João Amílcar Salgado

quinta-feira, 8 de abril de 2021

 


MAIS LUZ E MENOS CALOR

João Amílcar Salgado

O falecimento do físico japonês Isamu Akasaki, em 2021, nos lembra o tema dos fosseis tecnológicos, que abordo em meu livro O RISO DOURADO DA VILA, a ser lançado breve, em 2ª edição. A lâmpada incandescente é um fóssil tecnológico que sobreviveu até hoje. Foi inventada em 1802 por Humphry Davy e passou ao uso prático em 1888, pela invenção da corrente alternada por Nicola Tesla. Estudo dois gênios: Giordano Bruno e Tesla, porque ambos exibiram um tipo de capacidade mental ainda não bem avaliado. Parece que suas mentes são assustadoras para pedagogos e psicólogos comuns.

Tesla deve ser homenageado sobretudo pelos nepomucenenses, pois ele era um emérito catador-de-risco, enquanto Nepomuceno é a capital mundial da catação-de-risco. Já o Akasaki deve ser aplaudido não só pelos ecologistas, mas pelos pacifistas. Pelos ecologistas, por causa da invenção da lâmpada azul (led), de baixo consumo de energia. Pelos pacifistas, porque a lâmpada incandescente gera mais calor do que luz e sua lâmpada gera mais luz e menos calor.

[Diante disso, Biden fracassará se não conseguir vitória significativa em substituir a energia suja pela limpa, em desarmar os cidadãos e em neutralizar o discurso de ódio]

quarta-feira, 7 de abril de 2021

 


MEDICINA NO EGITO ANTIGO

Obtive grande sucesso com textos divulgados pelo periódico do Conselho Federal de Medicina. O conselho estadual paulista então me convidou para escrever algo apropriado para a edição de natal de 2002 de seu periódico. Pedi que sugerissem o tema e me encomendaram uma síntese da medicina faraônica. Achei que ficou um belo resumo, bastante substancial, com requintada ilustração. Recebi elogios de toda parte. Aconteceu, entretanto, que um médico lhes enviou um protesto contra o trecho final. Ali declaro que o episódio bíblico no qual Isaque escapa da morte é uma transposição de escape similar de Obaluaê, na mitologia africana. Como uma das escravas de Abrão era africana sugiro ser esta a circunstância da transposição religiosa. O periódico disse que entre tantos aplausos houve apenas este protesto. Pediu que eu respondesse e me limitei a sugerir que publicasse o protesto, deixando o julgamento por conta dos leitores.  

Eis o texto:

MEDICINA NO EGITO ANTIGO

João Amílcar Salgado

O atendimento clínico socializado, a vigilância sanitária, a puericultura, a cirurgia, a farmacoterapia, o hospital e o ensino universitário encontrados hoje podem ser identificados, em espantosa contemporaneidade, na medicina egípcia.

A história da medicina no Egito faraônico passa a sofrer hoje completa revisão, que advém não da descoberta de novos registros, mas da correção dos vieses eurocêntricos e até racistas verificados nos primeiros estudos arqueológicos e históricos. A primeira retificação é geográfica, pois tudo indica que o Golfo Pérsico e não o Mar Vermelho é o limite entre a África e o Oriente.

Os primeiros homens a saírem da África para os demais continentes provavelmente migraram em fluxo descontínuo, de modo a permitir a diferenciação das raças. Ao mesmo tempo, a raça negra, como tal, manteve fluxo relativamente contínuo para além do Golfo Pérsico, antes da origem da civilização egípcia. De fato, o deslocamento oriental de populações negras se deu, desde tempos imemoriais, ao longo da faixa litorânea que bordeja o Oceano Índico até a Austrália ou até mesmo a América. Isso significa que a chegada da cultura egípcia até o Cáucaso, por terra ou pelo Mar Mediterrâneo, foi apenas mais uma, e não a única, entre as contribuições africanas à evolução tecno-cultural da humanidade.

