin ou de Einstein. No caso do filme AINDA ESTOU AQUI, além da presença de sulmineiros, temos duas pessoas que são CELEBRIDADES FILHAS DE CELEBRIDADES. São a Fernanda e o Walter. A Fernanda é tão celebridade como sua mãe, na mesma área, e com o requinte de ser homônima e de disputar o mesmo prêmio, distante 2 décadas, e com o mesmo diretor.

            Walter Jr é celebridade mundial em direção cinematográfica e é economista e comunicador, filho do homônimo pai Walter, celebridade em finanças e no pioneirismo da exploração do nióbio mineiro. Walter pai foi advogado, banqueiro, diplomata e ministro, afinal comandante de uma das maiores fortunas do mundo, sendo que Walter filho é o terceiro cineasta mais rico, atrás apenas de George Lucas e Steven Spielberg.

            Na história da ciência, o caso mais conhecido de celebridade filha de celebridade é o de Irene Curie filha de Maria Curie: a 2ª descobriu o radium, com Nobel de química e Nobel de física, e a 1ª descobriu a radiatividade artificial, com Nobel de química. Ambas estiveram em Minas, em 1926.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2025


 

WALTER SALLES JR E SELTON MELLO – O BRILHO DO SUL DE MINAS

João Amílcar Salgado

            O filme brasileiro AINDA ESTOU AQUI alcança aplauso internacional, quando a atriz Fernanda Torres é premiada em Hollywood. Coincide que o diretor do filme, Walter Salles Jr., e o ator principal, Selton Mello, são nascidos de famílias sulmineiras. Nepomuceno deve orgulhar-se de que tais famílias guardem parentesco com gente tradicional de nossa  comunidade.

segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

 


ANTENOR CORREA LIMA – MEU MAGNÂNIMO PRIMO

João Amílcar Salgado

Nos anos dourados, em 1946, Israel Pinheiro (filho do governador e admirável educador João Pinheiro), futuro gestor da construção de Brasília, era secretário da Agricultura, Indústria, Comércio e Trabalho de Minas e tinha no arquivista Antenor Correa Lima seu braço direito. Dois estudantes interioranos, um vindo de Conceição do Mato Dentro e outro de Pedra Azul, respectivamente José Aparecido de Oliveira e Nuno Figueiredo Pinto, foram admitidos como estagiários na secretaria. O severo Israel determinou ao Antenor que vigiasse de perto a ambos, pois poderiam malandrar, com a desculpa de atividade escolar. Diante da rigidez do chefe, os dois confessaram ao subchefe que, para seguir seus estudos. teriam que pedir demissão. O Antenor os tranquilizou afirmando que o estudo estava acima de tudo. Mais tarde manifestaram várias vezes sua gratidão ao amigo. O jornalista José Aparecido brilhou ao lado de Magalhães Pinto e depois por sua vez foi braço direito de Tancredo Neves, tendo antes corrido alto risco por causa da perseguição da ditadura. Nuno correu o mesmo risco, mas acabou sendo a maior autoridade odontológica em lábio leporino no país. Quando recebi de Tancredo Neves a Medalha da Inconfidência, revelei ao Aparecido ser primo de seu generoso protetor e dele recebi emocionado abraço. Quando, no curso de História da Medicina da UFMG, apresentei o Nuno para que fizesse a aplaudida conferência sobre sua especialidade, lembrei que representava ali meu primo Antenor Correa Lima, seu magnânimo tutor.

Antenor é sobrinho de minha bisavó Dindinha – Mariana Regina Correa Lima. É também sobrinho e genro de Manoel Correa Lima, célebre por ter liderado a Proclamação da República em São Paulo, antes de Deodoro. Este feito foi muito bem documentado em SÃO JOSÉ DO RIO PARDO E SUA REVOLTA REPUBLICANA (2014) pela bisneta de Manoel, a excelente historiadora Liliane Correa Lima Pinto, mestre pela USP, doutora pelo CPDOC-FGV e docente da universidade federal do Maranhão.