João Amílcar Salgado

domingo, 15 de maio de 2022

 


ODIOSO GOLPE CONTRA NOSSA PETROBRÁS

João Amílcar Salgado

Em plena ditadura, em 1976, estive na Inglaterra, para estudar um sistema único de saúde para o Brasil, a ser implantado quando houvesse democracia. Suponho ter sido o primeiro especialista brasileiro com tal iniciativa. Um de meus estudos foi verificar a convivência entre o livre mercado e as organizações estatais, como o National Health System (NHS), a pesquisa farmacêutica, o Conselho Britânico a indústria energética, o ensino, o transporte, os correios, os museus e a BBC. Fiz observações semelhantes em viagens pela América Ibérica e pelos EUA.

Antes disso, acompanhei muito jovem a epopeia da criação da Petrobrás, em 1953, contra poderosos interesses quer de vendilhões nacionais, quer de espertalhões internacionais. Participei da luta pela criação da Eletrobrás em 1962, seguida da inauguração de Furnas em 1963 e Itaipu em 1984. Furnas não seria possível se persistisse ali a malária. Meu tio Aprígio Abreu Salgado, médico e cientista nepomucenense, foi um dos heróis ou o principal deles, dessa vitória sanitária. O entusiasmo desenvolvimentista nos fez lutar pela Siderbrás e pela Farmacobrás.

Meu pai já havia sido entusiasta da criação da Vale, em 1942, anteposta à Belgo. A Vale, com a soma do ferro de Minas e de Carajás, chegou a maior do mundo e foi vendida a preço vil por FHC. Seus felizes compradores são responsáveis pelo infeliz, monstruoso e imperdoável desastre de Brumadinho. Nos dias de hoje, criminosos semelhantes pretendem vender não só a Petrobrás como também o Pré-Sal, tudo junto, pelo mesmo preço vil.

quinta-feira, 5 de maio de 2022

 


A SERRA DO CURRAL E A MEMÓRIA DA MEDICINA

João Amílcar Salgado

Duas edificações na Serra do Curral são importantes tanto para a memória da medicina, como para a memória da política brasileira: o HOSPITAL DA BALEIA e o INSTITUTO HILTON ROCHA. Depois do Manifesto dos Mineiros, fator do enfraquecimento da ditadura Vargas, houve a inauguração do moderno Hospital da Baleia, em 1944, liderada pelo antigetulista Baeta Viana, a quem Valadares quis constranger, trazendo o próprio Getúlio para a solenidade. Com isso Viana não pôde fazer do ato mais um manifesto. Depois, durante a ditadura de 64, o governador Rondon Pacheco advertiu o oftalmologista Hilton de que seu Instituto não poderia ser localizado na Serra do Curral. Este veto foi transposto pelo general Golbery, que era cliente e amigo do médico. O Centro de Memória da Medicina de MG solicitou a demolição do Instituto, após a constituinte.

Outro acontecimento foi em 1959, quando os estudantes de medicina protestaram contra a nomeação, feita por JK, de Roberto Campos, apelidado de Bob Fields, para embaixador em Washington. Isso tem a ver com a Serra do Curral, porque Campos e Lucas Lopes estavam envolvidos com a mineradora Hanna na exploração do seu minério. O irmão de Lucas, o médico Hélio Lopes, era um dos ilustres historiadores do Centro de Memória, bem como o odontólogo Ciro Gomide, estudioso da biografia de Hilton Rocha. Ambos enriqueceram a documentação do Centro sobre JK, Hilton Rocha e o movimento estudantil. Já sobre o Hospital da Baleia, o Centro contou com José Sílvio Resende, que, além de ser o maior cirurgião torácico do país, era autorizado tisiologista. biógrafo de Henrique Marques Lisboa e estudioso da iniciativa daquele hospital. Por minha vez, estudo a ligação entre Baeta Viana e João Batista Veiga Sales, sendo este o mais notável de seus discípulos, coincidentemente herdeiro da fazenda Taquaril. Todo esse acervo mostra muito bem quão poderosas e persistentes têm sido as ameaças à ecologia da Serra do Curral.