A domesticação de plantas e animais, em vários locais do mundo, levou à divinização do sol, que então substitui a divindade panteísta dos catadores-caçadores. No Egito, o sol, fecundante das cheias do Nilo, é Amon-Ra, deus também da medicina. A Grécia, onde aquela domesticação não teve o mesmo significado, copiou Amon-Ra como Hélios, por sua vez copiado pelos romanos como Apolo. Em virtude da especialização requerida pela maior complexidade social, um semideus, Inotepe, filho ou descendente de Amon-Ra, se torna o deus específico da medicina. Inotepe é copiado na Grécia como Asclépio e em Roma como Esculápio. O ensino médico, ao processar-se sigilosamente de pai para filho, implica a vinculação genealógica de qualquer médico ao semideus e ao próprio deus. Ela decorre da simbolização em que o deus encarnado Imotepe é germinado pelo pai divino Amon-Ra, fecundador de sementes. Em outros termos, Imotepe ressurge da mortalidade subterrânea para a imortalidade individual – triunfo que é recorrente em todas as religiões e almejado pela medicina de todos os tempos.

Um médico histórico eminente passa a ser identificado como a encarnação desse deus da medicina. No caso egípcio, Imotepe, médico do rei Zoser (2980 aC), era tão notável que foi pioneiro quer no uso da escrita, quer na arquitetura de pirâmides. De fato, um dos estímulos à escrita foi o registro da crescente farmacopéia, fruto da expansão civilizatória. Culturas ágrafas dominam farmacopéias importantes, mas a escrita permite, sobretudo, a fusão delas. Já a arquitetura traduz o papel da medicina como ponte entre a religião e o desenvolvimento de todas as ciências, inclusive a matemática e a astronomia, na qual Amon-Ra é o astro fundamental, regente de ciclos climáticos e de pragas agrícolas e humanas. O papiro Ebers, de 1550aC (descoberto em Luxor, em 1873), e os outros papiros médicos constituem, portanto, apenas o episódio final de longa história daquela medicina conservada oralmente, com auxílio de rima, música, lendas e tabus.

Sociologicamente, a cultura faraônica é profundamente médica, no sentido de que persegue o sonho médico da imortalidade corpórea, não só de faraós, mas de pessoas comuns e até de animais – daí seu politeísmo médico. A mumificação compõe tal medicina e implica conhecimentos da anatomia à farmacologia e à cosmética, referente ao homem e aos demais animais (com a respectiva veterinária), especialmente da bacteriologia virtual implícita na vitória contra a putrefação e no domínio da fermentação. Coerentes com isso e diferentes de outros, são os primeiros a considerar vitais a respiração e o batimento cardíaco.

A proximidade do deserto, da savana e da selva trouxe peculiaridades. A valorização da água e os procedimentos mumificantes geram a teoria médica da limpeza externa e interna do corpo. O banho do próprio médico devia repetir-se duas vezes de dia e duas de noite, além da roupa branca e da cabeça raspada a cada três dias, origem da ligação entre barbeiros e cirurgiões. O vento arenoso do deserto induz à prática da circuncisão (desde 5000 aC), como profilaxia de gangrena peniana - hábito que de cirúrgico passa a litúrgico. A biodiversidade da savana e da selva permite correlacionar doença com peçonha e vermes, originando desde produtos antissépticos, que se transformam em culinários, até o consumo de subprodutos animais, como o mel, o leite e o sangue.

O atendimento clínico socializado, a vigilância sanitária, a puericultura, a cirurgia (os bisturis de pedra e de bronze precedem o de ferro, este presente em 1600 aC), a farmacoterapia, o hospital e o ensino universitário e médico encontrados hoje podem ser identificados, em espantosa contemporaneidade, na medicina egípcia. Essa verificação está patente no R modificado, ideograma do olho de Hórus, que subsiste na folha atual de receituário.

