João Amílcar Salgado

sexta-feira, 29 de março de 2024

 

DOMINGOS MIGUEL OU “DUMINGO DO GRUPO”



O Dumingo é frequentador assíduo das páginas de meu livro O RISO DOURADO DA VILA. Foi menino terrível na Trumbuca, quando dizia que não queria ser doutor, mas jagunço de ricaço. Meu pai o encontrou ali na venda do Michel e ficou impressionado com a inteligência do jovem. Antes que ele cumprisse sua aspiração marginal, criou juízo no serviço militar, em Juiz de Fora. Meu pai então pediu meu avô, que era diretor do grupo-escolar, que o colocasse ali como bedel, desde que estudasse e não usasse de violência como disciplinador. Foi o bedel mais perfeito, pois conhecia por si todas as traquinagens da rapaziada. Uma das numerosas evidências de que a Vila é o umbigo do mundo aconteceu em Juiz de Fora. Adivinhem quem foi o maior amigo do Dumingo no quartel? Simplesmente o Luiz Gonzaga - sim, o sanfoneiro inventor do baião, corneteiro aos 17 anos! O comandante liberou o Luiz e o Dumingo para o circo, quando o nepomucenense causou a sensacional  suspensão do espetáculo, descrita no livro. O Dumingo me prometeu um retrato seu fardado. Não achou, mas eu achei o retrato do Gonzagão como soldado. Eis um retrato do Dumingo mais jovem e o de seu célebre amigo.

 

quinta-feira, 14 de março de 2024


 

ÂNGELA TONELLI VAZ LEÃO

João Amílcar Salgado

            A Ângela Leão é personagem de meu livro O RISO DOURADO DA VILA (2020), sendo filha da nepomucenense Zaroca (Isaura) Piva Tonelli e sobrinha do fraterno amigo de meu pai Zico Tonelli. As melhores farmácia e alfaiataria da Vila eram de meu pai e do Zico, respectivamente. O pai da Ângela é Saul Vaz, de ilustre linhagem mineira. Com o esposo guanhanense Wilson Coelho Leão, a filóloga teve cinco filhos. Ela aparece no Riso, quando me arguiu no vestibular da Fafich, em 1962. Ela reaparece no episódio com o Jarbas Juarez, no final do curso de jornalismo, em 1965. Este último causo acabou reunindo virtualmente três figuraças: Ângela, Drummond e nosso originalíssimo desenhista, pintor e escultor.

            Coincide que o Aires da Mata Machado Filho indicou a Ângela para herdeira de sua cátedra, enquanto, no vestibular da medicina, em 1955, fui arguido pelo Aires - e as arguições foram muito semelhantes. Na posse do Edward Tonelli na Academia de Medicina, fizemos uma roda da Vila, em torno da Ângela, quando relembramos este humorismo todo. Ela falou com entusiasmo da mais nova de suas pesquisas.  Comentei rapidamente que seu soberano castelhano pesquisado é mais uma das evidências de que a Vila é o umbigo do mundo. Como assim? É que mágicas linhas cruzadas do céu ibérico ocorreram, quando ela decidiu estudar o rei Alfonso X - sábio astrônomo e curiosíssimo poeta. Garanti a ela que a família Correia de nossa Vila, que inclui os Garcia, os Correia Lima e demais descendentes das Ilhoas (um deles eu) é consanguínea do Alfonso. Ela, atônita, exclamou que agendaria um dia inteiro para conversarmos exclusivamente sobre isso. Mas essa tertúlia infelizmente não aconteceu, por culpa do tumulto de nossas vidas acadêmicas.