 

terça-feira, 3 de maio de 2022

 


MINERAR NA SERRA DO CURRAL SEMPRE FOI E SEMPRE SERÁ IMORAL, EXECRÁVEL E CRIME MONSTRUOSO

João Amílcar Salgado

Minerar na Serra do Curral sempre foi denunciado como criminoso. O movimento estudantil já proclamava isso desde que dele participei na década de 50 do século 20. Carlos Drummond, nosso maior poeta, lamentou tão abjeta destruição em documentos célebres. Agora, nossa querida Serra está prestes a ser oferecida à completa destruição pelo inacreditável vilipêndio que autoriza o chamado projeto Tamisa da Taquaril Mineração. Esta empresa minerária, destinada a predar a ecologia da Capital, foi criada em 2021 por Cristiano Pinto Caetano da Cruz e Guilherme Augusto Goncalves Machado. A autorização despudorada está sendo verdadeiramente arrancada, por meios obscuros, dos órgãos responsáveis nas esferas municipal, estadual, federal, fiscal e judicial. Diante disso, aponta-se suspeito silenciamento da imprensa e da comunicação coletiva em geral.  Para maior eloquência de meu protesto, lembro Carlos Drummond.  Num trecho ele diz:Esta manhã acordo e não [a] encontro [a montanha de minério], britada em bilhões de lascas, deslizando em correia transportadora, entupindo 150 vagões, no trem-monstro de 5 locomotivas, – trem maior do mundo, tomem nota – deixando no meu corpo a paisagem, mísero pó de ferro, e este não passa.”  Noutro, ele fala: “O maior trem do mundo /  Transporta a coisa mínima do mundo / Meu coração itabirano / Lá vai o trem maior do mundo / Vai serpenteando, vai sumindo / E um dia, eu sei não voltará / Pois nem terra nem coração existem mais.” E, na mensagem definitiva, de 1976, quando recusa convite para vir à Capital, fala no TRISTE HORIZONTE  que substitui o BELO HORIZONTE:Sossega minha saudade. Não me cicies outra vez o impróprio convite. Não quero mais, não quero ver-te, meu Triste Horizonte e destroçado amor".

Rogo que minha indignação seja compartilhada pelos nepomucenenses, pois a área referida no projeto, Taquaril, é nome da fazenda antes propriedade do nepomucenense Jonas Veiga, que abrangia enorme área. Alcançava o bairro Jonas Veiga, o cemitério da Saudade, a Fazendinha Paiva, a favela do Taquaril, o clube Country, o hospital Baleia, um hotel e a fazenda Ana da Cruz. O primeiro romance escrito por um nepomucenense tem também o nome de TAQUARIL (1961), de autoria do médico, professor da UFMG e escritor Oscar Negrão de Lima, genro de Jonas Veiga.

A orquestração destrutiva da Serra do Curral configura-se uma nódoa, incrivelmente indecorosa e inapagável, na história de Minas.

 

ADENDO:

TRISTE HORIZONTE

Carlos Drummond de Andrade+


“Por que não vais a Belo Horizonte? a saudade cicia e continua, branda: Volta lá.
Tudo é belo e cantante na coleção de perfumes das avenidas que levam ao amor, nos espelhos de luz e penumbra onde se projetam os puros jogos de viver. Anda! Volta lá, volta já.
E eu respondo, carrancudo: Não.
Não voltarei para ver o que não merece ser visto, o que merece ser esquecido, se revogado não pode ser.
Não o passado cor-de-cores fantásticas, Belo Horizonte sorrindo púber e núbil sensual sem malícia, lugar de ler os clássicos e amar as artes novas, lugar muito especial pela graça do clima e pelo gosto, que não tem preço, de falar mal do Governo no lendário Bar do Ponto.
Cidade aberta aos estudantes do mundo inteiro, inclusive Alagoas, “maravilha de milhares de brilhos vidrilhos”mariodeandrademente celebrada.
Não, Mário, Belo Horizonte não era uma tolice como as outras. Era uma provinciana saudável, de carnes leves pesseguíneas. Era um remanso, era um remansopara fugir às partes agitadas do Brasil, sorrindo do Rio de Janeiro e de São Paulo: tão prafrentex, as duas! e nós lá: macio-amesendados na calma e na verde brisa irônica…
Esquecer, quero esquecer é a brutal Belo Horizonte que se empavona sobre o corpo crucificado da primeira. Quero não saber da traição de seus santos. Eles a protegiam, agora protegem-se a si mesmos. São José, no centro mesmo da cidade, explora estacionamento de automóveis. São José dendroclasta não deixa de pé sequer um pé-de-pau onde amarrar o burrinho numa parada no caminho do Egito. São José vai entrar feio no comércio de imóveis, vendendo seus jardins reservados a Deus. São Pedro instala supermercado. Nossa Senhora das Dores, amizade da gente na Floresta, (vi crescer sua igreja à sombra do Padre Artur) abre caderneta de poupança, lojas de acessórios para carros, papelaria, aviário, pães-de-queijo
Terão endoidecido esses meus santos e a dolorida mãe de Deus? Ou foi em nome deles que pastores deixam de pastorear para faturar? Não escutem a voz de Jeremias (e é o Senhor que fala por sua boca de vergasta): “Eu vos introduzi numa terra fértil, e depois de lá entrardes a profanastes. Ai dos pastores que perdem e despedaçam o rebanho da minha pastagem! Eis que os visitarei para castigar a esperteza de seus desígnios”.
Fujo da ignóbil visão de tendas obstruindo as alamedas do Senhor. Tento fugir da própria cidade, reconfortar-me em seu austero píncaro serrano. De lá verei uma longínqua, purificada Belo Horizonte sem escutar o rumor dos negócios abafando a litania dos fieis. Lá o imenso azul desenha ainda as mensagens de esperança nos homens pacificados – os doces mineiros que teimam em existir no caos e no tráfico. Em vão tento a escalada. Cassetetes e revólveres me barram a subida que era alegria dominical de minha gente. Proibido escalar.
Proibido sentir o ar de liberdade destes cimos, proibido viver a selvagem intimidade destas pedras que se vão desfazendo em forma de dinheiro. Esta serra tem dono. Não mais a natureza a governa. Desfaz-se, com o minério, uma antiga aliança, um rito da cidade. Desiste ou leva bala. Encurralados todos, a Serra do Curral, os moradores cá embaixo.
Jeremias me avisa: “Foi assolada toda a serra; de improviso derrubaram minhas tendas, abateram meus pavilhões. Vi os montes, e eis que tremiam. E todos os outeiros estremeciam. Olhei terra, e eis que estava vazia, sem nada nada nada”.
Sossega minha saudade. Não me cicies outra vez o impróprio convite. Não quero mais, não quero ver-te, meu Triste Horizonte e destroçado amor”.

A MONTANHA PULVERIZADA
Carlos Drummond de Andrade

Chego à sacada e vejo a minha serra,
a serra de meu pai e meu avô,
de todos os Andrades que passaram
e passarão, a serra que não passa.

Era coisa de índios e a tomamos
para enfeitar e presidir a vida
neste vale soturno onde a riqueza
maior é a sua vista a contemplá-la.

De longe nos revela o perfil grave.
A cada volta de caminho aponta
uma forma de ser, em ferro, eterna,
e sopra eternidade na fluência.

Esta manhã acordo e não a encontro,
britada em bilhões de lascas,
deslizando em correia transportadora
entupindo 150 vagões,
no trem-monstro de 5 locomotivas
– trem maior do mundo, tomem nota –
adeixando no meu corpo a paisagem
mísero pó de ferro, e este não passa.

 

sexta-feira, 29 de abril de 2022

 



FOTÓGRAFO WALTER FIRMO E ÓPERA ALEIJADINHO

João Amílcar Salgado

Em 29/4/22 podemos ter o privilégio de ver em S.Paulo as fotos de WALTER FIRMO e presenciar em Ouro Preto a ópera ALEIJADINHO. Walter Firmo e Sebastião Salgado são fotógrafos brasileiros internacionais, sendo que Walter é um negro fotógrafo de negros. Sua exposição está no Instituto Moreira Salles. Na ilustração vemos sua foto de Pixinguinha, gênio de nossa música. Já a ópera é imperdível, ainda mais no adro da principal igreja do próprio Aleijadinho. Foi composta por ERNANE AGUIAR, com libreto de ANDRÉ CARDOSO, tendo JOHNNY FRANÇA como solista, no papel de Aleijadinho.

domingo, 10 de abril de 2022

 


