João Amílcar Salgado

sábado, 25 de junho de 2022

 


BAETA VIANA, O ZEBU, A SOJA E A FOME

João Amílcar Salgado

No auge do zebu o cientista Baeta Viana foi padrinho de casamento de um ex-aluno em Uberaba. Os pais do noivo lhe exibiram orgulhosos sua boiada campeã. Na conversa, elogiou tudo aquilo, mas observou que criar zebu era um erro bioquímico. Disse à perplexa fazendeirada que usar capim para obter carne pode ser substituído por um vegetal diretamente equivalente à carne. Perguntaram: e isso existe? Ele respondeu: a soja, então ainda quase desconhecida no país. Décadas depois os pastos foram ali substituídos por gigantescas lavouras de soja. Décadas depois os bois confinados eram engordados com soja. Hoje, muitas décadas a mais, a espezinhada, humilhada e abandonada maioria da população brasileira se encontra em fome endêmica, já também epidêmica, e faz fila pra comer osso de zebu.  Enquanto isso, a soja do Brasil, maior produtor mundial, é exportada para ração animal do mundo inteiro.

quarta-feira, 22 de junho de 2022

 


FRANCIA MÁRQUEZ E A PEQUENA

João Amílcar Salgado

Tenho forte ligação afetiva com os quilombolas da Vila, principalmente os dos quilombos da Bacia, da Bárbara e do Retiro. Ainda muito criança, presenciei os preparativos do casamento da Tiana com o Lázaro do Justino e fiz birra para ver o pagode, no terreiro de chão batido, que finalizou o casório. No comecinho da dança, adormeci no colo da Pequena, que me levou dali. Raro casamento de rico teve os finíssimos comes e bebes que a tia Iracema preparou para essa festa. Ao ver a foto anexa de Francia Márquez, comemorando sua eleição para vice-presidente da Colômbia, tive um arrepio e, por dois segundos, supus estar vendo a Pequena, minha querida babá.

 

 

segunda-feira, 6 de junho de 2022

 


A INDÚSTRIA DAS ARMAS É IRMÃ DAS INDÚSTRIAS DOS CIGARROS E DOS REMÉDIOS

João Amílcar Salgado

Na Universidade Estadual da Pensilvânia, em 1986, fui convidado a apresentar nossa inovação em educação médica, quando falei do “marketing” embutido no ensino, marco de minha tese doutoral. Pedagogos locais comentaram que nunca tinham pensado nisso e manifestaram muito interesse em estudar o tema. Convidaram-me até para passar um “sabbatical” ali. Um deles, entretanto, ficou abalado com a ideia e perguntou se o raciocínio se aplicaria a áreas fora da educação. Citei o cinema, que desde seu início fez “marketing” de armas e de cigarros. O faroeste resultou disso. Coincidentemente, no dia de minha chegada, a tevê noticiava que o galã caubói Yul Brynner morreu do tabaco. O cartel de cigarros passou a pagar “autoridades” cientificas para “melar” a evidência. Finalmente a filha de Yul apareceu fumando e contestando aquela causa. Quase em seguida um repórter descobriu o quanto ela recebeu. Os cineastas, afinal, concordaram em abolir atores fumando. Abolir tiroteios na tela continua mais difícil porque a Associação Nacional de Rifles da América (NRA), sempre ligada a supremacistas, vem exibindo uma força espantosa, acima de qualquer poder da República, desde quando fundada em 1871. Mesmo assim os pacifistas esboçaram substituir o “bang-bang” por Kung Fu e Bruce Lee. E a venda de armas em cada esquina prossegue ali, com banhos de sangue quase semanais.

Hoje no Brasil algo parecido ocorre no combate às “fake news”, pois os publicitários mais inteligentes já perceberam que a coisa vai resvalar da questão eleitoral para a publicidade farmacêutica. Esta é célebre, nos EUA, com a Coca-Cola e, no Brasil, com o Rhum-Creosotado. A Abifarma e a Abrafarma não detêm o poder da NRA, mas podem melar esse combate, pelo menos até que alguém garanta que NÃO É “FAKE” A PROPAGANDA DAQUELE REMÉDIO QUE O PRÓPRIO FABRICANTE RECONHECE COMO INEFICAZ.

terça-feira, 31 de maio de 2022

 