NOTA O causo do Jarbas é ilustrado pelo texto de Ângela ASPECTOS LINGÜÍSTICOS E ESTILÍSTICOS DE FALA AMENDOEIRA, de Drummond, Revista Kriterion, 18:250, 1964.  Ver também a introdução de Ângela ao livro DICIONÁRIO FRANCÊS-PORTUGUÊS DE LOCUÇÕES, de meu querido amigo Aluísio Mendes Campos, também personagem do RISO.

terça-feira, 12 de março de 2024

 

 


AMEDÉE PERET - ARQUITETO PATRIMÔNIO DA UFMG

João Amílcar Salgado

Luciano Amedée Peret, belorizontino, arquiteto, diplomado em 1950 pela UFMG, foi professor e diretor das Escolas de Belas Artes e de Arquitetura da UFMG e um dos fundadores, diretor e presidente do INSTITUTO ESTADUAL DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO DE MINAS GERAIS (IEPHA). Contemplado com admirável cultura geral e especializada, poderia parecer um francês desgarrado, mas, ao contrário, era de uma mineirice radical. Logo que fundamos o Centro de Memória da Medicina de MG, procuramos criar um centro em cada unidade. Para a arquitetura, entrei em contato com o Peret, que me confessou ter tentado algo semelhante, mas seus obstáculos vieram principalmente da ditadura e de docentes temerosos da mesma. Revelou que a Escola tinha uma gráfica grande e moderna e era vigiada contra uso subversivo. Uma tradução recém-editada de um livro, que nada tinha disso, fora confiscada, porque um araponga analfabeto concluiu que o autor francês difamava o Brasil. Importante acervo desse centro seria a réplica da Vênus de Milo e os moldes dos profetas de Congonhas, preciosidades que seriam protegidas e aproveitadas em vários fins. Afinal Peret foi decisivo no tombamento do Instituto do Radium, famoso internacionalmente, antes quase demolido. Luciano Filho, refinado pediatra da equipe de Ênio Leão, foi um dos que transformaram o antigo posto de gastroenterite em atendimento infantil de alto nível e em ambiente de seleta pesquisa científica. É o atual coordenador do Centro de Memória da Medicina, no encalço do paradigma paterno.

Vale registrar que um ramo da família Peret foi para a cidade de Três Pontas, havendo ali um local que o povo chama Perétia. Casaram-se no tronco Ferreira de Brito, o mesmo de minha família.

segunda-feira, 11 de março de 2024

 

CONTRA LESAR A SERRA DO CURRAL E AS ÁRVORES DA UFMG! - OS CRIMES SÃO IGUALMENTE MONSTRUOSOS

João Amílcar S


algado


           
Quando protestei contra a mineração na serra do curral, os amigos se espantaram com os dados históricos que citei. Hoje cito os dados das árvores da UFMG. No início de 1960, JK pronunciou a aula inaugural daquele ano, inaugurando o novo auditório da Faculdade de Medicina onde se diplomou. Era para inaugurar o prédio, mas os gastos com Brasília não permitiram. E não era para demolir o prédio anterior. Nessa aula, JK assinou, ao lado do futuro prefeito Jorge Carone Filho e do governador Francisco Bias Fortes, a permissão para construir o complexo do Mineirão no terreno da universidade. E o complexo deveria ter sido construído onde hoje é o Bh-Shoping, conforme proposto pelo notável dirigente esportivo Francisco Cortes. O fato consumado levou o inesquecível agrônomo, botânico e ecologista Camilo Fonseca Filho a plantar o máximo de árvores escolhidas, no campus, antes que novos nacos da área-verde fossem abocanhados. De medo que protestasse, o levaram para plantar a grama do estádio. Mesmo assim o campus prosseguiu sendo comido pelas beiradas, ao longo do tempo. De início, a avenida Antônio Carlos não poderia, como aconteceu, cortar a dita área, mas passar pelo entorno do aeroporto. Com isso a universidade perdeu sua área do outro lado da avenida. E vieram o colégio militar, o corpo de bombeiro, o prédio da Usiminas, a avenida Carlos Luz, loteamentos, mansões, colégio, clube de funcionários, supermercado e invasões. Muito me orgulha ter, ao lado de João Batista Peret, Carlo Fatini e Tarcício Ribeiro Campos, convencido o reitor Cid Veloso de ser feroz contra a tentativa de invasão e loteamento do outro lado da Carlos Luz. Hoje a ganância continua triunfando. E as árvores e a universidade estão praticamente indefesas.

            Vale acrescentar que antes o reitor Marcelo Coelho discutiu comigo um possível complexo hospitalar complementar ao Hospital das Clínicas, onde hoje é a Usiminas, descartado porque docentes cobiçaram que fosse semi-privado. Foi reincluído no esboço da proposta eleitoral de Veloso, novamente descartado.