Tanta conquista não mais pode ser atribuída a uma espécie de milagre antropológico ocorrido às margens do Nilo. Por exemplo, seja a metalurgia, seja a mumificação ou grande parte da medicina surgiram da cultura núbia. Os ritos lustrais são predominantemente líbios (os líbios primitivos eram também negros, tanto como os egípcios e os núbios). Para evidenciar a difusão de traços culturais, exemplifiquemos com a superação do infanticídio economicamente necessário. Todas as subculturas da África o superaram, quando a economia tribal se desenvolveu a ponto de comportar a sobrevida de crianças defeituosas (e também de idosos e de adultos incapacitados). No Brasil é conhecido o rito do Omulu-Obaluaê, originário do lado Atlântico da África. Omulu é o orixá da medicina e Obaluaê é Omulu jovem. Sendo criança defeituosa (aleijada, variolosa ou leprosa), Obaluaê deveria ser lançado ao lago. Sobreviveu quando o orixá feminino Nana o resgatou do infanticídio. Assim, não é nada surpreendente que Abraão, que era negro e escravizava uma africana, resgate seu filho Isaque de morte semelhante, no poético episódio bíblico que relatou aos membros de sua tribo.

 

domingo, 4 de abril de 2021

 


EM HOMENAGEM À EXCEPCIONAL MÉDICA NEPOMUCENENSE ANDREIA LOURENÇONI, QUERIDISSIMA EX-ALUNA E PRIMA, RELEMBRO O CENTENÁRIO DE NOSSA SANTA CASA

 

CRONOLOGIA DA CRENOLOGIA SULMINEIRA

Em 2016 foi comemorado o centenário da Santa Casa de Nepomuceno e em Itajubá foi realizado o 21º Congresso Brasileiro de História da Medicina e o 11º Congresso Mineiro de História da Medicina. Fui o principal conferencista desses eventos e para eles fiz a revisão da História da Medicina no Sul de Minas. Na “cronologia da crenologia sulmineira”, salientei as figuras do Padre Manoel Gonçalves Correa (1780), Midões (1818), Caminhoá (1890), Viotti (1883) e Monat 1894.

Por volta de 1790, o PADRE MANOEL GONÇALVES CORREIA, filho da ilhoa Júlia Maria da Caridade e do ilhéu Diogo Garcia, se desloca para o sertão de mato virgem, ao oeste de sua região de origem, Rio das Mortes.  Manoel era irmão do fundador de Nepomuceno Mateus Luís Garcia. O sacerdote instalou uma fazenda no "Monte Alegre", junto à fronteira paulista. Lá ergueu uma ermida, para exercer seu ofício, a primeira igreja da região, dedicada a Nossa Senhora do Carmo. A tradição diz que quando entrou no lugar, antes ocupado por indígenas, ficou sedento e bebeu a água de um poço, notando que a água era quente (água calda) e tinha gosto de enxofre. Outros poços semelhantes existiam por ali e foram chamados de poços de águas caldas. A vegetação incluía um capim viçoso, que alimentou o início do rebanho caracu, e o arredor recebeu o nome de campos das águas caldas. Dos 14 filhos de Júlia e Diogo, o padre ficou sem o sobrenome Garcia, e foi batizado com o nome igual ao do avô. Seria uma promessa da mãe para que o filho viesse a ser padre. Os demais filhos masculinos eram rapazes mulherengos e nada religiosos. Mesmo assim, Manoel teria tido dezenas de filhos e com isso influenciou seu colega de seminário, padre Feijó, para propor mudanças no celibato religioso. Manuel se uniu a Joana Brito e com ela teve pelo menos o filho Francisco e as filhas Francisca e Júlia, mas teria tido dezenas de outros filhos com outras mulheres. O testamento do padre, contudo, não menciona filhos.

            O português INÁCIO GOMES MIDÕES teria sido aprovado em medicina em Lisboa e chegado até a físico-mor da cidade. José Bonifácio o teria convidado a vir para o Brasil, inicialmente para São Paulo. Pouco tempo depois veio para a cidade de Campanha onde, em 1818, esperava ser nomeado cirurgião da câmara. A nomeação saiu para São João del Rei, morando lá de 1819 a 1822, de onde voltou para Campanha. Atuou aí como clínico e político, sendo vereador também em Cambuquira.  Neste cargo passou a admirador e defensor das águas virtuosas de Lambari. Em 1938 empreendeu a estrada entre Campanha e o arraial de Lambari. O final da estrada veio a ser a Rua Direita e dela cresceu a futura cidade-balneário.