TEXTOS PROFÉTICOS SOBRE AS MAZELAS NA SAÚDE E NA EDUCAÇÃO

João Amílcar Salgado

Há 40 anos, três publicações estudaram as indústrias da   saúde e da educação no Brasil. Hésio Cordeiro, com A INDÚSTRIA DA SAÚDE NO BRASIL (1980), Maria Inez Salgado de Souza, com  OS EMPRESÁRIOS E A EDUCAÇÃO (1981) e eu próprio, com CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DA RELAÇÃO ENTRE REALIDADE DE SAÚDE E ENSINO MÉDICO (1981), sendo que nesta fui um pioneiro internacional, a estudar o uso do marketing nos currículos escolares. Hésio Cordeiro, Cecília Donnangelo, Sérgio Arouca e eu fomos convidados a esboçar o SUS, em 1982. Arouca e Ulisses Guimarães, na Constituinte, em 1988, cometeram o erro de arriscada aliança com a indústria, abrindo o espaço para a ANS.  A consequência inevitável desse erro é o desastre atual. Isso transforma aquelas três publicações em verdadeiros textos proféticos.

Vejamos:

1)A revista Forbes incluiu o industrial da saúde Jorge Moll Filho na lista dos maiores bilionários do mundo, 3º entre brasileiros.  2) Os chamados planos de saúde acabam de exigir a elevação das prestações para cinco vezes além da inflação, com reajuste de 15,5% - isso faz da ANS o verdadeiro Ministério da Saúde de nosso país. 3) O atendimento pediátrico está em colapso, assim como o fornecimento de remédios fundamentais e demais recursos médico-sanitários. 4) Os venenos agrícolas, antes chamados de “agrotóxicos”, foram favorecidos pela oficialização de chamá-los de “defensivos”, acrescida da liberação geral de seu uso, sem qualquer fiscalização de seus resíduos. 5) Numerosos egressos de faculdades precárias, que são a maioria aqui e nos países vizinhos, só aceitam emprego se este for adequado a seu despreparo – inépcia que, mesmo assim, vem causando dano e morte.  6) Várias aquisições de faculdades são suspeitas, a exemplo do caso antes aqui relatado, de um grupo de comércio educacional, ligado ao ministro Paulo Guedes e à Bozano, que comprou a faculdade mineira Ipemed de Ciências Médicas, sendo que a negociação resultou da parceria entre a Crescera e a Afya, e da fusão entre a NRE e a Medcel. 7) A mal-conhecida e criminosa “Universidade Brasil” chegou a patrocinar o Atlético Mineiro. 8) A faculdade de medicina de Marília está envolvida em escândalos frequentes. 9) A universidade de Rio Verde expulsou 19 estudantes por fraude. 10) Guedes bloqueia 14,5% da verba para custeio e investimento de universidades federais, uma delas a UFMG, que o graduou e à qual é perfidamente ingrato. 11) Enquanto isso, bilhões são mantidos ocultos num inacreditável orçamento secreto. 12)  E, nos desvãos ministeriais da Saúde e da Educação, há corrupção na compra de desde vacinas a ambulâncias e também na intermediação de evangélicos para verbas furtivas, a troco de moeda variada, inclusive ouro em barra, extraído em garimpo criminoso, nas reservas indígenas. Estas e muitas outras denúncias da imprensa aguardam rastreamento em paraísos fiscais.

[Em mensagem a seguir, mostramos o nexo diabólico entre o combate a “fake news” e a antiga “moralização” da propaganda farmacêutica].

 


quarta-feira, 25 de maio de 2022

 


 

IDENTIFICAR INTÉRPRETES E AUTORES MUSICAIS

João Amílcar Salgado

                Em postagem anterior, reproduzi a canção O GALO CANTOU NA SERRA do seresteiro Luiz Cláudio.  O distinto médico e musicista Luiz Savassi, em resposta, me presenteou com a encantadora valsa FOLHAS SOLTAS do mesmo autor, digna de ampla divulgação, principalmente entre a gente mineira. Vale a pena lembrar que há dois Luiz Cláudio, este “de Castro” mineiro e o outro “Ramos” carioca, também seresteiro e, por sua vez, irmão de outro seresteiro Carlos José. Assim é inevitável confundir os homônimos.