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024


 ÁRABES E ISRAELENSES

João Amílcar Salgado

Em meu livro O RISO DOURADO DA VILA (2020), digo que a disputa no jogo de damas, entre um Unes e um Antunes, é excepcional lição de Nepomuceno para o conflito no Oriente Médio. Agora em que o Brasil e Israel se envolvem em disputa – na qual se misturam ignorância histórica com “fake news” - nada mais oportuno que relembrar tudo isso. Sim, fomos capazes de inventar uma maneira de substituir o milenar conflito árabe-judeu pela secular harmonia entre imigrantes, acrescentando-lhe um coroamento esportivo.

Historicamente, o Brasil ocupa posição inigualável no acolhimento de descendentes de judeus e de imigrantes árabes. Se adotarmos um sentido lato ao termo palestino, podemos dizer que abrigamos o maior contingente mundial de descendentes judeus sefardinos e asquenazitas e, ao mesmo tempo, o maior contingente mundial de imigrantes “palestinos”. O atual presidente Luiz Inácio tem o sobrenome Silva que identificava originalmente os judeus lusos mais perseguidos pela inquisição, muitos deles se refugiando na França. Expoentes do mundo econômico-financeiro, do mundo médico, do mundo da comunicação coletiva (Wainer, Bloch, Waack, Abravanel, Herzog, Abramo, Neubarth, Brum, Dines, Sirotsky, Altman, Finkelstein) e do mundo político, (J. Wagner, Alcolumbre, Weber, Hoffmann, Hasselmann, Gleiser, Gasparian, Niemeyer, Brant e incalculáveis descendentes de paulistanos flamengos, estes estudados pelo judeu Isaias Golgher), são judeus que, de alguma forma, ascenderam ao poder (com o apoio ou não de, por exemplo, o judeu George Soros), enquanto Maluf, Temer, Alkmin, Hadad, Gabeira, Nassif, Sadi, Kfouri, Chediak, Simon, Kalil, Tebet, Feghali, Chamone,  Wanderlea, P. Baruch, Aziz, Kassab, Boulos, Nasser, Mansur, Yunes e Amin são árabes frequentadores do noticiário diário. Os hospitais Einstein e Sirio Libanes contam com profissionais e clientes de origem israelense e árabe sem distinção. Fui aluno do notável arquiteto Jarbas Bela Karman, judeu, que projetou o Einstein. Trabalhei com vários cientistas judeus e árabes. Colaborei em especial com meu amigo Adib Jatene, árabe. Sou discípulo e fraterno admirador do aristocrático cardiologista árabe-armênio Arnaldo Elian e do inigualável pneumologista judeu José Feldman. Na solenidade de meu ingresso na Academia de Medicina, fui protocolarmente conduzido ao assento por meu colega de pesquisas, o judeu Naftale Katz.  Sou colega de turma dos árabes Calil e Rasuk e da judia Marie Stein, egressa do gueto de Varsóvia.

Eu mesmo tenho o nome Amílcar que homenageia um líder árabe, tenho dois sobrinhos árabes e provenho de pelo menos cinco troncos judaicos. Um dos maiores escritores do mundo é o brasileiro árabe Jorge Amado, originalmente Ahmed. Célebres são o dicionarista Antônio Houaiss e os gramáticos Evanildo Bechara e Antônio Chediak, árabes. O médico e político árabe, Ladislau Lauar Sales, é meu inesquecível amigo. Traduzi e divulguei textos e pesquisas de Ralph Nader, árabe. Escrevi sobre o Nobel do judeu Einstein em confronto com o malogrado Nobel de Carlos Chagas.

Nepomuceno, na época do início da 2ª Guerra, hospedou de passagem o diplomata Oswaldo Aranha. Foi saudado aqui pela extraordinária oradora Alice Lima, prima de minha mãe. 10 anos depois, este estadista presidiu a Assembleia Geral da recém-fundada ONU, quando foi instituído o Estado de Israel, em 1948.