O médico baiano, nascido em Salvador, JOAQUIM MONTEIRO CAMINHOÁ foi um dos maiores botânicos do Brasil, professor na atual Ufrj e entusiasta das águas de Araxá, sobre as quais escreveu o livro AGUAS MINERAES DO ARAXÁ (1890). Assim os dois notáveis médicos ligados a estas águas são o mineiro Antonio Aleixo e Joaquim Caminhoá. Este era irmão do engenheiro Luís Caminhoá e primo do notável arquiteto Francisco Caminhoá.

POLICARPO RODRIGUES VIOTTI e o baiano Henrique Monat, médicos de alto prestígio no Império, fizeram célebres as águas de Caxambu. Viotti é de importância particular para mim porque se casou com Ambrozina de Magalhães parente de meu avô, da esposa de Carlos Chagas, Iris Lobo, e de Vital Brasil, além de avô de meu ex-aluno Maurício Viotti, astro da psiquiatria mineira e amigo de meu filho João Vinícius. Outras figuras ilustres da família são, entre outras, a historiadora Emília Viotti e o polivalente Sérgio Viotti. Em 1909, Policarpo brilhou no Congresso Médico de São Paulo discorrendo sobre as águas de Caxambu e Poços de Caldas, sendo que obteve do governador e ministro Francisco Sales as respectivas prefeituras, em 1904.

Já da família de Monat me interessa saber se teve algo com partidários de Napoleão arribados à Bahia para resgatá-lo em Santa Helena. O baiano HENRIQUE MONAT era parente de Castro Alves e de Francisco de Castro e herdeiro da chamada “escola tropicalista”. Foi um dos fundadores da urologia moderna no Brasil. Publicou MÉTODO PRÁTICO DE FRANCES, e ESTUDO SOBRE SINÔNIMOS, PARÔNIMOS E ANTÔNIMOS. Ficou célebre pelo livro CAXAMBU (1894), sobre as águas da cidade sulmineira.

            O médico francês CHARLES BERTHAUD veio analisar as águas de Cambuquira provavelmente por influência de Monat e/ou Viotti, montou um laboratório para analisá-las e daqui não se afastou. Outro médico crenólogo é o historiador Manoel Brandão, nativo da região desta cidade. Também deve ser lembrado o engenheiro Américo Werneck, fluminense de origem mineira, que foi prefeito de Lambari, defensor das águas locais.

As águas gasosas da futura estância de São Lourenço eram conhecidas da população regional desde os primeiros anos do século 19. Minavam em parte da enorme fazenda de JOÃO FRANCISCO VIANA (antes terras do Mendanha), localizada na freguesia do Carmo de Pouso Alto, Termo de Cristina.
As águas foram chamadas de 'Águas do Sítio do Viana' e depois de 'Águas da Freguesia de Nossa Senhora do Carmo, próxima ao Rio Verde'. Os herdeiros e sucessores venderam as terras à família Veiga da cidade de Campanha, que criou a Companhia de Águas Minerais São Lourenço, nome em homenagem ao patriarca LOURENÇO XAVIER DA VEIGA (retrato anexo), consanguíneo dos Veigas nepomucenenses. Em 1891 ergueu-se uma igreja ao padroeiro e em 1905 a família vendeu a empresa a AFONSO NORONHA FRANÇA, sócio do médico Joaquim da Nova, que a dotou de maquinário moderno e de bonde de tração animal, para transporte da água engarrafada. Participaram decisivamente dessa modernização Alfredo Capelache de Gusbert e Manoel Alves, este pai do grande cirurgião mineiro João Batista de Resende Alves.  Desde 1925 a cidade cresceu ao redor das fontes. Em 1927, Antonio Carlos Andrada e Djalma Pinheiro Chagas criam a prefeitura local. Três famílias são relacionáveis a São Lourenço: 1) foi prefeito ali meu insigne ex-aluno José Celso Garcia, consanguíneo dos Garcias de Nepomuceno (e dos primos destes, do lado Ferraz e Junqueira); 2) pertence ao tronco dos Noronhas do sul de Minas o cientista José de Noronha Peres, meu mestre, que quando faleceu era o maior virologista do país; 3) a família Xavier conta com pelo menos dois nomes ligados à hidroterapia: Xavier da Veiga e Xavier Chaves. Veja-se meu texto sobre a relação entre São Lourenço e a composição musical Siboney, de Ernesto Lecuona.