            Não só entre nomes de intérpretes há troca. Pode ocorrer também entre autor e intérprete.  Quando ficou conhecida a canção VOCE NÃO ME ENSINOU A TE ESQUECER (trilha do filme LISBELA E O PRISIONEIRO) muitos deduziram que a música era do baiano Caetano Veloso. Na verdade, seu autor é o Fernando Mendes, mineiro de Conselheiro Pena. Quando a ouvi pela primeira vez, julguei ser um plágio do bolero TU ME ACOSTUMBRASTE do cubano Frank Dominguez, aliás cantado também por Caetano. Mas, comparando melhor, não é plágio. A nossa pode até ser inspirada na outra, mas é joia musical legítima, digna do aplauso unânime de que desfruta.

https://youtu.be/iML_MKnTf84

https://youtu.be/rBEdhBTtG28

https://youtu.be/jcg9H3SmwVo

 

terça-feira, 24 de maio de 2022

 


MONSENHOR TAVARES, CHAGAS, CANABRAVA E ROSA

João Amílcar Salgado

        Sou estudioso da doença de Chagas e de João Guimarães Rosa - com isso me fiz andarilho pelo Grande Sertão. Finalizo um livro sobre a paciente Berenice, na qual foi descoberta a doença. Ela nasceu em uma fazenda próxima a Lassance, em 1907, e Rosa nasceu não muito distante, em Cordisburgo, um ano mais tarde, sendo que em 1909 Carlos Chagas descobriu a infecção inédita. Em uma de mínhas viagens a este sertão, procurava inutilmente o batistério da menina Berenice. Recorri a meu colega de turma, Geraldo Evaristo Canabrava Pereira, na época o principal e aplaudido médico de Curvelo, que me levou ao Monsenhor João Tavares de Souza, capelão do hospital, do qual antes tinha sido provedor, quando o equipou com o primeiro raio-x da região e com refinado instrumental cirúrgico. Fiquei imensamente grato ao prelado por ter-me conseguido o precioso documento. Além disso, me vi ainda mais feliz, quando Tavares me revelou ter nascido em Cordisburgo, em 1907, e, ao lado do futuro escritor João Guimarães Rosa, ter sido alfabetizado pelo mesmo mestre-escola, Candinho. Por outro lado, o querido amigo Canabrava é neto do VôVaristo, o capitão Evaristo de Paula, um fazendeiro muito observador, que levantara a possibilidade de doença desconhecida, por causa da voracidade dos barbeiros que infestavam sua fazenda.

            Não tive coragem de entrevistar o Monsenhor a respeito do incêndio da matriz de Curvelo. Na época ele era o jovem pároco, bastante atraente e também admirado pela voz barítona, ao Gregoriano, pela oratória e pela cultura piedosa e humanística. Uma bela paroquiana se apaixonou perdidamente por ele. Certo anoitecer ele chega à sacristia e encontra a moça completamente nua e de braços abertos para ele. O casto religioso a expulsa dali aos gritos. Dias após, ela torna a se infiltrar no templo, com uma garrafa de querosene, e causa grave incêndio, enquanto alguém consegue salvar as imagens de maior devoção. Hoje ainda investigo por que o conterrâneo João Rosa, então quintanista de medicina, e o paroquiano Lúcio Cardoso, notável escritor, então com 17 anos – não fizeram uso do episódio em sua obra.  Ou fizeram?

            Aproveito para assinalar que o compositor Luiz Cláudio musicou o poema O GALO CANTOU NA SERRA, de Guimarães Rosa, referente a Curvelo – canção gravada por Nara Leão. Lembro também que o paranoico bispo Sigaud chegou a esbulhar o prestígio popular e político de Tavares.

https://youtu.be/Z_gqkX2-CAA

           

quarta-feira, 18 de maio de 2022

 COINCIDÊNCIA QUE É UMA ADVERTÊNCIA

João Amílcar Salgado

O Congresso dos EUA realiza hoje 17/5/22 audiência pública sobre OVNIs. Dois dias antes um jovem assassinou dez pessoas num ataque de ódio contra negros, em Buffalo, Ele tinha avisado por escrito, em sua escola, que cometeria um massacre. A polícia soube da ameaça e mesmo assim ele comprou a arma com que a efetivou.  O discurso de ódio e a propaganda da supremacia branca prosseguiram depois da derrota de Trump, seu principal incentivador. Assim, a coincidência, entre o tema dos ETs e a morte dos negros, mostra que o congresso ianque não está interessado quer na questão do armamento irrestrito, quer na do racismo. Isso deve causar exultante alegria na extrema direita.