Vejam no youtube o que dizem Finkelstein e Altman

Leiam o livro de Altman: CONTRA O SIONISMO: BREVE HISTORIA DE UMA DOUTRINA COLONIAL E RACISTA (2023)


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sábado, 30 de dezembro de 2023

 


FREI LUÍS SALGADO PRECURSOR DO NÃO-É-NÃO

João Amílcar Salgado

Em 30/12/23 passa a vigorar A LEI DO NÃO-É-NÃO contra o assédio à mulher. Não pode haver melhor oportunidade para homenagear um religioso esquecido na história brasileira. Trata-se do carmelita luso frei LUÍS SALGADO DE CASTILHO (ou frei Luís de Santa Teresa). Nasceu em Lisboa em 1693, diplomado e professor por Coimbra, em Filosofia e Teologia, quando brilhou por sua rara inteligência e erudição. Logo optou por ser carmelita descalço. Passou a admirado mestre no Colégio de São José de Coimbra. Foi nomeado Bispo de Pernambuco em 1738, função que exerceu de 1739 a 1753. Foi verdadeiro pastor, visitando todas as povoações do interior e executou reformas da moral e dos costumes, sobretudo a protecção das escravas contra os despudores de que eram vítimas. Tutelou casas de clausura femininas, como o Recolhimento do Paraíso dos Afogados e o de Nossa Senhora da Conceição de Olinda, e envolveu-se pessoalmente em atritos com os escravocratas, nos quais representou e defendeu as escravas. Seus oponentes  exigiram do rei D. José sua remoção e foram atendidos. De volta a Lisboa, retirou-se para a Quinta da Granja da Paradela (ou do Barruncho), em Loures, propriedade de sua sobrinha Antônia Mariana Teresa Salgado de Vargas, onde morreu em 1759. Está sepultado na capela-mor do Convento de São João da Cruz de Carnide.

Nepomuceno, cidade conhecida pelo grande número de membros do clã Salgado, deve incluir o carmelita frei Luís Salgado no panteão de seus oragos (S. J. Nepomuceno, S. Miguel, S. Antônio, S. Vicente e N. S. Aparecida) e rogar ao papa Francisco sua beatificação. Este notável precursor da lei do Não-é-Não deve ser declarado cidadão honorário póstumo da Vila, ao lado de outros que venho sugerindo. Frei Luís teve um irmão também carmelia, frei João da Cruz Salgado de Castilho, que tem a ver com Minas Gerais, pois, em 1739, se tornou bispo da diocese do Rio, que na época abrangia Minas e São Paulo. Adoentado voltou a Portugal, deixando fama de santo.

 

 

terça-feira, 26 de dezembro de 2023

 


REVISTA MÉDICA CONFESSA RACISMO

João Amílcar Salgado

Em 7/12/23 o New England Journal of Medicine (NEJM), referência minha e de todos os cientistas, publicou minucioso texto sobre a relação desta revista médica com o racismo. Apresentamos aqui nossos parabens a seus editores, por este mea-culpa.

Os colonizadores britânicos trouxeram os primeiros escravos africanos para os futuros EUA (Virginia), em 1619. Em 1810 havia 1,2 milhões de escravos, que atingiram 4 milhões em 1860. Um quinto  ou um sexto  deles morriam anualmente. Os médicos da época possuiam escravos, serviam em navios negreiros, possuiam fazendas com escravos e usaram os corpos de escravos para ensinar anatomia e para pesquisa. O NEJM foi fundado em 1812 por dois médicos de Boston, John Warren e James Jackson, acrescidos de Walter Channing. Pertenciam a familias enriquecidas, inclusive com a escravidão, no negócio de rum, açúcar, melado, algodão e madeira. Os primeiros artigos do periódico eram depreciativos aos negros e abertamente racistas. Publicou relato de viagens de médicos, um deles até Nova Orleans, que encontrou no Alabama um colega que lhe disse que os mulatos eram híbridos degenerados e inviáveis, os quais deviam ser submetidos ao trabalho mais duro, antes que a própia natureza os matasse. Assim o NEJM e a literatura médica de então  normalizavam e muitas vezes justificavam o racismo.

E aqui no Brasil, neste mesmo mês de dezembro, revela-se que a população brasileira ousou, no recente censo, também fazer uma confissão análoga: somos mulatos.