sábado, 27 de março de 2021

 


ENCONTRO NO RIO EM 1975

Em 1975 houve um encontro no hotel Sheraton, ao qual fui indicado provavelmente mais pela implantação do cuidado progressivo na Ufmg, menos pela mudança curricular, que se iniciava naquele ano. Logo na abertura, percebi que os demais convidados pisavam em ovos de medo da ditadura. Concluí que, se o objetivo era melhoria dos hospitais de ensino, nada sairia dali. Logo notaram minha desenvoltura com a riqueza de dados, na defesa do que propunha. O Carlos Gentile de Melo se entusiasmou comigo e começamos a fazer dupla nos debates.  Na hora de preparar as conclusões, foi inevitável que me elegessem relator de um dos grupos. Ninguém prestou atenção no que redigi e, quando li, quase todos discordaram, alegando que aquilo desagradaria ao governo e não era pensamento do grupo. O coordenador determinou que no cafezinho aparássemos as divergências e aleguei que não estava com paciência para tanto e era melhor que o grupo escolhesse outro relator. Enquanto se reuniram, fiquei no cafezinho. No dia seguinte seria feita a votação do relatório comum aos grupos. Depois do almoço fui-me despedir, alegando que não poderia ficar, por causa de um compromisso. O coordenador pediu ao Gentile que me convencesse a ficar. Respondi que havia o risco de que eu entrasse em atrito com meu principal contestador, “aquele senhor ali; por sinal, em que faculdade ele é professor?” O Gentile sorrindo disse que ele não era professor, estava ali pelo prestígio que tinha com os militares. “Mas, na área da saúde, o que ele é?” Meu amigo pigarreou e disse: “bem, ele é o superintendente do laboratório que fabrica o Leite de Rosas, mas gosta de ser tratado como médico”. Fui definitivo: “depois dessa, é que vou embora mesmo”.  Estava presente ali o Hélio Aguinaga pai do homem mais bonito do Brasil, Pedro, amante de Maria Callas e da Liza Minelli. O Hélio me perguntou se eu era sobrinho do Clóvis Salgado, respondi que era parente e discípulo. Acrescentou que seus dois maiores amigos eram mineiros: o Clovis e o Tancredo Neves - e este o induziu a educar o Pedrinho no colégio Santo Antônio de São João del Rei. Combinamos que eu o entrevistaria sobre a escola Ana Neri, mas isso não foi possível.

Pouco tempo depois, o Gentile me telefonou e disse que, no jantar, o general Severino Sombra estava atrás de mim. “Ele queria me prender?” “Não, pelo contrário, ele queria contratar você para assumir a diretoria da faculdade dele, seu salário será enorme!”. O mais curioso é que o Severino, mais que o Gentile, foi com quem gostei de conversar nos intervalos. Descobrimos que ambos éramos fãs de duas figuras sensacionais. Ele era cliente e amigo pessoal do polígrafo mineiro Antônio da Silva Melo e conhecia tudo sobre Teilhard de Chardin. Concluí que o primeiro teria influído para que fundasse uma faculdade a ser orientada pelo próprio, mas Melo falecera dois anos antes. Assim a faculdade de Vassouras ficou órfã e virou uma piada. Ficou famosa como faculdade de fim-de-semana.

quarta-feira, 24 de março de 2021

 


