AINDA
O CENTENÁRIO DE CARLOS LACERDA
João Amílcar Salgado
No livro O RISO DOURADO DA VILA (2003) relato minha
primeira aula de dermatologia. O professor Osvaldo Costa, o maior
dermatologista das Américas, entra e encontra, logo na frente, dois alunos
lendo jornais: o Paulo Dias lia a ÚLTIMA HORA (do getulista Samuel Wainer) e eu
lia a TRIBUNA DA IMPRENSA (do antigetulista Carlos Lacerda). Ele arrebatou ambos
os jornais, abriu sua maleta, retirou o ESTADO DE MINAS e o exibiu, para nos
ensinar: por esses dois jornais aí o mundo vai acabar depois de amanhã, vocês
devem ler este aqui - por este o mundo está indo às mil maravilhas. E
acrescentou: a medicina exige estudo diário, em tempo integral, e este jornal aqui
nos dá tranquilidade para isso – é esse meu truque para ser o que sou.
O Lacerda escrevia uma coluna no CORREIO DA MANHÃ chamada
“Tribuna da Imprensa”, daí derivou seu jornal, no qual também brilharia o Hélio
Fernandes, irmão do Millor Fernandes, dois irmãos geniais. Com a morte de
Lacerda, Hélio ficou com a TRIBUNA. Além de ler seu jornal, os estudantes
acompanhavam os discursos de Lacerda pelo rádio precário da época. Que
espetáculo seria hoje, pela tevê, ao vivo! [Ver www.youtube.com/watch?v=gc4Z4hj_g1M
e www.youtube.com/watch?v=kB7UpY-aP7Q]
Os
estudantes de direito, medicina, engenharia e outros eram fãs dos grandes
oradores ou locutores e os comparavam: Lacerda versus Afonso Arinos, Pimenta da
Veiga (pai) versus Pedro Aleixo, Evandro Lins versus Aliomar Baleeiro, Paulo
Pinheiro Chagas versus Adauto Lúcio Cardoso, Tancredo Neves versus JK ou César
Ladeira versus Paulo Gracindo. Na faculdade de medicina comparávamos Hilton
Rocha e José Feldman. Este possuía bela voz mas só depois de grande esforço
autodidático passou a notável expositor.
Eu, que venho sendo orador desde os dez anos, queria
falar como o Lacerda, enquanto meu primo José Maria Ribeiro queria falar como o
Pimenta da Veiga. Eu conseguia imitar o Pimenta e o Hilton Rocha, mas achava o
Lacerda inimitável. Além de procurar imitar tais astros, sugeri ao Zé Maria
treinar com a teatróloga portuguesa Esther Leão. Ela cobrava caro, mas ele
achou que, para seu futuro, valia a pena - e teve aulas com ela. Nisso foi
colega do Lacerda, de Helder Câmara e outros famosos. O Lacerda aprendeu dela emitir
tão bem seu vozeirão que dispensava microfone, como verifiquei em palestra que
fez na Associação Médica. Nessa época, eu tinha cara de menino e ele me deu
carinhosamente seu autógrafo.
A
oratória do José Maria Ribeiro era admirada por mim, pelos demais
nepomucenenses, por seus contemporâneos na faculdade e pelos juristas. Entre tantos,
lembro os desembargadores Celso Alves de Melo e Lúcio Urbano, além de seu
mestre e primo João Pimenta da Veiga.
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