MARIA MARTINS – MÚLTIPLA ARTISTA SULMINEIRA

João Amílcar Salgado

Maria Martins, artista polivalente, é uma brasileira com biografia simplesmente espetacular e personagem do modernismo mundial. Mineira sedutora, teria tido em seus braços celebridades mundo afora. Nascida em Campanha, sul de Minas, faz parte das famílias Alves, Faria e Pereira, sendo parente dos nepomucenenses com tais sobrenomes. Cito quatro aparentados dela marcantes para mim:  Antônio Pereira, empresário de ônibus, Ozeias do Prado Pereira, craque, cronista esportivo e humorista, ambos personagens salientes em meu livro O RISO DOURADO DA VILA (2003), Júlia Pereira, esposa do Levi Veiga Costa, primo de minha mãe, e Carlota Pereira, nossa vovó Lolota, terceira esposa de meu avô João de Abreu Salgado. Além disso, outro parente dela, areadense e sulmineiro de renome, é meu querido colega de medicina e de docência, o Álvaro de Vasconcelos Pereira. A obra de Maria Martins volta a ser lembrada agora, em abril de 2022, como a escultura dos trópicos e do surrealismo, dentre a qual a mais conhecida é O IMPOSSÍVEL (1945).

sexta-feira, 8 de abril de 2022

 

PRIMEIRA MULHER NEGRA NA SUPREMA CORTE IANQUE  

João Amílcar Salgad



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Em nome do Negro Cascalho, do Padre Vítor, de Abraham Lincoln, de Spike Lee, de Milton Nascimento e de meu avô, João de Abreu Salgado, tenho a alegria de comunicar aos amigos a boa notícia da eleição, hoje, 7/4/22, de KETANJI BROWN JACKSON, para a suprema corte ianque. Em 1967, o partido democrata, como legado de John Kennedy, conseguiu que Thurgood Marshall fosse o primeiro negro na corte. Foi sucedido pelo também negro Clarence Thomas, que terá a colega Ketanji como a primeira mulher negra admitida.  A primeira mulher foi Sandra Day O'Connor, eleita em 1981, bramca, hoje com 92 anos. O esposo da nova juiza é o cirurgião hispânico Patrick Jackson, egresso de Columbia e Havard, que presenciou a cerimônia em lágrimas.

Este acontecimento traduz uma verdade histórica: a retardatária presença negra, nessa corte, antecedeu a ainda mais retardatária presença feminina - e esta precedeu cumulativamente a presença da mulher negra. A efeméride ora celebrada foi, por sinal - e para desespero dos racistas - presidida pela afro-oriental senadora Kamala Harris, vice-presidente do país.

 

segunda-feira, 4 de abril de 2022

 


OS PRESBITERIANOS

João Amílcar Salgado

A Igreja Presbiteriana e a família Ribeiro devem ser desagravadas diante da conduta criminosa do pastor presbiteriano Milton Ribeiro, na condição de Ministro da Educação. Ele escancarou a horripilante degradação a que chegou a educação nacional, sendo que sua conduta está severamente agravada pela placidez e pelo cinismo com que a vem confirmando em sucessivos flagrantes e depoimentos. Igual placidez e cinismo exibem seus dois principais comparsas, os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura (Assembleia de Deus), antecedidos por Amilton Gomes de Paula (Batista).  Nosso país, depois de esmagado por dolorosíssimo escândalo na saúde, perpetrado pela PREVENT SENIOR, se vê ultrajado por outro na educação, neste caso perpetrado pelo próprio ministro. Parece que nenhuma consequência resultará de ambos, o que significa terceiro mega-escândalo – definitiva evidência de corrupção e impunidade generalizadas, orquestradas e organizadas.

            A história dos religiosos presbiterianos é muito rica e dela me venho ocupando desde que meu pai me relatou sua participação no corpo docente do colégio protestante, criado por Ruth See em Nepomuceno (ver NEPOMUCENO – SÍNTESE HISTÓRICA, 2016, e O RISO DOURADO DA VILA, 2003 e 2020). Relacionado a isso, estudei também os insignes educadores George Gammon, Carlota Kemper, Firmino Costa, Eduardo Carlos Pereira, Rubem Alves, Abdênago Lisboa, Márcio Moreira, George Butler e o mártir Né Vilela. Neste estudo incluem-se os sucessivos cismas desta corrente religiosa, sendo o mais recente causado pela adoção do casamento homoafetivo.