O LÍTIO E A PETROBRÁS

João Amílcar Salgado

Em 1989, propus a Mário Covas, junto com o Almir Gabriel, o Cid Veloso e o Carlos Becker, que incluísse, em sua proposta presidencial, obter da Bolívia que a Petrobrás explorasse suas jazidas de lítio, hoje apelidado de petróleo branco. Pouco antes, tinha havido uma reunião no Departamento de Química da UFMG, onde falei sobre a visita de Marie e Irene Curie a nosso Instituto do Radium. Principiei lembrando que o primeiro livro lusófono de química foi escrito pelo mineiro Vicente Silva Teles e que José Bonifácio de Andrada, cuja família veio de Santos para Minas, foi o descobridor, em 1790, do minério de lítio, a petalita, mas o nome lítio foi dado, pouco tempo depois, pelo genial purificador Humphry Davy. Um dos químicos presentes me perguntou se eu conhecia Gilbert Newton Lewis, descobridor, em 1912, de que o lítio poderia ser fonte de energia elétrica. Respondi que talvez o tenha estudado para o vestibular, mas seu nome se apagou com o tempo. Lembrei-me apenas que estudei o lítio como o mais leve dos metais. Mas, num esforço de memória, perguntei: “não seria Gilbert o tal dos elétrons pareados?” A partir de José Bonifácio, passei a acompanhar a crescente importância do lítio como calmante (1954) e, a seguir (1991), como miniaturizador das pilhas. Em 1980, nos EUA, um cientista me perguntou se o Brasil tinha muita reserva de minério de lítio. Confessei nada saber e ele disse que era bom eu saber, “porque, segundo amigos meus japoneses, isso vai ser uma riqueza estratégica”. Chegando aqui, verifiquei que em Araçuaí, Minas, o lítio era promissor, mas a Bolívia era riquíssima dele, com reservas bastante quantificadas desde 1985. Foi então que fiz a proposta a Covas. Os paulistas que acompanhavam o candidato nesta caravana a Minas, um deles Franco Montoro, descartaram minha sugestão, por causa do risco de que fosse ridicularizada. O risco de fato havia, pela provável relação com o lítio que receitaram para amansar o Ulisses Guimarães.

Covas, já governador, foi sigilosamente informado por Severo Gomes de grossa corrupção em suas obras. Pediu que o próprio Severo e Ulisses sigilosamente verificassem. Quando estão quase esclarecendo tudo, o helicóptero dos dois desaparece no mar. Os tucanos nasceram porque o partido do Ulisses estava corrompido e cada vez mais distante da esquerda - e Ulisses morreu, porque confirmava o mesmo para os tucanos. Mais tarde, verificamos quão fomos ingênuos naquele ano de 1989. A imprensa afinal documentou aquilo que foi apelidado de “privataria tucana”, pela qual Sergio Mota, José Serra e FHC ilustraram muito bem o aforismo do lavrense Carlito Maia, de que “todo esquerdista começa a esquecer sua ideologia, quando começa a contar dinheiro”. E hoje, em 2021, continuamos no mesmo, ou seja, às voltas com a privataria da mesma Petrobrás, do Banco do Brasil e da Caixa Federal.

 

 

quinta-feira, 18 de março de 2021

 

EPAMINONDAS E JK

JK DANÇARINO

João Amílcar Salgado

Juscelino Kubitschek, quando foi prefeito de Belo Horizonte, de 1940 a 1945, acumulou as funções de cirurgião e de dançarino. Ele operava de manhã e, para espairecer da cirurgia e das muitas obras que executava na cidade, gostava de dançar às tardes e descobriu o violinista José Epaminondas de Souza, para seu acompanhante musical. Pediu ao nepomucenense Oscar Negrão de Lima, primo da Sara, sua esposa, empregar o Epaminondas em seu Banco Crédito & Comércio, onde o músico ficava aguardando o Milton Nilo, que o conduzia ao chamado do dirigente municipal. Por gratidão, Kubitschek, já presidente, criou para o Epaminondas a Orquestra Sinfônica Nacional, que acabou ficando na Universidade Federal Fluminense, enquanto os 63 componentes se tornaram funcionários federais. Com isso, Epaminondas teve condições de dirigir requisitada big band para bailes, dentro e fora do país, ficando célebre por ser a banda de número recorde de violinos. Uma das lindas moças que eram convocadas para dançar com o prefeito estava a nepomucenense Quetinha Antunes, tia de minha querida vizinha, a Queta do Samul.

            Em 1945, Getúlio Vargas foi deposto e seus representantes, nos Estados e nas prefeituras, foram exonerados, inclusive Rubem Ribeiro na Vila e JK em BH. Lembre-se que, no governo de Minas, o interventor foi então substituído por Nísio Batista de Oliveira, primo dos Ribeiros de Nepomuceno.

[ESTE É UM APERITIVO DA 2ª EDIÇÃO AMPLIADA DE O RISO DOURADO DA VILA, A SER LANÇADO EM BREVE]

sábado, 13 de março de 2021

 


LEGENDA DE UM NEPOMUCENENSE DIANTE DE UM CÓDIGO SECRETO

Em 1963, eu estava na biblioteca da faculdade, fazendo uma revisão bibliográfica sobre a doença de Chagas, quando topei com a notícia, meio escondida, de que um cientista soviético Yuri Knorozov completou a decifração da escrita maia, na monografia THE WRITING OF THE MAYA INDIANS (nome vertido ao inglês). Esta era mais uma surpresa da ciência soviética, seis anos depois que lançou o primeiro satélite, o Sputnik, em 1957. O presidente Kennedy estava em pânico com o satélite e é provável que tenha sido informado da referida decifração, antes de ser assassinado, ainda em 1963.  Mesmo antes de sua posse em 1961, ele providenciava derrotar a produção científica inimiga e lhe indicaram um psicólogo educacional que poderia ajudá-lo. Trata-se de John  Flanagan que, em 1954, inventou a técnica do incidente crítico para identificar potenciais inventores ou descobridores. Daí, em 1961 começou a ser posto em prática o PROJETO TALENTO, que contribuiu para as conquistas espaciais e outras dos EUA. O Brasil tentou imitar a iniciativa com o IDEB e o ENEM. Na década de 70, procuramos aplicar esse projeto, junto com a técnica Delphi, a nossas pesquisas pedagógicas.

Meu interesse nas escritas antigas começou quando, ainda no vestibular, estudei a descoberta, em1801, de que a luz era uma onda, pelo pioneiro oftalmologista Thomas Young. Fiquei impressionado com sua genialidade e seu espírito inquieto. Se não fosse tão dispersivo, teria decifrado os hieróglifos antes de Champollion. Homens que eram excepcionais poliglotas descifraram as escritas antigas: Jean-François Champollion em 1820 – a escrita faraônica, Henry Rawlinson em 1836 – a escrita cuneiforme e Yuri Knorozov em 1963 – a escrita maia. Nós, que nos interessamos por escritas antigas, podemos´querer saber sobre códigos secretos, mas, antes de chegarmos aos cibersecretos, podemos ler, por exemplo, A HISTÓRIA DA QUEBRA DOS CÓDIGOS SECRETOS (2017) de Al Cimino.

De outra feita, fiquei diante de um desafio concreto, pois, em Diamantina, me entregaram sigilosamente um documento, encontrado junto a um baú repleto de ouro, diamante, outras gemas e moedas. O tesouro foi achado num barranco cavado para muro-de-arrimo. O documento  parecia escrito em hebraico, aramaico, siríaco ou árabe, mas não era. Em Portugal achei um livreto com a escrita secreta dos templários e era a do documento. Não consegui traduzir e restituí o documento, junto com o livreto, ao dono do baú. Dois anos depois, volto para saber o desfecho, mas o dono havia falecido. Perguntei pelo livro inédito que escrevera e este desapareceu com o tal documento e principalmente com o baú, nos dias em que o dono estava ausente, internado com doença terminal em Belo Horizonte.

[Aguardem o lançamento da 2ª edição ampliada de O RISO DOURADO DA VILA]